Presidente
afastada tem usado residência oficial como escritório de trabalho.
Com staff de 35 auxiliares, ela tenta buscar votos para barrar impeachment.
Afastada do Palácio do Planalto enquanto o
Senado analisa o processo de impeachment, a presidente Dilma Rousseff
transformou os 7,3 mil metros quadrados do Palácio da Alvorada em uma espécie
de "bunker" do governo petista nos primeiros 30 dias longe do poder.
Na residência oficial da Presidência desenhada pelo arquiteto Oscar Niemeyer –,
ela elabora as estratégias políticas para tentar retornar ao comando do país,
concede entrevistas e recebe os poucos aliados que se mantiveram fiéis mesmo
depois do desmanche da gestão do PT.
Dilma teve de se afastar temporariamente da
Presidência em 12 de maio, após ser
notificada da decisão do Senado de instaurar o processo de
impeachment. Na ocasião, os senadores autorizaram
que, durante o afastamento de até 180 dias, ela
permanecesse no Palácio do Alvorada e mantivesse salário integral, segurança
pessoal, equipe a serviço de seu gabinete pessoal, carro oficial, assistência
saúde e o direito de utilizar avião da Força Aérea Brasileira (FAB).
Segundo assessores palacianos, desde que foi afastada
do Planalto, Dilma tem tentado manter uma rotina de trabalho semelhante aos
tempos em que comandava o país. Ela continua acordando cedo, por volta das
5h30, e fazendo o tradicional passeio matinal de bicicleta pelos arredores do
Palácio da Alvorada. Ao retornar do exercício, a presidente afastada toma o
café da manhã e, em torno das 9h, vai para a biblioteca do palácio, que se
tornou uma espécie de "gabinete presidencial".
Cercada pelos mais de 3,4 mil livros do acervo da
residência oficial, ela despacha até a noite com assessores, ex-ministros e
parlamentares aliados. Atrás de sua mesa de trabalho, está exposta a tapeçaria
Músicos, do pintor, desenhista e ilustrador Di Cavalcanti, um dos ícones do
modernismo brasileiro.
A petista relata seus auxiliares, continua exigente e
ainda distribui broncas em sua equipe. Porém, apesar de Dilma ter sido afastada
da Presidência com a debandada maciça de partidos que integravam sua base de
apoio no Congresso Nacional, aliados que continuam freqüentando a residência
oficial relatam que ela, surpreendentemente, tem exibido um humor melhor do que
quando estava no Palácio do Planalto.
"As pessoas chegam ao Alvorada como se estivessem
preparadas para um velório, mas, ao chegarem lá, percebem que o morto está
vivo. Ela Dilma está mais leve", contou ao G1 um
assistente da presidente afastada.
"O noticiário ajuda muito. As notícias ruins do
governo Temer melhoram o humor dela", ressaltou outro auxiliar do palácio.
Nas semanas em que está afastada do governo, Dilma tem
tentado angariar apoio para evitar a aprovação do impeachment. Em uma das frentes
de sua estratégia de defesa, ela tem repetido, por meio de entrevistas para a
imprensa nacional e estrangeira, que não cometeu crime de responsabilidade e
que é alvo de um "golpe". Somente no último mês, ela concedeu
entrevistas ao jornal "Folha de S.Paulo", às emissoras CNN, Al
Jazeera, TV Brasil, Rede TV e Rússia Today, e ao site The Intercept, além de
uma coletiva de imprensa para correspondentes estrangeiros.
A estratégia da petista também reservou no primeiro
mês de afastamento espaço para conversas e encontros com grupos específicos de
simpatizantes de seu governo, como artistas, cientistas, historiadores e
representantes de movimentos sociais e centrais sindicais.
Irritação
com Temer.
Embora haja relatos de que Dilma não se abateu com a
abertura do processo de impeachment no Senado, palacianos contam que ela teve
explosões de ira no último mês com decisões do governo Michel Temer que
limitaram privilégios presidenciais mantidos pelo Senado.
Uma das medidas do presidente em exercício que a
fizeram reagir com indignação no Palácio da Alvorada foi a limitação de suas
viagens com aviões da FAB. Com base em um parecer da Subchefia de Assuntos
Jurídicos da Casa Civil, o governo restringiu
ao trecho Brasília-Porto Alegre-Brasília os deslocamentos da presidente afastada
com aeronaves da Aeronáutica.
Segundo, o presidente em exercício limitou o acesso de
Dilma aos jatos da FAB porque ficou contrariado com as viagens dela para
participar de eventos em que criticava o novo governo e o acusava de
"golpista".
Irritada com a decisão do peemedebista, a presidente
afastada ameaçou na última semana embarcar em
um voo comercial para viajar até Campinas (SP), onde iria
participar de um encontro com cientistas do Centro Nacional de Pesquisa em
Energia e Materiais (Cnpem).
Preocupados com a segurança de Dilma em uma aeronave
de carreira, integrantes da equipe de assessores da petista negociaram com o PT
o fretamento
de um jato particular que a levou ao município paulista. Ela ingressou na
Justiça com um recurso para tentar derrubar a restrição do uso de aviões da
Força Aérea.
Ainda de acordo com assessores do Alvorada, outros
episódios que azedaram o humor de Dilma no último mês foram o corte do
"cartão de suprimento" usado para comprar comida para a residência
oficial e as recentes e freqüentes quedas de energia elétrica no palácio.
Segundo auxiliares da petista, a primeira falta de luz ocorreu já no dia em que
ela foi afastada temporariamente da Presidência.
Conselheiros
políticos.
Na reclusão do Alvorada, Dilma Rousseff tem limitado a
um grupo restrito de aliados o acesso à residência oficial. Os freqüentadores
mais assíduos do palácio têm sido alguns ex-integrantes do primeiro escalão do
governo petista.
Ex-ministro da Secretaria de Governo, Ricardo Berzoini
tem se reunido diariamente com a presidente afastada. Os ex-ministros Miguel Rosseto
(Trabalho), Tereza Campello (Desenvolvimento Social) e Carlos Gabas
(Previdência Social) também têm acesso franqueado à residência.
O ex-chefe da Casa Civil e ex-chefe da gabinete Jaques
Wagner, que voltou para Salvador depois que Dilma foi afastada, tem visitado a
petista de duas em duas semanas. Ele continua aconselhando-a politicamente.
No entanto, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva,
padrinho político de Dilma continua sendo o principal conselheiro da presidente
afastada. Desde que ela deixou o Palácio do Planalto, ele já a visitou três
vezes no Alvorada. Os dois, contudo, conversam com freqüência por telefone,
traçando estratégias para tentar conter o impeachment no Senado.
Dilma também tem mantido canal direto e quase diário
com um grupo de senadores que tenta atrair votos de colegas para evitar o
afastamento definitivo da petista. Entre os senadores mais próximos da
presidente estão Kátia Abreu (PMDB-TO) e Armando Monteiro (PTB-PE). Os dois
eram ministros dela e votaram contra o impeachment no Senado, contrariando a
orientação de seus partidos.
Os senadores petistas Gleisi Hoffmann (PR), Humberto
Costa (PE) e José Pimentel (CE) se tornaram articuladores de Dilma no Senado,
inclusive, mapeando para ela as tendências de votos dos colegas no processo de
impeachment. Eles têm se dedicado a tentar reverter votos de senadores que
votaram favoravelmente à abertura do processo, mas que sinalizam que podem
mudar de idéia na votação definitiva do julgamento do impeachment.
Conhecida por sua aversão à articulação política, a
própria Dilma tem recebido senadores indecisos no Palácio da Alvorada para
tentar convencê-los que não cometeu crime de responsabilidade para ser afastada
da Presidência.
A elaboração da defesa jurídica e a busca de votos
para barrar o processo de impeachment têm obrigado a presidente afastada, uma
leitora voraz de literatura, a abrir mão dos livros. Em vez de devorar
romances, ela tem lido mais documentos de governo, relatórios de gestão e peças
jurídicas elaboradas por sua defesa. A presidente, contam auxiliares, faz
questão de revisar pessoalmente todos os documentos redigidos por seus
advogados.
Nos momentos de folga em Brasília, ela aproveita para
assistir séries no Netflix no subsolo do Palácio da Alvorada. Já quando está em
Porto Alegre, a petista corre para a casa da filha Paula para ficar com os
netos Gabriel e Guilherme.
Staff do
Alvorada.
Atualmente, cerca de 40 pessoas atuam no staff da
presidente no Alvorada. Desses, por volta de 20 já trabalhavam na residência
oficial. Depois que Dilma foi obrigada a deixar o Planalto, outros 15
assessores da petista passaram a despachar diariamente no palácio construído em
uma península do Lago Paranoá.
O staff de Dilma na residência oficial é gerenciado
pelo assessor especial Giles Azevedo, homem de confiança da presidente, que a
acompanha desde que ela iniciou a carreira política no Rio Grande do Sul. Giles
foi chefe de gabinete de Dilma no primeiro mandato dela na Presidência, mas
depois virou um assessor especial.
Apelidado pelos colegas do Alvorada de "ministro
do bunker", Giles é alvo de um
pedido de inquérito da Procuradoria Geral da República na Operação Lava
Jato. Ele é suspeito de envolvimento no esquema de corrupção que atuava na
Petrobras.
Também passou a dar expediente na residência oficial o
ex-chefe de Assuntos Jurídicos da Casa Civil Roberto Messias, que ficou
conhecido nacionalmente, em março deste ano, como
"Bessias", após vir à tona conversa telefônica gravada pela
Polícia Federal na qual Dilma informava ao ex-presidente Lula que tinha enviado
um auxiliar com um termo de posse para que ele usasse em “caso de necessidade”.
Naquele dia, Lula havia sido anunciado para a chefia
da Casa Civil. O auxiliar, que Dilma chamou no áudio de "Bessias",
era Roberto Messias. No Alvorada, ele tem auxiliado o ex-ministro José Eduardo
Cardozo na defesa da presidente afastada no processo de impeachment.
Completam o staff de Dilma na residência oficial
assessores pessoais, assessores de imprensa, fotógrafo e auxiliares que
atualizam os perfis da petista nas redes sociais.
Ex-companheiras
de cárcere.
No dia 12 de maio, após ser notificada de seu
afastamento temporário da Presidência e discursar no
Palácio do Planalto ao lado de Lula e ministros mais próximos, Dilma foi
de carro para o Palácio da Alvorada e, de lá, chamou um grupo de petistas para
um almoço na residência oficial.
Atenderam ao chamado da presidente afastada, entre
outros, Lula, Cardozo, Berzoini, Jaques Wagner, Gabas, o ex-ministro Edinho
Silva (Comunicação Social) e o presidente do PT, Rui Falcão. Os senadores do
PT, que haviam virado a madrugada no plenário do Senado tentando evitar a
abertura do processo de impeachment, não compareceram porque estavam exauridos.
Eles conversaram durante o almoço sobre o resultado da
votação no Senado e fizeram as primeiras análises dos nomes anunciados por
Michel Temer para o governo provisório logo após a confirmação da abertura do
processo de afastamento.
Na noite do mesmo dia, Dilma recebeu na residência
oficial dez mulheres que conviveram com ela na prisão, no início da década de
1970, durante a resistência ao regime militar. Entre as ex-companheiras de
cárcere que foram prestar solidariedade na Alvorada estavam a ex-ministra
Eleonora Menicucci (Secretaria de Mulheres) e a jornalista Rose Nogueira,
presidente do grupo Tortura Nunca Mais, de São Paulo.
Embora Dilma vivesse naquele dia o pior momento de sua
carreira política, o encontro com as velhas amigas relatou pessoas presentes,
fez com que ela se desligasse, por alguns instantes, do terremoto político que
a tirou do comando do Palácio do Planalto.
Em meio ao jantar, as ex-combatentes da ditadura
conversaram, relembraram histórias dos anos em que passaram atrás das grades
como presas políticas e riram alto na imensidão dos salões do Palácio da
Alvorada. Diante da descontração do reencontro com as ex-colegas de cela, Dilma
chegou a guiar um tour para apresentar a residência oficial para as amigas que
ainda não conheciam o palácio.
Fonte: G1 – DF.
Nenhum comentário:
Postar um comentário