Três candidatos a governador deixaram disputa por ter registros
impugnados. Norma ainda é tida como polêmica.
Nas primeiras eleições gerais em
que está sendo aplicada, a Lei da Ficha Limpa já barrou grandes nomes da
política brasileira, mas ainda é vista com ressalvas por setores do Poder
Judiciário brasileiro. Os defensores falam de avanços e afirmam que a nova
regra já está consolidada; os críticos dizem que a lei é cheia de brechas, com
uma jurisprudência que ainda não é totalmente clara e passível de manipulação.
Independentemente da divergência
de opiniões, tanto críticos quanto defensores afirmam: a Lei da Ficha Limpa não
substitui o papel do eleitor na hora de se escolher um candidato.
A norma já foi responsável pelo
impedimento de pelo menos 240 candidaturas, conforme dados dos Tribunais
Regionais Eleitorais (TRE’s). Na lista dos candidatos barrados, estão nomes
como o do ex-governador José Roberto Arruda (PR), considerado “ficha-suja” após
ser condenado em segunda instância pelo crime de improbidade administrativa por
envolvimento no escândalo chamado “mensalão do DEM”, descoberto pela Operação Caixa
de Pandora. Em 2010, o iG
antecipou os principais detalhes da operação e divulgou um vídeo no qual Arruda
recebia suposta propina.
Além de Arruda, outros dois
candidatos a governos estaduais também foram impedidos de disputar as eleições
desse ano: José Riva (PSD), em Mato Grosso e Neudo Campos (PP), em Roraima. Os
três indicaram substitutos para manter a candidatura do partido. Nos três
casos, as próprias esposas dos candidatos barrados passaram a fazer parte das
chapas majoritárias. Rivas e Campos foram substituídos, na candidatura ao
governo do Estado por Janete Rivas (PSD) e Suely Campos (PP). Já Arruda
indiciou Jofran Frejat (PR) como substituto, mas elevou a esposa, Flávia Peres
(PR), à condição de candidata a vice-governadora do Distrito Federal.
Distrito Federal
Além deles, por aplicação da lei,
candidatos como Paulo Maluf (PP-SP), que disputa a reeleição na Câmara, e César
Maia (DEM-RJ), que tenta uma vaga ao Senado, foram impugnados. Maluf, condenado
por crime de improbidade administrativa por suposto envolvimento no caso de
superfaturamento do túnel Ayrton Senna, tenta manter sua candidatura no TSE. Já
Maia, também condenado em segunda instância por crime de improbidade
administrativa, conseguiu a liberação de sua candidatura após o Superior Tribunal
de Justiça (STJ) anular sua condenação em segunda instância.
O ministro do Supremo Tribunal
Federal (STF) e ex-presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Marco
Aurélio Mello, afirma que a Lei da Ficha Limpa é uma lei consolidada. “É uma
lei de iniciativa popular que veio para buscar-se uma correção de rumos. É uma
lei definitiva e muito salutar se é que nos queremos ter dias melhores nessa
nossa sofrida República”, analisou o ministro. “A lei vale para todos. Mas
quanto maior a figura, maior é o tombo. A lei se aplica a todos os cidadãos
pouco importando a projeção política que possuam”, lembrou Marco Aurélio Mello.
“A lei está completamente consolidada. A Lei
da Ficha Limpa foi pensada para excluir das eleições os casos mais graves, mais
grosseiros. Ela não foi pensada para substituir o papel do eleitor. A lei está
cumprindo o seu papel de retirar de cenário pessoas mais grosseiramente
envolvidas com atos de corrupção. Quanto às demais, compete ao eleitorado o
fator decisivo”, complementou o juiz Márlon Reis, idealizador da Lei da Ficha
Limpa e membro e co-fundador do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral
(MCCE).
Mas especialistas em Direito
Eleitoral consultados pelo iG apontam
que um dos efeitos colaterais da aplicação da Lei da Ficha Limpa é justamente a
substituição de candidatos “ficha-suja” por parentes ou aliados políticos, como
as esposas que agora disputam em lugar dos candidatos a governos estaduais. Ou
seja, na prática, o candidato barrados não necessariamente deixa de ter acesso
à nova administração, se sua antiga chapa vencer a eleição.
O ministro do Supremo Tribunal
Federal (STF) e integrante do TSE Gilmar Mendes ainda aponta um outro efeito
colateral da Lei da Ficha Limpa: a possibilidade de manipulação de julgamentos
em Cortes estaduais ou em tribunais de contas para se prejudicar um determinado
candidato. “A lei da Ficha Limpa tem características casuísticas. Hoje, você
pode ser condenado em segunda instância por órgão colegiado como Tribunais de
Contas, que têm influência do poder local. O legislador não observou essa
situação”, observou o ministro.
Já o especialista em Direito
Eleitoral, Rodrigo Lago, também aponta que outro problema da Lei da Ficha Limpa
é a falta de “visão de futuro” da norma. “A maior crítica é essa aplicação do
passado (da vida pregressa do candidato) para fins de inelegibilidade, o que
para mim é uma violência ao Estado do Direito. Quando você pratica um ato, você
pratica um ato pleno das consequências jurídicas. Mas a sanção que é aplicada
pela Lei da Ficha Limpa leva em consideração o passado do cidadão”, analisa
Lago. Lago pontua, como exemplo, eventuais casos de candidatos acusados de
escândalos na Câmara que depois são inocentados pela Justiça. “Ele é um
ficha-limpa sendo um ficha-suja”, ilustra Lago.
“As críticas são isoladas. No
STF, apenas o ministro Gilmar Mendes se insurge ainda contra uma lei que ampla
maioria considerou constitucional. Há questões interpretativas que ainda estão
nos tribunais e isso é normal porque a lei ainda é muito nova. Ainda vai
demorar um tempo para que a jurisprudência da Lei da Ficha Limpa se consolide”,
finalizou o juiz Márlon Reis.
Cronologia
- Após a coleta de 1,6 milhões de
assinaturas, a Lei Complementar 135/2010 foi sancionada pelo ex-presidente Luiz
Inácio Lula da Silva (PT). A lei prevê que um candidato condenado em Corte
colegiada ou que renunciou ao mandato para fugir de uma cassação fica
inelegível por oito anos;
- Em 2010, esperava-se que a lei
já fosse aplicada. Mas, em julgamento ocorrido em 2012, o Supremo Tribunal
Federal (STF) determinou que a norma era constitucional, mas que sua validade
somente ocorreria a partir daquele ano. Isso porque, a Constituição determina
que qualquer lei eleitoral que faça mudanças substanciais no processo de
escolha de candidatos, somente pode entrar em vigor em período superior a um
ano da realização das eleições;
- Com base nesse entendimento do
STF, candidatos que foram impugnados pela Ficha Limpa em 2010 conseguiram
escapar. Entre eles, estava o candidato ao senado Cássio Cunha Lima (PSDB-PB);
- Em 2012, ocorreu a primeira
eleição sob vigência da Lei da Ficha Limpa. Ao todo, 1.340 candidatos foram
barrados na sua primeira eleição;
- Em 2014, a Lei da Ficha Limpa
entra na sua primeira eleição geral. 240 candidatos já foram barrados nos
Tribunais Regionais Eleitorais;
- Nessa eleição, a lei barrou a candidatura de José Roberto Arruda (PR) ao Governo do Distrito Federal (GDF). Arruda ainda tentou concorrer argumentando que ele registrou sua candidatura antes de ser condenado em segunda instância. O argumento não prevaleceu e ele foi barrado tanto no Tribunal Regional, quanto no TSE;
- Já Cássio Cunha Lima, barrado
em 2010, foi impugnado novamente esse ano mas teve sua candidatura ao governo
da Paraíba liberada. Na argumentação, Lima disse que o período de
inelegibilidade, por conta da condenação por compra de votos referentes às
eleições de 2006, terminará no dia 1º de outubro desse ano. As eleições
ocorrerão dia 5 de outubro.
Fonte: IG Brasília.
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