domingo, 3 de agosto de 2014

BRASIL FUTEBOL - OS DOIS LADO DA MOEDA

 COMENTÁRIO.
Antônio Ribeiro.

“GOSTOU, GOSTOU. QUEM NÃO GOSTOU VÁ PARA O INFERNO.”

Antes do massacre Alemanha 7 x 1 Brasil, o professor Felipe Scolari lembrou em entrevista coletiva à imprensa que sempre faz do seu jeito e arrematou: “Gostou, gostou. Quem não gostou vá para o inferno.” De fato, justiça se faça, o treinador cujos resultados recentes foram perder a Eurocopa para Grécia em casa e rebaixar o Palmeiras para a segundona, cumpriu a promessa no Mineirão.

O inferno pode ser medido palmo a palmo. A mais elástica goleada sofrida pela Seleção Brasileira no espaço de um século. A maior derrota em uma semifinal na história das 20 copas. O resultado mais vexatório apresentado por um país anfitrião. E o improvável mesmo nas peladas de várzea: tomar 5 gols em menos de meia hora.

O atacante Fred tentou resumir o réquiem: “Uma cicatriz para toda vida”. Errou de novo. Cicatrizes podem desaparecer com cirurgias corretivas. A humilhação na gloriosa odisseia do futebol brasileiro permanecerá indelével até sob eventual intervenção de uma  força tarefa de dedicados revisionistas.

Em notável estado choque pós-goleada e com a chancela do coordenador técnico Carlos Alberto Parreira, no dia seguinte, portanto com tempo para reflexão o goleiro Júlio César, veterano de copas, asseverou ter sido um fenômeno “inexplicável”. Isso como se a razão tivesse tomado um foguete para lua fugindo do Império da Fatalidade.

Não. Todo efeito tem causa. Nada acontece por geração espontânea tal como demonstrado pelo microbiologista francês Louis Pasteur. O time alemão atual tem uma divisão de boleiros muito talentosos. O Brasil de 2014 possui bem menos. Mas não foi à proporção que fez a diferença brutal. A questão é puramente técnica.

Desde 2006 quando perderam uma copa em casa, os alemães vem se empenhando em reproduzir com teuta aplicação e pragmatismo os fundamentos das nossas mais celebradas vitórias no passado. Valorizam o toque de bola, a precisão dos passes e a mobilidade em ritmo rápido, condizente com o futebol moderno. Todos juntos e no mesmo sentido, os fatores facilitam chegar ao objetivo final, o gol.

Introduziram também uma variante na prancheta que deu certo na prática. O goleiro como líbero. Manuel Neuer é o último zagueiro. Não é novidade para quem acompanha o Bayern de Munique, campeão da Bundesliga, Liga dos Campeões — a final foi contra outro time alemão, o Borrússia — e base da Mannschaft.

Jogar junto contribui para o entrosamento. No entanto, ainda que com jogadores da mesma equipe, a comissão técnica alemã só deu folga aos jogadores uma vez.  Trata-se de engano sustentar que a vergonha dos 8 de julho se deu porque don Scolari não treinou o time com este ou aquele boleiro. O Brasil não treinou o suficiente ponto. Os moradores de Teresópolis com vista para os gramados da Granja Comary se espantaram com abstinência. Nem a presença de Neymar teria evitado a debacle.

Seria prova de imbecilidade se o 7 x 1 sobreviva apenas como uma página negra. Parafraseando Winston Churchill: “Se estiver atravessando o inferno, continue andando.” Passa da hora do Brasil aposentar a autossuficiência sem lastro, a soberba fora do lugar, a arrogância que tenta esconder o arcaísmo incompatível com o futebol moderno e, sobretudo, a corrupção da cartolagem.  Valeria a pena debruçar sobre o exemplo alemão.

*Antonio Ribeiro –jornalista – correspondente da revista Veja em Paris.


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