Há 198 anos, a Argentina
proclamou a independência do domínio espanhol. No mesmo 9 de julho, mas em 2014
e em terras brasileiras, o país se tornou independente de quem, na verdade, o orgulha. No
estádio de Itaquera, a seleção ficou no 0 a 0 com a Holanda no tempo normal e
na prorrogação e, nos pênaltis, chega pela primeira vez a uma final de Copa do
Mundo desde a aposentadoria do eterno ídolo Maradona.
Em 1990, na Itália, Maradona
levou o país à decisão. Nesta quarta-feira, a Argentina não precisou nem de
Messi, já que o agora herdeiro da camisa 10 e da faixa de capitão não acertou quase nada em São Paulo, a não ser
ao converter sua penalidade. O goleiro Romero, porém, foi suficiente,
defendendo as cobranças de Vlaar e Sneijder e garantindo vitória na disputa por
4 a 2.
Durante os 120 minutos anteriores
aos pênaltis, o que se viu foi um duelo tático, cheio de marcação e com pouco
espaço para Messi e Robben mostrarem por que são candidatos a craque do
torneio. No fim do tempo normal, contudo, Mascherano virou herói ao dar
carrinho e bloquear chute de Robben na pequena área. Como também faltou
eficiência nos pênaltis, cabe a Holanda disputar o terceiro lugar às 17 horas
(de Brasília) no sábado, no Mané Garrincha.
No domingo, é a vez de os
argentinos tentarem voltar a ser campeões mundiais a partir das 16 horas, no Maracanã. A
divindade atribuída a Maradona é lembrada até hoje em canções das torcidas e
explica a presença do país na final de 24 anos atrás diante da Alemanha, que
celebrou seu tricampeonato. Agora, diante do mesmo adversário, cabe à seleção
de Messi se vingar da frustração de Maradona na Itália.
O jogo – Argentina
e Holanda escolheram estratégias diferentes para anular o astro adversário.
Enquanto Louis Van Gaal ordenou a De Jong que não ficasse nunca a mais de dois
metros de Messi, Alejandro Sabella cumpriu sua promessa de aproximar laterais e
zagueiros para não dar espaço para as arrancadas de Robben.
Os coadjuvantes eram exemplos de
obediência a esquemas táticos. Os sul-americanos tinham em Mascherano o comando
da saída de bola. O volante virou terceiro zagueiro diversas vezes para soltar
Zabaleta e Rojo como alas. Mesmo quando não tinha a bola, ordenava aos colegas
que adiantassem a marcação e, também, valorizassem a posse, sem se desesperar.
O problema era achar espaço na
frente. De Jong, se precisasse, recebia a ajuda de mais ou dois companheiros
para acompanhar Messi, que não conseguia ser mais efetivo no jogo mesmo com
toques de primeira para dar dinâmica à sua seleção, que não tem um meia de
criação. Pelos lados, Kuyt e Blind corriam para alternar o esquema do 5-3-2
para o 3-5-2.
Os laranjas, por sua vez, tinham
Robben bem anulado e Sneijder só tinha a passagem de Wijnaldum como opção, já
que Van Persie se mostrava bem confortável diante da marcação adversária, não
se mexendo para aparecer nas costas da zaga, como fez com perfeição ao fazer um
golaço de peixinho na estreia da Copa, sobre a Espanha.
Nesse duelo tático, os times se
mexiam em bloco de uma intermediária a outra, sem conseguir espaço para
finalizar ou levar perigo. O primeiro perigo só veio aos 12 minutos, quando
Mascherano errou saída de bola e Kuyt ajeitou para Sneijder finalizar perto do
gol de Romero. Do outro lado, Romero foi parado com falta e Messi cobrou forte,
nas mãos de Cillessen, aos 14.
A primeira equipe a se mexer para
escapar das marcações foi a Argentina. Sabella inverteu os posicionamentos de
seus dois pontas e Lavezzi começou a dar trabalho pela direita, sendo acionado
diretamente por Mascherano. Forçando por ali, gerou preocupação e escanteio que
Garay desviou com peixinho rente ao travessão, aos 23.
Em meio à tensão, Cillessen
despertou risos holandeses dando drible humilhante em Higuaín dentro da área.
Os argentinos ainda levaram um susto quando Mascherano caiu totalmente grogue
no gramado e precisou de dois minutos para se recuperar completamente e
continuar em campo sem gerar preocupação.
Quem também se ajustou foi a
Holanda, fechando os espaços que Lavezzi tinha e contando com a eficiência de
seus zagueiros para cortar os cruzamentos. Até que Demichelis foi ao ataque
para dar um pontapé em Sneijder e, como escapou de cartão, Martins Indi passou
a fazer o mesmo com Messi, aliviando para De Jong, recém-recuperado de lesão.
Preocupado em bater, o zagueiro
holandês levou amarelo e deixou Higuaín livre na grande área. Para sua sorte,
nos acréscimos do primeiro tempo, Pérez não conseguiu cruzar para o
centroavante, mas Van Gaal abriu mão de seu defensor, um sério risco de
expulsão, e deu mais opções ofensivas à equipe.
O time laranja voltou do
intervalo com Janmaat, com gás para marcar e atacar mais. Kuyt passou a jogar
na ala esquerda e Blind virou zagueiro. O esquema não mudou, mas as novas peças
permitiam à Holanda marcar mais na frente e dificultar o toque de bola
argentino, que já não encontrava mais Lavezzi à disposição para criar problemas
pela direita.
Robben não conseguiu arrancar nem
Van Persie aparecia, mas os europeus tinham o domínio do jogo por verem que a
Argentina só tentava atacar forçando jogadas individuais, e até Messi era
desarmado com tranquilidade. Van Gaal, então, priorizou o toque de bola,
trocando o cansado De Jong por Clasie. O time laranja que só gosta de
contra-ataque tabelava como queria na intermediária rival. Sem, contudo, levar
real perigo.
Em meio à falta de eficiência,
Messi e Sneijder passaram vergonha com suas camisas 10 às costas, isolando a
bola em cobranças de falta. Já os camisas 9 não sabiam se posicionar, já que
Van Persie e Higuaín só assustaram quando estavam impedidos. A teia armada
pelos dois times amarrava o jogo.
Aos 36, Sabella, que chegou a
discutir com Higuaín durante o segundo tempo, cansou do centroavante para
apostar na movimentação de Aguero. O atacante, no entanto, só apareceu ao
atrapalhar a reposição de bola de Cillessen após boa defesa em chute de Rojo. Palácio,
que substituiu Pérez aos 35, também quase não foi percebido. A Argentina não
conseguia assustar.
Até que, aos 45 minutos do
segundo tempo, Robben teve a sua primeira chance real. A Holanda tocou a bola
até Sneijder tabelar com o atacante e ajeitar de calcanhar para o camisa 11 na
área, demorar a finalizar e, já de frente para Romero, parar em impressionante
recuperação de Mascherano, autor de carrinho que salvou seu país na pequena
área.
No início da prorrogação,
Argentina apertou a saída de bola holandesa, mas Cillessen mal precisava
trabalhar porque mesmo Messi não acertava quase nada sob frio e chuva em
Itaquera. Do outro lado, Van Gaal abriu mão da especialidade do goleiro reserva
Tim Krul para defender pênaltis e mostrou que queria definir o jogo com a bola
rolando sacando o imperceptível Van Persie para apostar em Huntelaar.
Quem realmente entrou no jogo,
contudo, foi Robben. Sneijder o procurava a todo o momento e o astro resolveu
aparecer bem, como quando driblou três rivais em curto espaço até ser desarmado
por Mascherano ou em finalização de fora da área nas mãos de Romero. O cansaço
argentino parecia ajudá-lo.
Sabella, por sua vez, gastou sua
última substituição pensando em preencher o meio-campo com alguém mais
descansado, trocando o esgotado Lavezzi por Maxi Rodriguez. O meia, contudo,
virou um dos sete ou oito jogadores que ficavam atrás da linha da bola para ver
o toque de bola holandês. Os sul-americanos não apostavam em nada além de
contra-ataques, todos ineficientes.
Mas, em meio ao cansaço dos dois
times, Palacio quase levou Sabella ao infarto. Aos nove da última etapa do
jogo, o atacante, sozinho na grande área, cabeceou a bola nas mãos de
Cillessen. Minutos depois, Messi acordou e deixou Maxi Rodriguez em condições
de evitar os pênaltis, mas foi mais um a facilitar o trabalho do goleiro
holandês.
Nas cobranças, contudo, nenhum
argentino ajudou o arqueiro europeu, que viu Messi, Garay, Aguero e Maxi
Rodriguez balançarem as suas redes. Do outro lado, Romero parou Vlaar e
Sneijder para garantir um sul-americano em decisão de Copa pela primeira vez
desde 2002, quando o Brasil foi pentacampeão.
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