A CABEÇA DOS CANDIDATOS, NOS PÉS.
Dilma calça Vuitton e Aécio,
Ferragamo, mas o andar de baixo paga mais caro pelos sapatos que compra. Ora, direis, olhar sapatos. Parece uma trivialidade, mas é uma aula de
economia e de costumes. Dilma Rousseff calça a marca francesa Louis Vuitton e
Aécio Neves a italiana Ferragamo. Essa característica dos dois candidatos foi
percebida pela repórter Ana Claudia Guimarães. Se fizessem isso nos Estados
Unidos estariam fritos. Há tempo, o candidato democrata George McGovern comeu o
pão que Asmodeu amassou porque visitou uma fábrica de sapatos calçando
mocassins italianos. O governo da doutora sobretaxa os sapatos chineses
baratinhos e, com isso, encarece os produtos comprados pelo andar de baixo.
Tudo bem, pois o Brasil já foi um dos maiores fabricantes de calçados do mundo
e perdeu a posição. É compreensível que o setor receba algum tipo de proteção.
Contudo, fica difícil entender que um emergente não possa comprar sapatos
chineses por R$ 50 e a presidente da República faça campanha calçando Vuitton.
(R$ 1.200 para um modelo simples.) No
último ano, a indústria calçadista brasileira perdeu pelo menos 20 mil postos
de trabalho. Há 20 anos empregava 500 mil pessoas e agora ocupa 300 mil. O
mercado interno encolheu e em agosto as exportações brasileiras de calçados
caíram 3% em relação a 2013. A doutora também poderia dispensar o xale Vuitton
que usou na visita do Papa e repetiu numa assembleia da ONU. Quando por nada,
para evitar o único ponto que tem em comum com os hábitos de Fernando Collor.
Ele viajava com um lote de malas dessa grife. O andar de cima nacional tem um
fraco por etiquetas estrangeiras. Quase sempre, esse tique destina-se a
sinalizar uma exorbitância de poder aquisitivo. Quem não se lembra da senhora
Sérgio Cabral numa rua de Paris mostrando a sola vermelha de seus Louboutin?
(R$ 2.500 o par.) Enquanto essa preferência vem de cidadãos comuns, ninguém tem
nada a ver com isso, mas, quando presidentes e candidatos vão a eventos
públicos com semelhantes adereços, ensinam algo. Os sapatos Ferragamo de Aécio
Neves estão mesma faixa de preço dos Vuitton de Dilma, e sua grife
estabeleceu-se a partir da qualidade e do conforto de seus produtos. Nos dois
casos, pode-se argumentar que esses sapatos seriam mais confortáveis, pois usam
couros finos. Vá lá, mas, se o negócio é conforto nos pés, o problema já foi
resolvido pela rainha Elisabeth. Antes de calçá-los, ela os manda para que
senhoras os usem, amaciando-os. Aécio
e Dilma contrapuseram-se a Marina Silva. Ela usa sapatos das marcas Beira Rio e
Renner. (R$ 100 pelo par.) Logo da Renner, uma marca fundada no início do
século XX por um neto de alemães. Ela teve uma linha de produção de louças e o
general Ernesto Geisel usava um jogo de pratos Renner em casa, com as suas
iniciais. Ganhara-os de um membro da família que fora seu companheiro de
infância em Bento Gonçalves. Quando ia deixar o governo, um grupo de grã-finos
quis presenteá-lo com um serviço de porcelana que pertencera ao magnata Eduardo
Guinle. Chiquésimo. Mandou-os passear e divertia-se mostrando a louça banal
mandada pelo amigo.
*Elio Gaspari é jornalista.
– comentarista da Folha de São Paulo e colunista de jornais de SP/RJ.
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