COMENTÁRIO
Scarcela Jorge.
EXAMINADORES
DA “VERDADE”
Nobres:
A mais profunda doença da
sociedade, ou das pessoas, é viver na mentira e alimentar-se dela. Com essa
visão, a Comissão Nacional da Verdade tentou reconstituir o período amargo e
brutal da ditadura implantada em 1964 e, assim, dar o alerta histórico sobre o que
não deve se repetir jamais. Agora, em 4 mil páginas, o relatório final pouco
acrescenta às verdades publicadas em 1985 no documento “Tortura Nunca Mais”
(elaborado por grupos religiosos em São Paulo), mas as diferenças são
fundamentais. Em plena convivência da liberdade, há ainda resquícios do espírito
de ódio implantado em 1964. A amargura do ódio mata mais do que as epidemias e
as guerras. Mata por dentro, rói as entranhas. Uma sociedade de semeadores de
ódio sempre será doentia, violenta e totalitária, sem espaço para a convivência.
Anos atrás, num mês de estupros e mortes diárias, o então prefeito de São
Paulo, Paulo Maluf, apelou aos criminosos pela TV: - Estupra. Estupra, mas não
mata! Estávamos ainda desabituados ao raciocínio livre e não percebemos que
aquilo era um convite ao horror! Hoje, outro é o convite. A partir do relatório
da CNV, a presidente Dilma corretamente lembrou que “a verdade não é motivo
para gerar ódio, acerto de contas ou revanche”, mas deve servir para a
reconciliação nacional. Sim, pois basta a verdade como punição histórica. Fora
disto, seria vingança. Se a vítima se vinga, imita o carrasco e se equipara a
ele. Por outro lado a Lei de Anistia, do final de 1979, foi o início do que se
completa, agora, com o relatório da CNV. Falta, apenas, que alguns segmentos da
sociedade especialmente os que fazem do poder uma linha de conduta ideológica e
ao mesmo tempo tentam sobressair-se de ações corruptas enraizadas na cultura de
seus costumes e, concomitantemente, as Forças Armadas se guardem como
instituições e reconheçam os erros dos seus chefes nos tempos em que o terror, inegavelmente
foi política de Estado.
Antônio Scarcela Jorge.
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