PT 'CURTIU DEMAIS O PODER', DIZ LIVRO BRITÂNICO SOBRE TRAJETÓRIA DO PARTIDO.
O Partido dos Trabalhadores está tão
desgastado que perdeu todas as chances de vencer as eleições de 2018. Tal
diagnóstico não vem de adversários da legenda no Brasil, mas de duas
experientes observadoras britânicas do cenário político brasileiro.
Branford, durante anos especialista da BBC em assuntos
latino-americanos, argumenta que uma derrota eleitoral e três anos pode ser uma
"bênção disfarçada" para o PT, uma chance de o partido repensar seus
rumos e se reconectar com suas raízes ideológicas, uma tarefa nada fácil.
"Entrevistamos membros fundadores do PT e eles
mesmos expressaram dúvidas sobre a capacidade de recuperação do partido. Essa
crise é séria não apenas para o PT, mas para a esquerda brasileira",
avalia a britânica.
Ela e Rocha, colaboradora da BBC e do jornal The
Guardian no Brasil, são contundentes na análise da ascensão do PT ao poder.
Embora definam como necessário o jogo de alianças com partidos ideologicamente
opostos, as britânicas criticam a direção escolhida após o primeiro mandato de
Luiz Inácio Lula da Silva.
"O PT no primeiro mandato de Lula foi imenso,
especialmente no que diz respeito à redução dos níveis de pobreza no
Brasil", diz Rocha. "Mas o partido acabou simplesmente curtindo demais
o poder, o que é até compreensível para quem jamais o tinha ocupado."
"O PT perdeu o foco, que era o de trazer as
mudanças prometidas como alternativa à política tradicional no Brasil. Mesmo a
política econômica ficou aquém das reformas que eram necessárias para que o
país agora não se visse em situação ruim, o que só piora a questão
política", diz Rocha.
Lula recebe atenção especial de Branford e Rocha na
análise do que "deu errado". Se elogiam a transformação do
ex-presidente - de figura temida pelas elites a estadista -, as jornalistas
revelam decepção com sua atuação na articulação política.
"O PT tinha um problema grave para governar. Era
um partido minoritário que precisava ter controle do Legislativo em um sistema
político altamente corrupto", analisa Branford.
"O compromisso era
necessário, mas o PT também tinha a chance de continuar lutando por mudanças,
sobretudo usando os movimentos sociais, para enfrentar problemas também como a
corrupção. Mas terminou negando suas origens".
O estrago na imagem do PT, na opinião das jornalistas,
pode ter sido grave o suficiente para danificar seriamente as chances de uma
possível candidatura de Lula à Presidência em 2018.
Rocha aponta para o que classifica como um vácuo no
partido: a ausência de uma alternativa forte que tenha uma imagem desvencilhada
do desgaste de Lula e Dilma Rousseff ou que represente uma
"reinvenção" do PT.
Rocha diz achar improvável o surgimento de uma nova
liderança mais associada às origens esquerdistas do partido nos moldes do que
ocorreu com o Partido Trabalhista britânico, que escolheu o "azarão"
Jeremy Corbyn como novo líder, mas elogia o prefeito de São Paulo, Fernando
Haddad.
"Haddad é um nome prestigiado, mas não o vejo com
um apelo nacional forte o suficiente. Sobretudo porque um dos principais
problemas é enfrentar uma mídia que, no Brasil, tem um forte sentimento
anti-PT. O escândalo de corrupção da Petrobras, por exemplo, tem praticamente
todos os partidos envolvidos, mas a mídia tem se concentrado no envolvimento do
PT".
Para as autoras, embora a direita tenha sido derrotada
na eleição presidencial, ela agora se mostra "mais poderosa e perigosa que
nunca". Branford e Rocha veem o Congresso como o principal problema
político para o segundo mandato de Dilma e criticam a aliança do PT com o PMDB.
No entanto, acreditam que a guinada do Legislativo à
direita pode acabar dando um impulso ao processo de recuperação do partido.
"Muitos brasileiros acreditam que o Congresso não
está fazendo o trabalho que deve e que o país precisa de uma reforma
política", escrevem as britânicas.
Mesmo assim, a visão das jornalistas do futuro do PT é
pessimista.
"O PT perdeu muito de sua legitimidade por ter
perdido a chance de fazer reformas mais profundas na sociedade brasileira. Não
há mais a imagem de partido ético e é bem possível que a alternativa para o
futuro da esquerda brasileira esteja em outro movimento político de
esquerda", acredita Branford.
"Não sabemos se o PT vai se recuperar de tudo o
que aconteceu nos últimos anos".
Fonte: BBC Londres.
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