CINCO VISÕES: COMO
OS PROTESTOS VÃO IMPACTAR O PROCESSO DE IMPEACHMENT?
O forte crescimento dos protestos, embalados por uma
série de notícias negativas para a administração Dilma Rousseff nas últimas
três semanas, deixam a presidente ainda mais fragilizada diante do processo de
impeachment, afirmam analistas políticos ouvidos pela BBC Brasil.
Em meio a esse cenário, a nomeação do ex-presidente
Luiz Inácio Lula da Silva como um ministro de peso do governo pode ser uma
importante cartada para tentar salvar o governo petista – mas é um movimento
que embute grandes riscos também, acreditam.
Segundo estimativa do Instituto Datafolha, 500 mil
pessoas foram à Avenida Paulista, em São Paulo, no domingo, mais do dobro do
que em março de 2015.
Crescimento semelhante foi estimado pela Polícia
Militar em Brasília, que calculou 100 mil na Esplanada de Ministério ontem,
contra 45 mil há um ano atrás.
Os protestos foram marcados principalmente pelas
críticas a Lula, Dilma e PT – mas políticos de oposição que compareceram às
manifestação também foram hostilizados, caso do governador de São Paulo,
Geraldo Alckmin, e dos senadores Aécio Neves (PSDB-MG) e Marta Suplicy
(PMDB-SP).
Já em Brasília, o deputado federal Jair Bolsonaro
(PSC-RJ) foi ovacionado e carregado por centenas de manifestantes quando o
protesto já terminava. Mas a grande estrela, sem dúvida, foi o juiz Sergio
Moro, alçado a herói nacional.
Mas qual será o impacto disso tudo para o futuro da
presidente Dilma Rousseff? A BBC Brasil traz abaixo a análise de cinco
especialistas:
O cientista político Rafael Cortez, da Consultoria
Tendências, considera que a forte adesão às manifestações desse domingo são
mais um elemento que aumenta o isolamento de Dilma. Hoje, ele calcula que há
55% de chance de o impeachment ser aprovado no Congresso.
Na sua avaliação, esse processo começou três semanas
atrás, com a prisão do publicitário do PT João Santana pela operação Lava Jato.
De lá para cá, vieram à tona trechos de um suposto depoimento do senador
Delcídio do Amaral (PT-MS) com graves acusações de que a presidente e seu
antecessor tinham conhecimento do esquema de corrupção na Petrobras e teriam
tentado intervir na Justiça. Para completar, o próprio Lula foi alvo de uma
ação da PF e de um pedido de prisão pelo Ministério Público de São Paulo.
Tudo isso, nota ele, culminou numa aproximação entre
PMDB e PSDB na última semana. Inclusive, o partido do vice-presidente Michel
Temer definiu neste sábado prazo de 30 dias para decidir se deixa o governo.
"A união das lideranças do PSDB (em torno da
ideia de impeachment) e um apoio importante do PMDB (a esse processo) mostram o
outro patamar que o debate do impeachment atingiu. E aí os protestos reforçam
esse movimento que a elite política vem fazendo", nota Cortez.
Na sua avaliação, a continuidade da Lava Jato traz uma
limitação para a nomeação de Lula como ministro, mas ainda assim pode ser uma
saída para rearticular a base de apoio ao governo.
"O Planalto precisa de um choque político, e a
única ação mais forte que me parece disponível é a presença do Lula no
ministério".
"A rejeição a Lula já é extremamente elevada
entre os apoiadores do impeachment, assumindo ou não um cargo de ministro.
Eventualmente, a presença dele pode servir para mobilizar o governismo que hoje
é minoritário e desarticulado porque a Dilma não tem uma liderança relevante
mesmo dentro de seus apoiadores", acrescentou.
Pablo Ortellado, professor do curso de Gestão de
Políticas Públicas da USP.
Ortellado tem acompanhado as manifestações in loco.
Ele contou à BBC Brasil que, devido à multidão, demorou 2 horas para conseguir
chegar em casa de metrô, trajeto que normalmente leva 14 minutos.
Ele observa que, apesar do crescimento do protesto, o
perfil social dos manifestantes continua o mesmo – classe média alta
paulistana, branca, com elevada escolaridade. Mas isso não deve limitar seu
impacto no sentindo de tornar a permanência de Dilma ainda mais complicada.
"Foi o maior protesto que já presenciei",
contou. "Confirma esse cenário de crise. As forças político-institucionais
vão se sentir respaldadas, legitimadas, para continuar na tentativa de remoção
da presidente", acredita.
Apesar de o governo estar extremamente fragilizado,
ele acredita que Dilma não tornará Lula um superministro.
"Talvez ele seja a única saída do governo Dilma.
Muita gente no PT espera por isso, uma nomeação do Lula para ele assumir de
fato o governo. Mas isso é altamente improvável, porque Dilma dificilmente
cederia o poder", afirmou.
"Ela tem essa característica psicológica de
enfrentar a pressão. E acho que ele vai reagir da mesma maneira. Vai tentar
conduzir o barco até o final do seu mandato", acrescentou.
Jairo Nicolau -
cientista político e professor da UFRJ
"Provavelmente nós nunca tivemos tanta gente na
rua no Brasil num mesmo dia, pela mesma causa. É muito expressivo, dá força a
uma onda que começa a se fortalecer de afastamento da presidente",
acredita o cientista político Jairo Nicolau, professor da UFRJ.
Ele nota que na passagem de 2015 para 2016, a ideia do
impeachment parecia ter perdido força. No entanto, uma série de fatores
reacendeu esse debate.
"Havia arrefecido, mas semanas depois a gente vê
essa mudança do cenário político e o que estava faltando era o apoio popular
para dar consequência ao processo de impeachment".
"Porque somado às denúncias, que não param de
chegar, a gente tem o movimento da elite política, claramente um movimento do
PMDB que não deixa de ser uma afastamento, um cartão amarelo (para o
governo)", afirma.
Sobre a possível nomeação de Lula como ministro,
Nicolau acredita que talvez a ideia tenha chegado tarde demais.
"O Lula é um grande operador político, pode
facilitar muito a negociação com o Congresso, reconfigurar o ministério, tem
contatos internacionais, tem o apoio dos movimentos sociais – viraria uma
espécie primeiro-ministro. Mas a questão é se agora isso afeta substancialmente
a natureza do governo".
"É uma jogada de grande risco porque se o governo
afunda, também afunda a réstia de possibilidade de (o PT) ter um candidato
competitivo em 2018. Será melhor se preservar e esperar 2018? É um jogo
complexo para todos os jogadores. E tem um jogador que é o mais imprevisível, a
Lava Jato", notou.
Geraldo Tadeu Monteiro
- cientista político e professor da Uerj.
O cientista político Geraldo Tadeu Monteiro, professor
da Uerj, acredita que "a partir de agora, com os últimos desdobramentos e
a pressão das manifestações, o processo de impeachment tende a ser muito
acelerado".
Ele nota que não só a base parlamentar do governo está
cada vez menor, como "os empresários estão muito descontentes e também
grande parte da sociedade, mesmo que polarizada e dividida".
"A base de apoio da presidente hoje se restringiu
à CUT, MST e ala moderada do PT, e a opinião pública está cada vez mais
crítica", acrescenta.
Na sua visão, a tendência é que o PMDB deixe o governo
– no sábado, a Convenção Nacional do partido definiu prazo de 30 dias para ser
tomada uma decisão sobre isso.
"Vemos que a movimentação das elites atualmente,
as grandes lideranças políticas e econômicas, já é de discutir um cenário
pós-Dilma. Não se sabe como o governo deve acabar. A renúncia é pouco provável,
o impeachment é um processo doloroso, e o semiparlamentarismo tende a ser
rejeitado pela população, mas o fato é que as elites já dão o fim do governo
Dilma como certo", observou.
Monteiro não acredita que as manifestações pró-governo
convocadas para dia 18 trarão numa reação forte aos protestos de domingo.
"Quem vai sair às ruas para defender um governo
acusado diariamente de corrupção e em meio à uma severa crise econômica? Por
mais que alguns possam se surpreender caso o impeachment se concretize, poucas
pessoas são capazes de esboçar qualquer reação de defesa do governo neste
momento", afirma.
Wagner Iglecias –
sociólogo e professor da USP.
Para o sociólogo sociólogo Wagner Iglecias, professor
da USP, os protestos de domingo colocam uma "uma pressão enorme"
sobre a Dilma.
"A presidente precisará se posicionar sobre as
ruas porque é impossível ignorar o que está acontecendo", notou.
Ele nota, porém, uma grande diferença entre os
protestos de agora e os que pediram a saída do ex-presidente Fernando Collor em
1992.
"A diferença fundamental é que naquele momento,
nos anos 90, o presidente Fernando Collor estava totalmente isolado, porque ali
sim as manifestações eram realmente suprapartidárias. Um rol muito grande de
forças políticas foram às ruas pedir a saída dele".
Iglesias observa que, apesar do governo mal avaliado,
Dilma ainda tem uma base de apoio relevante.
"O que vemos é mais ou menos metade do sistema
partidário brasileiro se aproximando dos movimentos para pedir a saída dela,
mas tem uma outra parte do sistema que não está empunhando as mesmas bandeiras.
Eu tenho impressão que lá atrás nos anos 90 você tinha uma série de movimentos
sociais de direita e esquerda, vários partidos, PT, PSDB, pedindo a saída dele.
Hoje é diferente, embora o número de pessoas nas ruas talvez seja ainda
maior".
Fonte: BBC Brasil.
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