COMENTÁRIO.
Scarcela Jorge.
APLICAÇÃO
NECESSÁRIA.
Nobres:
O governo surge
com mais propostas anticorrupção em resposta à crise de legitimidade. No
Brasil, toda vez que há uma forte insatisfação com o governo, apela-se para o
Direito Penal e, com um viés absolutamente populista, criam-se novas leis
criminalizando condutas e/ou agravando penas já existentes. A onda da vez é o
pacote anticorrupção, com o qual se pretende criar a figura penal de
enriquecimento ilícito de servidor público (PL 5.586/2005), como se o enriquecimento,
e não a corrupção, fosse o problema. Ao ressuscitar o projeto de lei, o governo
propõe a punição com pena de reclusão de até oito anos aos casos de
enriquecimento injustificado do servidor público. Mas e o que seria
injustificado? Frente à ausência de definição, todos os funcionários públicos terão
que ir às delegacias para comprovarem seus rendimentos e os de sua família? Em vez de reforçar a investigação do crime de corrupção passiva ou peculato, a
proposta induz a erro a população, criando mais um crime, quando o real
problema não é a falta de figuras penais, mas sim de efetiva punição nos casos
em que for devida. É tendência nacional o apelo à criminalização de uma conduta
quando os aparelhos administrativos são incompetentes. Esta lógica distorcida é
responsável pela sobrecarga do Judiciário, pelo atual estado de penitenciárias
e presídios, e, consequentemente, pela impunidade das condutas que realmente
deveriam ser criminalizadas. Diante do atual quadro político brasileiro, é
certo que o Projeto de Lei 5.586/2005, recuperado agora pelo governo,
mostra-se, mais uma vez, como uma proposta de ocasião. Na prática, esta nova
lei não inibirá a sensação da impunidade ou reduzirá a delinquência nesta
espécie, contudo, o objetivo principal não é e nunca foi outro senão a
arrecadação de votos por meio da falsa impressão de ação do governo, uma
resposta aos recentes protestos, e são grande as chances de cairmos nesta
armadilha. O Estado já sabe, mas a população deve compreender que não é a
previsão de uma pena que dissuade a prática da conduta, mas sim a certeza desta
punição. eis a razão explícita e objetiva do assunto.
Antônio Scarcela
Jorge.
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