SCARCELA JORGE |
COMENTÁRIO
Scarcela Jorge
O
ABSURDO E CONTROVERSO DA POLÍTICA BRASILEIRA.
Nobres:
Não é mais surpresa no
controvertido cenário político quando tudo pode acontecer. Neste contexto se
ensarta a decisão de manter os direitos políticos de Dilma após o impeachment e
pode suscitar dois problemas graves para o governo Temer A votação do impeachment da ex-presidente Dilma
Rousseff seguiu a tendência de votos anunciada pela base aliada do presidente Temer
no Senado Federal. Foram 61 votos a favor do impeachment, 20 contrários e
nenhuma abstenção, computando-se, assim, sete votos além dos 54 necessários
para o afastamento. O ministro do Supremo Tribunal Federal Ricardo Lewandowski,
que presidiu a sessão de julgamento, definiu que a votação sobre o afastamento
da presidência seria separada da decisão sobre a inabilitação para ocupação de
cargos públicos. O procedimento definido por Lewandowski reproduziu o mesmo
princípio em relação ao julgamento do ex-presidente Fernando Collor, pois, à
época, a renúncia (hoje afastamento) implicou numa votação específica sobre a
perda dos direitos políticos. O resultado da segunda votação não manteve os
mesmos números a respeito da decisão sobre o afastamento e se traduziu na
manutenção dos direitos políticos de Dilma. Foram 42 votos a favor da
inabilitação, 36 contrários e três abstenções, ou seja, não foi atingido o
número mínimo de 54 votos, que corresponde aos 2/3 constitucionalmente
exigidos. Quais as razões para o PMDB assumir um risco político de fragmentação
da base de Temer? O que motivou a diferença nas duas votações? A resposta está
na fala do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), segundos antes do
voto dos parlamentares. Renan pede a palavra e diz que “afastar a presidente da
República é constitucional. Pode afastar na forma da Constituição e da
democracia? Pode, mas não é da Constituição inabilitar a presidente da
República como conseqüência do seu afastamento, não. Essa decisão terá de ser
tomada aqui, pelo plenário do Senado Federal”. O senador disse ainda que, “no
Nordeste, costumam dizer uma coisa com a qual eu nós não concordamos: além da
queda, coice. Nós não podemos deixar de julgar, nós temos de julgar, mas nós
não podemos ser maus, desumanos”. Ao concluir, o senador diz que vota pela
manutenção dos direitos políticos. As palavras de Renan foram um sinal verde e
um salvo-conduto para os parlamentares da base de Temer, ligados ao senador,
decidirem contra a inabilitação de Dilma para ocupar cargos públicos. Do ponto
de vista prático, o desfecho gera dois problemas graves para o governo Temer:
por um lado, o resultado permite que a ex-presidente participe de processos
eleitorais e reforça a sua tese de golpe, pois foi afastada do cargo sem cometer
crime; a decisão, por outro, pode gerar uma crise no governo Temer minutos
antes da posse. Os partidos da base aliada como o PSDB e o DEM sentiram-se
traídos no momento da votação. O placar e as falas dos líderes dos dois
partidos deixam claro que ambos não sabiam da manobra do PMDB, que resultou
apenas no afastamento. Cássio Cunha Lima, líder do PSDB no senado, chegou a
afirmar que não iria compor o novo governo. Considerando que Temer precisa
acelerar a sua agenda de votação no Congresso, com amplo apoio parlamentar para
medidas impopulares, o resultado apresenta-se como uma fratura política que
exigirá uma ação para unificar a base partidária aliada. A ação deve, ainda,
buscar a neutralização da oposição, que ganhou argumentos para contestar Temer.
Do contrário, a aprovação das reformas do governo enfrentará resistências e o
descolamento de partidos importantes da base aliada poderá ocorrer em meados de
2017. A análise deixa em aberto uma pergunta: quais as razões para o PMDB
assumir um risco político de fragmentação da base no momento da confirmação de
Temer como presidente? A resposta pode encontrar amparo no julgamento do
mandato do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que pode ser cassado em setembro e
ter seus direitos políticos mantidos. Mas a habilidade de Temer e alguns de
seus notáveis aliados, unidos, minimizarão estas questões no sentido de
promover o país para retomada moralizadora que a sociedade tanto almeja.
Antônio Scarcela Jorge.
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