quinta-feira, 10 de abril de 2014

COMENTÁRIO DO ESCRITOR JOÃO BATISTA PONTES

 COMENTÁRIO
João Batista Pontes.

OS OBSTÁCULOS À ECONOMIA SOLIDÁRIA.

Há muitos anos, ao visitar uma comunidade de pescadores no litoral norte do Estado do Paraná, observei logo na chegada uma construção de alvenaria, contrastando com o casario de madeira que predominava na comunidade, por sinal muito carente, habitada pelos chamados “caiçaras”. Ao adentrar a edificação, fiquei ainda mais intrigado: Lá dentro havia câmaras frigoríficas em adiantado estado de deterioração e, aparentemente, sem mais condições de uso. Procurei me informar sobre a história daquela instalação e fiquei sabendo que fora construída por meio de um programa governamental de apoio à pesca artesanal. 
O objetivo era possibilitar aos pescadores condições de conservar o pescado por alguns dias para depois levá-los para venda em Paranaguá, principal cidade daquela região. Com a venda direta eles poderiam aumentar a renda individual, eliminando a ação dos “atravessadores”. Intrigado, procurei investigar os motivos que levaram os pescadores a não utilizar as referidas instalações, que lhes foram cedidas gratuitamente e que pareciam adequadas para a conservação do pescado. E a explicação era simples: havia na colônia algumas pessoas que compravam o pescado diariamente dos pescadores, armazenavam e depois vendiam em Paranaguá. Esses “intermediários” tinham também mercearias e forneciam mercadorias que os pescadores necessitavam especialmente mantimentos. Sem condições financeiras, os pescadores entregavam diariamente o produto de seu trabalho aos referidos comerciantes. Além do mais, a maioria destes já tinham acumulado grandes dívidas com os “atravessadores”, passando a viver numa verdadeira situação de escravidão. Neste contexto, os “intermediários” deixaram claro que todo pescador que decidisse utilizar a instalação, não teria mais crédito em seus estabelecimentos comerciais. E nenhum dos pescadores tinha condições de se manter sem aquele crédito. E o programa do governo fracassou por falta de identificação dos obstáculos que poderiam impedir o alcance dos seus objetivos. Tivessem feito um diagnóstico correto, teriam visualizado a necessidade de concessão de um pequeno empréstimo inicial aos pescadores para que estes se libertassem dos “atravessadores”, tendo condições de se manterem por alguns dias sem a renda do pescado, bem como desenvolvido ações voltadas à conscientização sobre as vantagens de estruturação de uma economia solidária. Temos aí um exemplo claro, ainda que rudimentar, de como o capitalismo se estrutura e como se processa a concentração de capital, que deságua no fosso separador de pobres e ricos. 
Aí está o primeiro, e talvez o maior obstáculo, à estruturação e consolidação de uma economia solidária – por meio de associações e cooperativas-, organizações voltadas predominantemente ao desenvolvimento integral do ser humano como sujeito, ator e fim da economia. Esses “obstáculos” estão dentro da própria comunidade e agem contra a organização e estruturação da economia solidária por interesse pessoal, um tipo de egoísmo exacerbado – querem acumular mais e mais dinheiro, e posses, e poder. -  E eu acredito que a economia solidária é o único movimento capaz de responder às grandes ameaças que a concentração empresarial e a exclusão social representam contra a democracia e a paz social.

*João Batista Pontes, novarrussenseescritor - geólogo – sociólogo - matemático – consultor legislativo inativo do Senado Federal - área Orçamento Público.
– bacharelando em direito.
– residente em Brasília DF.


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