COMENTÁRIO
Scarcela Jorge
Nobres:
Numa alusão de que toda memória do
brasileiro é curta em se tratando de política, num contraste elementar a cada
situação, entretanto, a que vivenciamos faz discorrer a lembrança da queda de
Fernando Collor de Mello, sacramentada pelo Congresso Nacional e sob a mais
estrita legalidade constitucional em 1992, é até hoje notada como uma
referência da pujança que a nossa democracia alcançou após duas sofridas
décadas de domínio de exceção promovido pelo regime militar. Naquela época, o
Partido dos Trabalhadores esteve na linha de frente dos protestos pelo
impeachment, ao lado de outras legendas políticas e entidades como a União
Nacional dos Estudantes, a Ordem dos Advogados do Brasil e a Associação
Brasileira de Imprensa. Mereceram aplausos e passaram à história os que viram
em Collor de Mello ações ou omissões caracterizadas como crime de
responsabilidade. Ela procura desconhecer a própria razão e que os dois
mandatos de Fernando Henrique Cardoso, seu partido, o PT igualmente liderou
manifestações cujo mote era “Fora FHC e o FMI”, em referência ao Fundo
Monetária Internacional. Naquela época foi um direito legítimo, afirmado pelas
vias institucionais, daqueles que viam também na gestão tucana indícios que
poderiam levar à saída de FHC do Planalto, embora a mobilização não criada
ambiente político propício a que se chegasse ao impeachment, como aconteceu com
Collor. Agora, obviamente a história se repete; à medida que o escândalo das
propinas da Petrobras ficou mais e mais cabeludo. Vários grupos, não
necessariamente vinculados a partidos políticos, aticamente vêm percorrido ruas,
notadamente de várias capitais brasileiras com o refrão “Fora Dilma. A reação
do PT e da própria presidente a essas manifestações, no entanto, deixa evidente
uma incoerência em relação à visão que o partido tinha das mobilizações que
protagonizou no passado. “Golpista” é o adjetivo mais usado nesses casos, e o
PT não está falando apenas dos verdadeiros golpistas, aqueles que deponham
Dilma: o termo, na boca da presidente e de outros membros do PT, engloba
qualquer um que vá às ruas pelo impeachment. Na opinião da presidente, agora
com maior preocupação atinge por toda sociedade em relação aos mencionados
protestos e seriam golpistas os que, seja nas tribunas do Congresso Nacional ou
nas passeatas, acreditam que a corrupção instalada nos escamentos
governamentais seria motivo suficiente para desalojá-la do Palácio do Planalto.
Dilma em sua constante alocução usa um chavão idêntico amoldado em ditadura e
tentou relativizar a visão autoritária presente na raiz da classificação que dá
aos oposicionistas: por outro lado ao analisar as discussões provocadas pela
Presidente, não dá sentido nenhum, pois o impeachment, reiteramos, é um
instrumento legal e legítimo, nas melhores democracias e se aplica aos
governantes que cometam crimes de responsabilidade, que, no exercício do poder,
adotem condutas que atentem contra a Constituição e, entre outros motivos,
atentem também contra a probidade administrativa. Assim, não poderá ser visto
como golpe se for proposto o impeachment da presidente se ficar provado que ela
sabia se beneficiou ou nada fez para conter a corrupção no seio do governo. Se
em 1992 e nos anos FHC as manifestações populares eram legítimas, por que não
considerar igualmente legítimos os movimentos que pedem o “Fora Dilma”? Sem
entrar no mérito da luta, que já comentamos em ocasiões anteriores, não há
razão para condenar sua manifestação, feita até agora de forma pacífica e
conduzida sob a proteção de cláusulas pétreas da Constituição que garantem a
livre expressão do pensamento, o que desautoriza a presidente a considerar como
golpistas os que pedem “Fora Dilma” diante ainda do escândalo da Petrobras, as
pedaladas fiscais e a crise moral principalmente, com fortes aliados corruptos
no seio de seu governo Ao demonizar a
oposição, institucional ou popular, como golpista, a presidente usa palavras e
atitudes que a aproximam do autoritarismo e parece desconhecer a legitimidade
que a Constituição confere a seus adversários. Em síntese analisamos para expor
somente o mérito, não desestimando coisa pior. Entretanto ela está usando ações
de desespero, que visualiza ser insustentável e por razão acatada pela
sociedade ética e majoritária do país.
Antônio Scarcela Jorge.
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