PIPAS E POÇOS.
QUEM GANHA DINHEIRO COM A ESTIAGEM NO SEMIÁRIDO?
"MAIS DIRECIONADO AO CEARÁ"
Sobressaem-se
duas atividades: a locação de carros-pipa e a perfuração de poços profundos.
Além de definir a profundidade
das fendas, o técnico em Agropecuária, Rivaldo Leite, 56, conhecido como
"Seu Menino", que é radiestesista, ainda dá o diagnóstico da
qualidade da água.
Iguatu Três anos
seguidos de chuva abaixo da média com risco de prolongamento na atual quadra
invernosa, no sertão cearense, traz prejuízos enormes para a economia agrícola,
gerando empobrecimento no campo. Entretanto, a seca também traz bons lucros
para empresas de perfuração de poços profundos e proprietários de
caminhões-pipa. A demanda por esses serviços vêm crescendo de forma intensa e
deve permanecer ascendente ao longo do ano.
Historicamente, sempre houve quem
ganhasse com a estiagem no sertão cearense. Durante décadas, era comum o uso da
expressão "a indústria da seca". No passado, fornecedores de grãos de
péssima qualidade, apontadores de grupos de trabalhadores, alistamentos fantasmas
de agricultores, líderes políticos locais obtinham ganhos eleitorais e
materiais. As ações de enfrentamento à seca mudaram a partir do fim dos anos de
1980, eliminando as tradicionais frentes de serviço.
No contexto atual, empresas de
construção civil e prestadoras de serviços para o Estado e para particulares
lucram com o aumento da demanda por instalação de sistemas simplificados de
abastecimento de água, perfuração de poços, instalação de rede de energia
elétrica, venda de materiais elétricos, e hidráulicos.
Os exemplos são múltiplos, mas
sobressaem-se duas atividades: a locação de carros-pipa e a perfuração de poços
profundos. A demanda por busca de água subterrânea aumentou significativamente.
Estima-se que, antes de 2010, havia dez empresas especializadas atuando no
Ceará. Hoje são cerca de 30.
Não há, entretanto, dados sobre a
quantidade de poços contratados por particulares, perfurados para produtores
rurais e empresários urbanos durante o período de estiagem que castiga o Ceará.
"Imagino que, em 2013 e 2014, foram perfurados cinco vezes mais do que em
2012", estima o empresário, Michael Delano, da Dana Poços.
O geólogo Joaquim Feitosa disse
que antes do atual ciclo de seca poucos produtores rurais e empresários
mostravam interesse por perfuração de poços profundos. "A necessidade
despertou entre o governo, agricultores e empresários a importância da busca de
água subterrânea", frisou Feitosa. "Muitos viram que não podiam ficar
dependentes de carro-pipa, de pequenos barreiros que secam ou dos sistemas
locais de abastecimento de água", afirma.
De acordo com Michael Delano, 80%
da demanda são oriundos de produtores rurais e 20% de empresas e moradores de
área urbana. Em média, o metro de um poço perfurado em solo cristalino custa R$
100,00 e terreno sedimentar (aluvião), R$ 80,00. O estudo geofísico para
alocação está em torno de R$ 1,000,00. O preço médio do poço instalado é R$ 12
mil.
O custo médio de uma cisterna de
placa é estimado em R$ 18 mil. O de construção de um barreiro é bem superior.
"O poço oferta água de qualidade, abastece famílias, carros-pipa e tem
maior tempo de uso do que uma cisterna", observa Michael Delano. O geólogo
Joaquim Feitosa destaca que dezenas de empresas de Minas Gerais, Pernambuco,
Bahia, Pernambuco estão trabalhando no Ceará. O lucro estimado por poço é de
50%. "A maior parte dos recursos não fica aqui, no Estado", frisou.
No Centro do Estado, quem também
está lucrando com a seca é o empresário Francisco das Chagas Cândido Costa,
mais conhecido como "Ticão". Há mais de 15 anos ele se dedica ao ramo
de perfuração de poços na região. Após não obter muito sucesso no comércio
farmacêutico, aceitou o convite do cunhado e sócio, Francisco de Assis
Capistrano, que é geólogo. Eles investiram R$ 600 mil na compra dos equipamentos
e não pararam mais de trabalhar.
"Ticão" não revela o
lucro da sua empresa, a LA Serviços de Perfurações, mas garante ter ocorrido um
aumento substancial com a estiagem prolongada dos últimos anos. Antes de o
quadro se agravar na região, da maioria dos açudes secarem, eles perfuravam, em
média, 30 poços artesianos num mês. Agora a demanda chega a 60 poços, e tem
gente aguardando na fila.
Conforme o empresário, o tempo
médio para a perfuração de um poço é de 5 horas. O custo é de R$ 100,00 por
metro linear. A água acaba sendo encontrada numa profundidade de 60 a 80
metros. O gasto do cliente chega em torno R$ 8.000,00 somente na perfuração,
mas quem prefere o serviço completo, incluindo a bomba e a rede elétrica, o
custo chega a R$ 15 mil. Os interessados podem procurar financiamento no Banco
do Nordeste do Brasil (BNB), apesar de haver demora de até 60 dias para
liberação do dinheiro, acrescenta.
Carros-pipa
A seca, apesar de seus efeitos
negativos, acabou por contribuir para mostrar ao governo e aos proprietários
rurais que o Ceará tem água subterrânea e de qualidade. "Muitos afirmavam
que, por ter 80% do solo cristalino, não era viável programa de perfuração de
poços no Estado", disse Feitosa. "O índice de acerto tem sido bom e
os exemplos de vazão de 10 a 20 mil litros por hora ou mais crescem a cada
semana nas regiões do Sertão Central, Inhamuns e Sertões de Crateús". Em vez
de barreiros, os produtores rurais estão agora investindo em poços.
Os donos de carros-pipa também
estão lucrando com a seca. O aumento da demanda por esse serviço, contratado
pelo Exército e por meio da Defesa Civil do Estado, movimentou ainda mais os
negócios e incentivou a compra ou adequação dos veículos. Os motoristas também
ganham com a oportunidade de emprego. Os pipeiros preferem não revelar valores,
que dizem que depende de cada rota. "Se não fosse a seca, estaria sem
trabalho", disse Francisco Lima, motorista de um caminhão-pipa que
diariamente abastece famílias no sertão da Paraíba, mas que vem fazer a coleta
de água no Açude Lima Campos, em Icó, no Ceará. "O negócio deixa uns R$ 3
mil".
Radiestesia.
Acostumado a indicar locais
favoráveis para água subterrânea utilizando apenas uma vareta de madeira e um
pêndulo, o técnico em Agropecuária, Rivaldo Leite, 56, conhecido como "Seu
Menino", está feliz com o número de clientes à procura das suas
habilidades com sua técnica, uma pseudociência conhecida como Radiestesia.
Apesar de angustiado com o
prolongamento da estiagem no Nordeste, para ele o período está sendo de
"vacas gordas". Ao longo de mais de 20 anos dedicados a essa
atividade nunca foi tão procurado.
Para quem recebe vencimentos
mensais de R$ 1.200,00 da Prefeitura de Quixadá na função de titular da
Coordenadoria de Defesa Civil do Município, suas habilidades em Radiestesia
estão auxiliando significativamente no orçamento familiar. O serviço custa R$
700,00. Do início de 2014 até ontem, ele já indicou mais de 50 poços, em vários
municípios do Ceará e até no Rio Grande do Norte.
Se por um lado "Seu
Menino" está triste com a seca estendida nos três últimos anos, por outro
está feliz em poder trazer do subsolo o alívio para muita gente. Ele garante
acerto de 90% nas suas análises.
Além de definir a profundidade
das fendas ainda dá o diagnóstico da qualidade da água. Por conta dos
resultados, enquanto as chuvas não voltam a banhar com abundância o Estado, a
lista de pedidos na sua agenda só aumenta. "Às vezes a alegria vem para
alguns nos momentos mais difíceis para outros. Se recebi esse dom, tenho que
aproveitá-lo", ressalta.
Nos últimos 12 meses, além de
Quixadá, "Seu Menino" realizou trabalhos com sua técnica nos
municípios de Quixeramobim, Madalena, Ocara, Banabuiú, Morada Nova, Guaiuba,
Maranguape, Caucaia, e Cascavel. Ainda segundo o radiestesista, a Prefeitura de
Ibicuitinga lhe contratou para indicar o local de perfuração de 27 poços.
Mas foi em Boa Viagem que
encontrou o seu mais recente desafio. Após o proprietário de uma fazenda, na
localidade de Pedra da Guia, situada a pouco mais de 15 Km do Centro da cidade
gastar com a perfuração de 10 poços, sem encontrar água, contratando uma empresa
com geólogo, por exigência do Banco do Nordeste do Brasil (BNB), foi nas mãos
dele, indicando o local do 11º poço que o fazendeiro acabou encontrando água.
"O poço deu vazão de 10 mil litros por hora e a água é boa", comentou
feliz.
Fonte: (texto) Agência Diário.
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