COMENTÁRIO
Scarcela
Jorge.
ACHA-SE DONO EM TUDO.
Nobres:
O Senhor Luis
Inácio Lula já deu incalculáveis exemplos de que amor às instituições e
respeito às próprias palavras não são exatamente as características mais fortes
de sua personalidade. Ora “não sabe”, ora contradiz sem pudor o que todos
sabem. A desastrada entrevista que concedeu à televisão portuguesa no último
fim de semana representou a mais bem completada demonstração desses traços de
caráter, inconcebivelmente pertencentes a alguém que já ocupou o mais alto
cargo da nação e que precisa honrar a popularidade e a mando de que ainda goza
entre as grandes massas. De passagem, a primeira clara manifestação de seu
descompromisso com a verdade histórica se deu ao alegar, na entrevista, que,
embora haja “companheiros do PT presos”, eles não eram “gente da minha
confiança”– um descaramento que, para dizer o mínimo, revela tons fortes de manifesto
cínico e nos constrange a uma pergunta: Lula teria dado a José Dirceu, um dos
“companheiros do PT presos”, a missão de coordenar suas campanhas eleitorais e,
depois, nomeá-lo ainda todo-poderoso chefe da Casa Civil se nele não
depositasse confiança ilimitada? Este, no entanto, é apenas uma aparência
acessória da malfadada entrevista do ex-presidente. Essencial é o desrespeito
às instituições que deixou patente ao afirmar que o julgamento dos réus do
mensalão pelo Supremo Tribunal Federal (STF) “teve praticamente 80% de decisão
política e 20% de decisão jurídica”. Segundo ele, o processo foi “um massacre
que visava destruir o PT, e não conseguiram”. Dado agora a interpretar decisões
judiciais sob parâmetros aritméticos, é razoável que Lula e suas declarações
sejam submetidas ao mesmo critério de avaliação: elas foram 100% cínicas, 100%
irresponsáveis, mostraram 100% de desprezo pelas instituições e merecem,
portanto, 100% de desdém de toda a sociedade brasileira, suficientemente
informada e convencida de que se perpetraram crimes previstos na legislação
penal e que foi sob este prisma que o STF concluiu pela culpabilidade dos réus
envolvidos no esquema do mensalão, aplicando-lhes as penas cabíveis. - O resquício
são conjecturas – como as fez Lula – visando a desconstituir de seriedade as
decisões jurídicas emanadas do Supremo, propositalmente conferindo-lhes
acintosamente o caráter político. Implicitamente, o ex-presidente da República
e presidente de honra do PT quis atribuir ao STF a condição de um tribunal de
exceção. Nada mais equivocado. Foram julgados fatos levantados no âmbito de
outra instituição republicana, o Congresso Nacional, que, mediante uma CPI,
configurou o uso de recursos públicos e privados para a compra de apoio e
formação de maiorias parlamentares de apoio ao governo petista. Submetidas suas
conclusões ao Ministério Público e levantadas as provas por meio de inquéritos
da Polícia Federal (órgão do Executivo), tiveram os indiciados a oportunidade
de exercer, antes e durante o julgamento, o mais amplo e constitucional direito
à defesa. Portanto, em nenhum momento se pode comparar o processo que levou à
condenação dos mensaleiros com aqueles que, em outras plagas, “tribunais
populares” levam sumariamente ao paredón os inimigos políticos do governo.
Fugir a essa constatação é distorcer os fatos. Como destacou o presidente do
STF, ministro Joaquim Barbosa, “a desqualificação do Supremo Tribunal Federal,
pilar essencial da democracia brasileira, é um fato grave que merece o mais
veemente repúdio. Essa iniciativa emite um sinal de desesperança para o cidadão
comum, já indignado com a corrupção e a impunidade, e acuado pela violência. Os
cidadãos brasileiros clamam por justiça”. Decididamente, ao contrário do que se
deveria esperar de alguém que chegou democraticamente ao poder, prestou um
desserviço à democracia que ele se auto proclama como uns dos principais
restauradoras da essência democrática.
Antônio Scarcela Jorge.
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