COMENTÁRIO
Scarcela
Jorge
INCONVENIÊNCIA DA LEGISLAÇÃO
ELEITORAL.
Nobres:
Como tudo é padrão neste país “arranjar um jeito que
atalhe o princípio do desvio para suavizar ações dispensáveis a custo. Não
poucos sérios cidadãos brasileiros festejam as novas regras que presidem as
eleições municipais deste ano. A leitura acrítica das normas os leva ao
entendimento de que elas eliminam alguns dos velhos vícios que do modelo político-eleitoral
sob o qual vivemos. De fato, perpetuou-se no poder praticamente a mesma
linhagem de políticos eleita e alimentada pelo financiamento empresarial de
suas campanhas e, em decorrência disto, do sistema de lucrativas trocas entre
governos e grandes grupos econômicos. A pretensa “liberdade” de se gastar com
campanhas caríssimas assegurou às oligarquias manter-se no poder, distante da
ameaça do surgimento de novas lideranças ou porque estas não tinham os mesmos
acessos às fontes de financiamento ou, se os nomes eram novos, o DNA de sua
formação era o mesmo dos antigos. Os remendos legislativos que se vêm fazendo,
e que serão aplicados no pleito de 2016, decididamente não são remédios para
resolver dificuldades. Por isso, ao proibir o financiamento de campanha por
empresas, permitido apenas as doações de pessoas físicas, invento que o Brasil
se livrara do mal que gerou o petrolão, apenas para citar o exemplo mais atual
e escandaloso do conluio criminoso entre empreiteiras, políticos, lobistas,
administradores públicos, partidos, doleiros, tudo junto e misturado. Não,
agora, pela nova legislação, candidatos e partidos já não podem esperar que
construtoras paguem por suas campanhas. Será? As novas regras proíbem também o
uso de cavaletes e outdoors, limitam tamanhos de cartazes, tudo para deixar as
campanhas mais baratas e tornar as disputas eleitorais mais iguais entre
candidatos pobres e ricos, partidos grandes e pequenos, segundo a pretensa
intenção dos legisladores. Logo, seria legítimo imaginar que, ficando tão
“pobres” quantos todos os demais adversários, os políticos tradicionais outrora
favorecidos pelas grandes corporações, acabariam, potencialmente, sendo
substituídos pelos mais novos. Aconteceria a almejada renovação na política
brasileira. O “aprimoramento” legislativo não cessa nestes pontos criados para
tornar mais limpas as eleições. Os programas do horário eleitoral gratuito de
rádio e TV foram encurtados à metade (de 20 para 10 minutos em cada um dos dois
blocos diários). E mais: o período de campanha cai dos costumeiros 45 dias que
antecedem o pleito para 35 dias. Ou seja: vai se gastar menos com produção dos
programas, o que em tese também favoreceria os menos abastecidos de recursos e
de experiência. Outra chance para a renovação. As supostas boas-intenções
contidas na nova legislação não encontram respaldo na opinião de advogados e
juristas que atuam no ramo eleitoral. Em primeiro e mais importante lugar: a
proibição de doações empresariais não impede que elas continuem acontecendo para
abastecer o “caixa 2” dos partidos e candidatos, da mesma forma que antes já
ocorria. E agora com um sério agravante: respondem pelo crime de caixa 2 tão
somente os candidatos, o que, na prática, isenta as empresas de
responsabilidade. Na prática, continuam auferindo mais vantagens em relação às
doações ilegais os mesmos que, já tendo se servido delas e já com mandatos e
posições políticas importantes, têm mais possibilidades de manter a fidelidade
dos seus tradicionais financiadores – facilidade que não contam os novos e
sérios pretendentes a cargos eletivos. Facilidades, aliás, que podem ser
decorrentes de atos ilícitos, como, por exemplo, do propinodutos da Petrobras
descoberto na Lava Jato. Neste sentido, pois, apesar da aparência moralizadora,
a lei não só parece inócua como também cria dificuldades até mesmo para a
apuração de delitos e punição dos que se presta a não contabilizar suas
doações. Da mesma forma não favorecem as almejadas renovação e moralização da
política as limitações de acesso aos meios de comunicação por parte dos
partidos menores e de seus candidatos, cujos tempos nos horários gratuitos de
rádio e tevê tornaram-se ainda mais exíguos ou mesmo inexistentes. Os remendos
legislativos que se vêm fazendo desde 2013 e 2015, e que serão aplicados no
pleito de 2016, decididamente não é alívio salvador que mereceu aplausos
iniciais. Ainda falta a verdadeira reforma política a mãe de todas as reformas.
Falta, sobretudo, aos políticos atuais, a vontade de mudar verdadeiramente,
porque isto lhes soa perigosamente e não mudam aquilo que venha contrariar a
força do corporativismo.
Antônio
Scarcela Jorge.
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