Site de VEJA obteve com exclusividade a localização dos 14.462 médicos
do programa carro-chefe da campanha de Dilma Rousseff para a Saúde.
Uma das principais bandeiras
eleitorais do PT em 2014, o programa Mais Médicos é um exemplo de demagogia em
estado puro. Lançado em 2013, ele partiu do diagnóstico de uma carência
verdadeira, a falta de médicos em muitas cidades brasileiras. A solução
encontrada para esse problema foi escabrosa do ponto de vista institucional: a
importação de médicos estrangeiros, principalmente de Cuba, cujo governo
autoritário recebeu até agora 1,5 bilhão de reais – um aditivo assinado neste
mês estabelece que o Ministério da Saúde pagará mais 1,17 bilhão de reais pelos
cubanos que estão no Brasil. O programa não é a solução mais racional para
o problema do atendimento médico, não é o mais sustentável a longo prazo, nem
sequer aceitável do ponto de vista dos valores democráticos. Mas, apesar desses
vícios gravíssimos de origem, a dinâmica da política é tal que se torna quase
impossível para um prefeito não aderir ao programa. Por meio da Lei de Acesso à
Informação, o site de VEJA obteve a localização no território brasileiro
de cada um dos 14.462 médicos de 48 nacionalidades – 79% de Cuba –
distribuídos em 3.771 municípios. O Ministério da Saúde nunca tornou
essas informações públicas.
Os dados mostram que prefeitos de
todos os partidos, especialmente os do PT – com 79% das prefeituras
contempladas –, obtiveram altos índices de adesão, de acordo com o cálculo
proporcional do número de prefeitos eleitos por cada sigla em
2012. Ainda que com taxa de adesão de até 25 pontos percentuais
inferior, municípios governados por partidos de oposição também aderiram ao
programa. Era o esperado: em cidades pobres dos rincões do país, rejeitar um
médico, independentemente da nacionalidade, pode ter alto custo eleitoral. É o
caso da pequena Sagres, no interior paulista. “Teve uma boa
repercussão para mim, porque evitava o deslocamento dos moradores da cidade
2.395 habitantes para a Santa Casa de Oswaldo Cruz, hospital mais próximo
fica a 15 quilômetros”, diz o prefeito Brandio Pereira Filho, filiado ao
DEM.
E esse o problema final do Mais
Médicos: a adesão maciça dá a ele um arremedo de legitimidade. "O
programa é politiqueiro e eleitoreiro. O prefeito prefere pagar um médico ou
investir o dinheiro em outra coisa e deixar o governo federal pagar? A
população precisa ter mais acesso aos serviços de saúde, isso é fato, mas com
qualidade. Quando não sabemos se quem está atendendo é qualificado ou não, não
podemos dizer que tem qualidade. Não posso dizer que ocorre sempre, mas em
muitas situações a população está sendo enganada", diz Florentino Cardoso,
presidente da Associação Médica Brasileira (AMB).
Os dados obtidos por
VEJA confirmam a finalidade do programa: empregar os médicos da ilha
dos irmãos Castro – 11.442 estão hoje em solo brasileiro — e repassar recursos
à ditadura cubana. A matemática não mente: dos 10.000 dólares pagos a cada um
dos cubanos que desembarcaram no Brasil, apenas 1.245 dólares (cerca de 3.000
reais) chega ao bolso dos profissionais. O restante é retido no país deles.
Mas, para o governo brasileiro, nem o regime de contratação nem o fato de a
medicina cubana estar flagrantemente atrasada no ano passado, era a 68º no
ranking de qualidade da América Latina não parece um grande problema.
Dilma Rousseff com a médica
cubana Hilda, em visita à Unidade Básica de Saúde (UBS) de Jaci, Guarulhos (SP)
Além de pagar salários, no valor
de 10.482,93 reais, o ministério banca os deslocamentos de estrangeiros para as
capitais dos estados e uma ajuda de custo para a instalação dos médicos – esse
benefício, pago uma única vez, varia de 10.000 a 30.000 reais, de acordo com as
condições da região. No caso dos cubanos, essa ajuda de custo tampouco foi paga
aos médicos. As prefeituras arcam com despesas de alimentação e moradia
com orçamentos próprios.
Para aderir ao programa, os
prefeitos têm de se inscrever no site do Ministério da Saúde para participar. A
quantidade de médicos destinada varia de acordo com a população, nível
econômico e as equipes de saúde sem médico já existentes. A maior parte das
cidades 43% recebeu apenas um médico. Neste momento, o programa está em
sua quinta fase, destinada a contemplar cidades de alta
vulnerabilidade social que ainda não haviam aderido.
O número de médicos recebido por
cada partido é proporcional ao eleitorado que eles governam, porque o
Ministério da Saúde incluiu a população a ser atendida entre as variáveis que
condicionam a quantidade de profissionais distribuídos nas cidades. "A
seleção foi totalmente impessoal, não houve discriminação", diz o
secretário de Gestão do Trabalho e Educação na Saúde do ministério, Hêider
Pinto.
Na segunda-feira passada, a presidente-candidata
Dilma Rousseff foi questionada em entrevista ao Jornal
Nacional, da Rede Globo, se avaliava a
saúde pública brasileira como “minimamente razoável” depois de 12 anos de
administração do PT. Treinada por um time de marqueteiros experientes, Dilma
respondeu o óbvio, sem recorrer a novos adjetivos: Não.
Em maio do ano passado, quando o Mais Médicos preparava seu lançamento no Brasil, o jornal espanhol El País publicou reportagem na qual relatava que a formação rápida de um grande número de médicos e seu envio ao exterior por meio de parcerias com outros países era o maior produto de exportação de Cuba. Em cifras, os profissionais de medicina cubanos viraram moeda como o petróleo é para a Venezuela. Nos últimos 50 anos, a ditadura dos Castro trocou ajuda médica por empréstimos e acordos comerciais com 107 países. Há dois anos, tomando o exemplo da Venezuela chavista, Cuba embarcou mais de 40.000 profissionais da área de saúde para Caracas, entre médicos, enfermeiros e terapeutas, em troca de 105.000 barris de petróleo por dia, segundo o diário espanhol. Medicina, em Cuba, é negócio. Mas a história recente mostra que, no Brasil, eleição e negócio não costumam terminar bem. E a saúde, conforme admitiu a própria presidente-candidata, não parece “minimamente razoável”.
Partido
|
Prefeituras *
|
Prefeitos no mais médicos
|
Engajamento.
|
PT
|
643
|
509
|
79%
|
PP
|
470
|
332
|
71%
|
PSD
|
494
|
344
|
70%
|
PSB
|
440
|
307
|
70%
|
PDT
|
310
|
212
|
68%
|
PR
|
267
|
181
|
68%
|
PMDB
|
1019
|
675
|
66%
|
PSDB
|
699
|
427
|
61%
|
PTB
|
299
|
176
|
59%
|
DEM
|
283
|
154
|
54%
|
Fonte: Ministério da
Saúde (agosto de 2014) e Tribunal Superior Eleitoral / *inclusive Brasília e
Fernando de Noronha.
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