Apesar de 93% das crianças estarem na escola, maior parte tem
dificuldade para ler, escrever e fazer contas.
Universalizar a educação
infantil, alfabetizar todas as crianças até o final do 3º ano do ensino
fundamental, fomentar a qualidade da educação básica e investir 10% do Produto
Interno Bruto (PIB) em educação são algumas metas do Plano Nacional de Educação
(PNE), sancionado no último dia 26 de junho, pela presidente Dilma Rousseff.
Aprovado com três anos de atraso, o Plano é composto por 20 metas que deverão
ser alcançadas nos próximos dez anos (até 2024).
No Ceará, 93% das crianças de 4 e
5 anos estavam na escola em 2012 (239.205) e a meta é atingir 100% até 2016.
Apesar da quantidade significativa, superior inclusive à média nacional
(82,2%), chama a atenção a má qualidade do ensino, revelada pelos baixos
índices de aprendizagem. Levando em conta que uma criança só é considerada
alfabetizada quando se apropria da leitura e da escrita como ferramentas
essenciais para seguir aprendendo, desenvolvendo a sua capacidade de se
expressar e de participar do mundo cultural no qual está inserido, o cenário
não é nada animador.
Aprendizado
Em todo o Estado, apenas 42,15%
das crianças do 3º ano do ensino fundamental apresentaram aprendizado adequado
em leitura. Porém, a situação mais preocupante é a do aprendizado adequado em
matemática (18,83%) e em escrita (18,44%), ainda muito aquém do esperado - 100%
até 2024. Em relação à média nacional, os índices do Ceará também estão
bastante inferiores. O porcentual de todos os estados foi de 44,54% de
aprendizado adequado em leitura, 33,33% em matemática e 30,09% em escrita.
Aos 5 anos, Ana Lívia Silva,
aluna da Escola Municipal Mozart Pinto, no bairro Jardim América, ainda não
sabe fazer contas, mas já se encanta pelo universo da leitura. Ao ser
questionada sobre qual era o seu nome completo, de prontidão começou a soletrar
letra por letra. "O que eu mais gosto é de conhecer letras",
enfatiza. Ela conta que na escola aprendeu a ler histórias. As suas preferidas
são da Mônica e sobre duendes.
Já Raissa Costa da Silva, 5, tem
como histórias preferidas as do Saci Pererê. Ela também gosta de desenhar, mas
diz que a sua atividade preferida é brincar com os colegas na sala de aula.
Apesar de afirmar que gosta de fazer contas, Raíssa confessa que tem
dificuldades, mas tem a ajuda do pai em casa. "É difícil. Eu não sei,
porque só tenho 5 anos", justifica.
Jacqueline Lucas Costa Lima,
professora do Infantil V da Escola Mozart Pinto comenta que geralmente as
crianças têm dificuldade de raciocínio e interpretação de texto. Um grande problema
que identifica é a falta de diálogo, acompanhamento e estímulo por parte dos
pais em casa. "Leitura e interpretação textual é o que mais se batalha na
escola, mas não tem continuidade em casa. O professor tem que fazer milagre,
pois o que as crianças aprendem é em sala de aula. Em casa, falta estímulo para
elas pensarem", ressalta.
Outra crítica que faz é em
relação à aprovação progressiva. Trata-se dos alunos que são matriculados de
acordo com a idade, e não com nível em que estão. "Isso é muito prejudicial,
o professor não tem como dar atenção a um só aluno. A criança do terceiro ano
que não sabe ler e nem escrever vai se sentir diminuída porque não consegue
acompanhar e vai acabar bagunçando, atrapalhando a aula. E o mais grave, ela
vai se desinteressar pelos estudos", alerta.
Inês de Freitas Segundo,
coordenadora pedagógica da Escola Mozart Pinto, informa que a Prefeitura de
Fortaleza vem há algum tempo fazendo com os professores um trabalho de formação
continuada, que acontece mensalmente.
Acrescenta, ainda, que é
disponibilizado pelo Governo do Estado todo um material estruturado - o
Programa de Alfabetização na Idade Certa (Paic) -, para diferentes faixas
etárias e níveis de aprendizado. "Estamos trabalhando nessa linha de
embasamento de um material que possa dar suporte à alfabetização para que a
criança possa aprender", esclarece.
O observatório do PNE informa
também que, no ensino fundamental, a porcentagem de crianças de 6 a 14 anos
matriculadas no Ceará em 2012 era de 93,8% (1.290.234), igual à média nacional
(93,8%), enquanto os jovens de 16 anos que concluíram o ensino fundamental
somavam 139.960 (70%), superando a média dos estados (67,4%).
No ensino médio, eram 445.302
jovens de 15 a 17 anos na escola em 2012 (82,8%) e 297.540 matriculados no
ensino médio (55,3%), enquanto a média nacional foi de 81,2% e 54,4%,
respectivamente. A partir do PNE, todos os planos estaduais e municipais de
educação devem ser criados ou adaptados em consonância com as diretrizes e
metas estabelecidas.
Problemas no Estado são estruturais
Apesar dos avanços que o Ceará
vem apresentando nos últimos anos, muito ainda precisa ser feito para garantir
uma educação de qualidade para todos. Na visão da pedagoga Raquel Dias,
professora da Universidade Estadual do Ceará (Uece), ainda que se considerem
alguns avanços no que diz respeito à redução da taxa de analfabetismo e
elevação dos índices do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) no
Estado, analisando o conjunto percebe-se que alguns problemas são estruturais.
"A não universalização da
educação básica (0 a 17 anos), uma vez que a atenção concentra-se no ensino
fundamental; a má qualidade do ensino público, revelada nos baixos índices de
aprendizagem; a não valorização dos profissionais da educação, evidenciada no
elevado percentual de professores temporários na rede estadual que alcança 60%
do total e nas precárias condições de trabalho", cita.
Em relação à meta que trata da
destinação de 10% do Produto Interno Bruto (PIB) para a educação, embora se
apresente como uma conquista, afirma que na forma em que foi aprovada poderá
inviabilizar a efetivação das metas direcionadas especificamente ao segmento
público, pois possibilita a destinação de recursos públicos para a privada,
através do Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies), do Programa
Universidade para Todos (Prouni), de isenções de impostos, de bolsas. No
entanto, a especialista destaca que não se trata de rever a meta, mas o próprio
caráter do Plano, que se revela privatista.
Aplicação
Para melhorar os índices e a
qualidade da educação pública do Ceará, Raquel afirma que seria necessário, em
primeiro lugar, a aplicação imediata de 10% do PIB na educação pública. Junto
com isso, redefinir prioridades do orçamento dos governos federal, estaduais e
municipais, dando atenção especial à educação e às políticas sociais. Outra
política nesse sentido que cita seria a definição de um plano de obras públicas
visando a construção de escolas e creches.
Reginaldo Pinheiro,
vice-presidente do Sindicato Apeoc, ressalta que o PNE é importante porque
trata de questões fundamentais no que tange ao financiamento da educação. Ele
afirma que hoje o Ceará investe 6,4% do PIB na educação, mas a meta é que seja
10% em 2024. Para isso, frisa que é necessário que os recursos dos royalties do
petróleo e do pré-sal sejam contabilizados para a educação.
Outro ponto importante que o
sindicalista pontua é em relação à formação, remuneração e carreira dos
professores. "A gente considera central que até o 6º ano de vigência do
plano o salário dos professores da educação básica seja equiparado ao
rendimento médio (salário) dos demais profissionais com escolaridade
equivalente", salienta.
Efetivação
Para Pinheiro, o grande desafio é
para que os estados e municípios possam, a partir de uma discussão com a
sociedade civil organizada e os sindicatos, elaborar os seus planos com base
nas metas do PNE. "Não tem mais a desculpa de que não há um parâmetro
nacional", destaca. Ele afirma que já se pode comemorar os avanços que o
plano traz, mas reforça que a luta agora é para que as metas sejam alcançadas e
se tornem política de estado, e não de governo.
"Temos que cobrar para que
os governos efetivem o que está proposto no plano e que ele seja aprovado em
consonância com a lei federal", conclui Pinheiro.
Luana Lima
Repórter.
Fonte: DN.
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