Lula assume riscos do
governo Dilma
Possivelmente a presidente Dilma
Rousseff cumpriu um roteiro recomendado por análises de governo nas respostas
dadas à repórter Monica Bergamo, da Folha de S.Paulo, na entrevista publicada
neste domingo. O maior indicativo dessa possibilidade é a ênfase na aliança com
Lula, com 41% de aprovação registrada na mesma pesquisa que mantém Dilma no
patamar de 30%. - Esses porcentuais indicam que Dilma despencou - e permaneceu
- no patamar histórico de votação do PT, enquanto Lula se mantém muito próximo
do índice alcançado após a Carta aos Brasileiros que o elegeu pela primeira
vez. O que pode significar que parte do eleitorado não petista, que apostou em
Lula, ainda mantém a confiança no ex-presidente. - A reentrada de Lula em cena,
para além de mediar o conflito de Dilma com sua base de sustentação,
principalmente o PT, teria portanto a finalidade de estancar a migração desse
eleitorado para outras candidaturas. E também de acalmar o establishment que
sentiu-se muito mais à vontade em seus dois mandatos do que na metade do já
vivido com sua sucessora. - À parte as bravatas do ex-presidente, como a ameaça
de por "as unhas de fora", seu retorno à cena tem dois aspectos
relevantes: o primeiro, o comprometimento com os resultados do governo que
elegeu, assumindo publicamente sua defesa ao classificá-lo de uma extensão do
seu; o segundo, o de acenar para o mercado com uma correção de rumos, com
ênfase no controle da inflação. - A estratégia não sai barata para Dilma: se,
de um lado, a reafirmação de que ela e Lula são "indissociáveis" pode
atender tanto ao PT quanto à conveniência eleitoral, de outro reforça a imagem
de tutelada usada pelos seus adversários para desqualificá-la politicamente.
"Lula não vai voltar porque nunca saiu", completa a frase do ex-presidente
de que "Dilma não passa de uma extensão nossa lá" (no governo). - A
tarefa de Lula, por sua vez, é das mais difíceis, porque depende da reversão do
mau desempenho da economia. A estagnação conspira contra qualquer estratégia
política, por mais consistente, o que não parece o caso do PT, mesmo
considerando todo o carisma do ex-presidente. - O governo aposta na agenda
econômica do segundo semestre para retomar o ciclo virtuoso em que surfou no
período Lula e que não conseguiu sustentar na gestão Dilma. Além da desconfiança
do mercado, que paralisa investimentos, há agora a do eleitor, com relação ao
perfil que o marketing palaciano construiu da Dilma gestora. Nas pesquisas,
essa constatação é clara e se insere entre as maiores preocupações do governo.
- O gás que as pesquisas representaram para as outras três candidaturas é um
complicador a mais para o governo. Aécio Neves (PSB), Marina Silva (Rede) e
Eduardo Campos (PSB), sem dúvida alguma intensificaram as pré-campanhas,
explorando o momento desfavorável da presidente, com acento na inflação e na
falta de gestão. - O governador de Pernambuco começou a enfrentar o que parecia
um obstáculo grave às suas pretensões, a oposição interna à sua candidatura,
aparando arestas e mobilizando o PSB com vistas a 2014. À medida que a situação
do governo federal piora, a sua melhora, segundo as pesquisas, ainda que em
índices insuficientes para justificar otimismos. O que parece certo, no
entanto, é que a deterioração rápida do governo Dilma arrefeceu no PSB a
insegurança que a candidatura, anunciada com Dilma ainda blindada por altos
índices de aprovação, trouxe no primeiro momento. - Um possível sinal disso são
as recentes declarações do ex-ministro Ciro Gomes, respeitosas a Dilma, mas
profundamente ofensivas à sua equipe de governo. O mesmo Ciro recebeu a
incumbência de coordenar a elaboração de um programa que o partido apresentará
como referência crítica ao desempenho econômico do governo federal e que não
pode deixar de ser considerada peça de campanha. - Opositor de primeira hora, e
dos mais ácidos, da candidatura de Campos para 2014, em coro com seu irmão, o
governador do Ceará, Cid Gomes, a manifestação crítica de Ciro ao governo
Dilma, pode significar uma reavaliação sobre a oportunidade estratégica do
lançamento do governador de Pernambuco. - Aécio Neves visivelmente subiu o tom,
chamando o governo de "incapaz" e disseminando a tese de que ele já
chegou ao fim. O senador também multiplicou suas críticas, manifestando-as
tanto nas entrevistas formais quanto na chamada rede social, como fez domingo
na sua página no Facebook. - Marina Silva, ainda com a atenção dividida entre a
campanha e a constituição de seu partido, Rede, tem explorado também o mau
momento de Dilma, sustentando sua liderança nas pesquisas entre os candidatos
de oposição. Especialmente favorecida pelos protestos de rua que contestam o
modelo representativo atual, ela aproveita intensamente a sintonia de sua
proposta de mudança da cultura política clientelista do Brasil, com as
manifestações populares. - Tais cenários indicam claramente que o país já vive
a campanha de 2014, o que equivale a dizer que a presidente Dilma, que a
antecipou lançando-se à reeleição, tenta corrigir o avião em pleno voo. Está
refém da reeleição e ao mesmo tempo, impelida a aplicar receitas corretivas da
economia que conspiram contra essa meta.
Fonte: Agência O Estado.
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