segunda-feira, 28 de abril de 2014

DN. COLUNA - IDÉIAS/OPINIÃO

 Jornalismo e alma

Antes da era digital, em quase todas as famílias existia um álbum de fotos ou uma caixa de sapatos cheia de fotografias. Lá estavam as nossas lembranças, os nossos registros afetivos. Muitas vezes abríamos o álbum ou a caixa e a imaginação voava. Agora, fotografamos tudo e arquivamos compulsivamente. Nossa antiga caixa de sapatos foi substituída pelas galerias de fotos de nossos dispositivos móveis. Temos overdose de fotos, mas falta o mais importante: a memória afetiva, a curtição daqueles momentos. Também consumimos informação. Navegamos no espaço virtual.

Uma enxurrada de estímulos dispersa a inteligência. Ficamos reféns da superficialidade. Perdemos contexto e sensibilidade crítica. A fragmentação dos conteúdos pode transmitir certa sensação de liberdade. Não dependemos, aparentemente, de ninguém. Somos os editores do nosso diário personalizado. Será? Não creio, sinceramente. "Hoje", dizia Nelson Rodrigues, “ninguém imagina o que eram as velhas gerações românticas da imprensa”. Mudaram o jornal e o leitor. No ano passado, houve uma chuva inédita, flagelando a cidade. Desde Estácio de Sá, não víamos nada parecido.

E todo mundo morreu e desabou, e se afogou, menos o repórter. Não houve uma baixa na reportagem. Fez-se a cobertura do dilúvio e ninguém ficou resfriado, espirrou, ou apanhou uma reles coriza. Por aí se vê entre a imprensa moderna e o fato uma distância fatal. O repórter age e reage como um marginal do acontecimento. Antigamente, não. O profissional sofria o fato na carne e na alma". O jornalismo precisa recuperar a vibração da vida, o cara a cara, o coração e a alma.

Carlos Alberto Di Franco
Professor e doutor em Comunicação.


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