COMENTÁRIO
Scarcela Jorge.
QUEM DE COSTUME A DESCERIA.
Nobres:
Alguma coisa está muito vagada
numa democracia quando a tática da desqualificação do adversário se transforma,
pela insistência, no aspecto mais percebido das campanhas políticas. O cenário
brasileiro indica que a troca de acusações parece ter ultrapassado, a duas
semanas do pleito, os limites da crítica a possíveis defeitos e deficiências
dos oponentes e de seus planos de governo. Tem prevalecido, na reta final, a
retórica do ataque, não só entre os candidatos que lideram as pesquisas. O que
fica dos debates e dos programas na TV e no rádio é a sensação generalizada de
que as agressões se sobrepõem à apresentação de propostas. O objetivo é a
imposição de uma pauta diversionista, que em nada contribui para a qualidade da
campanha e os esclarecimentos de pontos de vista. Compreende-se que, numa
disputa acirrada, as posições críticas possam até preponderar, em determinados
momentos dos confrontos. Tanto que, segundo os cientistas políticos, a ausência
de duelos verbais numa eleição pode ser também o sinal do empobrecimento do
debate e do distanciamento da população em relação ao que está em disputa. Por
isso são aceitas, como parte da exposição de ideias, as atitudes de quem, na
tentativa de impor suas ideias, deprecia a trajetória e as propostas dos
adversários. Também é assim que se areja o ambiente democrático, ou a política
seria uma atividade condenada ao tédio e à desimportância. Mas a tática do
ataque e da desqualificação não pode ter a hegemonia de uma campanha, como
parece acontecer no Brasil, no instante em que as pesquisas indicam oscilações
e as mais variadas possibilidades. Além de rebaixar o debate, a linha agressiva
adotada por alguns candidatos retira do eleitor a possibilidade de avaliar as
reais intenções dos concorrentes. São relegados a um segundo plano os que,
eventualmente fora dos confrontos, ainda tentam defender uma postura
propositiva. O país fica sem saber o que os pretendentes à Presidência da
República e aos governos estaduais defendem para questões específicas e
urgentes, e os planos se diluem em abordagens genéricas, que poderiam ser
defendidas por qualquer candidato. O dado positivo, indicado pelos analistas, é
o do possível esgotamento da estratégia. O eleitor espera que os concorrentes
retomem a apresentação de propostas, desde que não subestimem, com projetos evasivos,
a inteligência de quem vai decidir a eleição.
Antônio Scarcela Jorge.
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