EX-DIRETOR DA ANEEL
CONDENA PROPOSTA DE 'CORTE DE LUZ'.
O governo errou ao propor o modelo
de renovação das concessões do setor elétrico, cuja ponta mais conhecida é o
corte nas contas de luz anunciado pela presidente Dilma Rousseff em cadeia de
rádio e TV. A avaliação é do ex-diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica
(Aneel), Edvaldo Santana, que deixou o cargo na semana passada após 13 anos de
atuação no órgão regulador, onde começou como superintendente e cumpriu dois
mandatos como diretor.
Segundo ele, a mudança tornou as
empresas passivas e dependentes de repasses bilionários do Tesouro Nacional.
"Tenho certeza de que o governo, quando fez isso, não pensou que a conta
iria sobrar para o Tesouro. Se tivessem imaginado que iria dar nisso, não
fariam", afirmou, em entrevista exclusiva ao Broadcast, serviço em tempo
real da Agência Estado. Procurado, o Ministério de Minas e Energia não
comentou.
Para manter a redução de 20% na
conta de luz, a União transferiu R$ 9,6 bilhões para as distribuidoras de
energia este ano. O dinheiro serviu para bancar várias despesas, principalmente
com a energia gerada pelas usinas termoelétricas, acionadas por causa da
escassez de chuvas, que reduziu o nível dos reservatórios das hidrelétricas.
Esse gasto sempre foi pago pelo
consumidor, mas, se tivesse sido repassado às tarifas neste ano, resultaria num
reajuste de 10%. Às vésperas das eleições, o governo decidiu pagar a conta e
diluir esse aumento ao longo dos próximos cinco anos.
Tudo indica que, para 2014, os aportes
do Tesouro para manter o desconto na conta de luz devem atingir valores
semelhantes aos deste ano. "O cenário, no que diz respeito à necessidade
de repasse de recursos do Tesouro, tende a ser igual", afirmou. "Para
2014, não tem mais jeito, até porque é um ano difícil de ter mudanças
profundas. Mas não acredito que alguém deixe continuar assim."
Forma
Aproveitar a renovação das
concessões para reduzir a tarifa de energia era um objetivo correto, segundo
Santana. O problema é a forma como isso foi feito. As discussões para a
elaboração a Medida Provisória 579, que mudou o marco regulatório do setor,
foram restritas a poucas pessoas, que não previram que as despesas que antes
eram facilmente bancadas pela tarifa seriam muito maiores em períodos de seca.
"Não foi a Aneel quem fez o
cálculo. Foram algumas pessoas da agência. Essas pessoas fizeram a conta
errada, porque não tinham conhecimento para propor o que foi feito", disse
Santana. "Com a centralização, agora todo o setor é dependente do governo.
Isso é muito ruim."
A consequência desse erro é que
hoje, segundo Santana, o País voltou ao cenário das décadas de 1970 e 1980,
quando a tarifa de energia era baixa, mas a remuneração das empresas era
garantida. Como a tarifa não cobria as despesas das empresas, em 1993 o Tesouro
teve de aportar US$ 27 bilhões para salvar as companhias do setor.
Santana diz lamentar que as
discussões no governo hoje estejam centradas em diminuir o tamanho dos aportes
do Tesouro ao setor, e não em acabar com essa injeção de recursos. Na avaliação
dele, há duas formas para resolver o problema.
Uma delas é descentralizar os
leilões de geração de energia, hoje feitos pela Aneel e pela Empresa de
Pesquisa Energética (EPE). No modelo atual, o governo organiza o leilão ao
reunir geradores e distribuidoras na disputa, equilibrando oferta e demanda.
Mas, segundo Santana, a presença
do governo nos leilões foi prejudicial, porque a União passou a ficar com a
responsabilidade por qualquer problema que surgisse no processo.
A outra saída, mais radical,
seria retirar as distribuidoras do processo de compra e venda de energia. Nesse
modelo, que existe nos Estados Unidos e na Europa, o próprio consumidor escolhe
o gerador que vai fornecer energia para a sua casa e a empresa assume os riscos
do negócio. A distribuidora é responsável apenas pelo fio que leva a energia
até as residências.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
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