PAPA
ELEVA CARISMA
‘que os
populares disseram!’
Quando aguardava no centro do Rio pelo primeiro
desfile de Francisco no papamóvel, a bibliotecária de Niterói Maria Alice
Ferreira, 54 anos, ofereceu sua análise particular sobre a evolução recente do
governo da Igreja: - João Paulo II era aquela simpatia. Bento XVI tinha lá o
jeitão dele, mas era capacitado. Agora, esse papa Francisco não tem explicação.
Ele é uma simpatia maior ainda, carismático demais. - Instantes depois, quando
o papamóvel assomou na esquina e um Francisco sorridente apareceu, beijando
crianças e atiçando a massa ao vibrar como se comemorasse um gol do San
Lorenzo, seu time na Argentina, Maria Alice deu uma demonstração prática de sua
tese. Perdeu as estribeiras e gritou, emocionada. Perto dela, Paula Arcoverde,
28 anos, que conseguira escapar do serviço para ver o Pontífice, surpreendeu-se
com as lágrimas que jorravam e escorriam por seu rosto enquanto o Papa passava.
- Reações comovidas e exaltadas repetiram-se durante toda a semana, no Rio ou
em Aparecida (SP), por onde quer que Francisco passe. Elas foram definidas como
profundas manifestações de fé, mas era difícil distingui-las da atitude de um
fã diante do astro da música pop ou do cinema que idolatra. - Na noite de
quinta-feira, por exemplo, na acolhida que o Papa fez a cerca de 1 milhão de
pessoas na Praia de Copacabana, Lorena Portugal, 14 anos, sustentou por mais de
um minuto um grito estridente e agudo, como o de uma beatlemaníaca diante de
John Lennon, na hora em que Francisco passou diante dela de papamóvel. Quando
ficou a dois metros de Francisco, Lorena não se aguentou: - Perto dela, uma
mulher havia estremecido só de ver, no telão, o Papa subir no papamóvel e
acomodar-se na poltrona branca estofada do veículo. - Ai, meu Deus, é muita
santidade! - exclamou. - Em todos os eventos com o Pontífice, os fiéis
submeteram-se a horas de espera, a aglomerações sufocantes e a frio e chuva.
Tudo isso para chegar mais perto de Francisco, talvez tocá-lo. Em algumas
ocasiões, como a missa na basílica de Aparecida, peregrinos passaram até dois
dias dormindo na rua, sobre folhas de papelão, para conseguir a disputada senha
de acesso que os mais influentes tentavam obter por meio de apelos desesperados
as integrantes da organização. - Quando o Papa finalmente passava a alguns
metros de distância, depois das horas de espera e de sacrifício, vinha uma
explosão de histeria, mesmo que estivesse de costas e acenando para o outro
lado. - À euforia sucedia certo desinteresse pelo que vinha a seguir e
supostamente deveria ser o ponto alto da programação. Em Aparecida, por
exemplo, depois que o Pontífice passou pela multidão, grande parte do público
ignorou a missa. Preferiu conversar, telefonar ou até mesmo dormir. Na festa de
acolhida em Copacabana, milhares de jovens iam embora ao exato momento em que
Francisco lia seu discurso no palco. Para essas pessoas, o importante não era
tanto o que o Papa tinha a dizer. Era o próprio Papa, mais especificamente a
presença física do líder. - Ele é uma revolução para nós, porque nos sentimos
muito próximos dele - dizia, no Rio, o argentino Matías Dittieri, 20 anos,
orgulhoso de compartilhar a condição de torcedor do San Lorenzo. - Os que
prestaram atenção ao que Francisco disse não ouviram nada de muito diferente do
que o papa Bento XVI proclamou no Brasil em 2007. Francisco quase sempre leu
discursos preparados com meses de antecedência, decepcionando alguns analistas
devido à falta de novidades. O próprio discurso contra as drogas, que gerou
manchetes país afora, teve um ar de repeteco: em sua visita ao país, Bento XVI
foi a uma fazenda de recuperação de dependentes e também se pronunciou sobre o
problema. - Mas que diferença entre as duas visitas papais. Faltou a Bento o
que Francisco tem de sobra. Tímido, desprovido de carisma, pouco afeito a
improvisações, o Papa alemão desfilou em papamóvel blindado, sentado, exibindo
um sorriso tímido e acenando sem jeito. Francisco pediu carro aberto e viajou
nele de pé, rindo, gesticulando, parando para beijar crianças e até para tomar
chimarrão. Fez piadas, rejeitou qualquer tipo de luxo e esforçou-se para falar
não em português, mas em "brasileiro". Provou que a santidade, quando
acompanhada de informalidade e bom-humor, arrasta multidões.
Reportagens.
Fonte: - Agência Brasil.
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