À Polícia
Federal, Luís Cláudio reconhece falta de experiência e empresário admite que
cifras pagas eram “absurdas”
Luís Cláudio da Silva é o filho caçula do
ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele tem 30 anos e é formado em
educação física. Depois de trabalhar para times de futebol em São Paulo, Luís
Cláudio resolveu se aventurar no mundo do marketing esportivo. Para isso, abriu
uma empresa, a LFT, que não tem nenhum funcionário além dele. Logo, começou a
prosperar.
O primeiro contrato foi com o Corinthians, o time do coração do pai que,
na época, trabalhou abertamente para que a construtora Odebrecht viabilizasse
um estádio para o clube, o Itaquerão. Luís Cláudio assinou um contrato de R$
300 mil por ano com o time paulista, que previa a criação de campanhas de
marketing para desenvolver o esporte amador e atividades lúdicas para crianças.
Depois de estrear no mundo empresarial no Corinthians,
Luís Cláudio ganhou, entre 2014 e 2015, R$ 2.552.400 do escritório de
consultoria de Mauro Marcondes, Marcondes & Mautoni, cuja especialidade era
representar montadoras de carro. Luís Cláudio prestaria à consultoria de
Marcondes consultoria técnica e assessoramento empresarial de marketing
esportivo. E foi aí que começaram os problemas em sua vida. Luís Cláudio agora
é um dos investigados pela Operação Zelotes, da Polícia Federal. Seu nome
surgiu após a PF começar a investigar Marcondes.
Em 1o de outubro, ao noticiar
a investigação, o jornal O Estado de S. Paulo publicou que Marcondes era
suspeito de “comprar” medidas provisórias editadas entre 2009 e 2013 para
favorecer montadoras, por meio de incentivos fiscais. Em 26 de outubro
Marcondes foi preso. No dia 4 de novembro, Luís Cláudio foi convocado à
superintendência da Polícia Federal, em Brasília. ÉPOCA obteve o depoimento com
exclusividade.
Obteve também o depoimento dado por Marcondes quando já estava
preso no Complexo da Papuda, em Brasília. Os dois depoimentos sugerem que ainda
há muito a ser esclarecido sobre o contrato de Luís Cláudio com a empresa de
consultoria de Mauro Marcondes. “É como se um não soubesse por que pagou e
outro não soubesse por que recebeu”, disse uma pessoa próxima à investigação. Luís
Cláudio disse aos investigadores que a empresa teve somente dois clientes até
hoje: justamente o Corinthians e a consultoria de Marcondes, a Marcondes &
Mautoni.
No depoimento, ele tem dificuldades para explicar o que é consultoria
técnica e assessoramento empresarial de marketing esportivo e para dizer quais
suas qualificações para prestar esse serviço – que, aliás, afirma que realizou
sozinho. Consta na declaração: “Que os projetos contratados pela Marcondes e
Mautoni foram executados diretamente pelo declarante, que a formação do
declarante é a graduação em educação física, não possuindo nenhuma
especialização acadêmica em marketing esportivo”.
Em outro momento do depoimento, a PF
pergunta sobre um dos projetos, calculado em R$ 1 milhão. O filho de Lula
admite que nunca tinha feito aquele serviço antes. “Que nunca tinha realizado
estudo ou projeto contendo o mesmo objeto dessa minuta deste contrato”, diz o
depoimento. Para fazer algo que nunca tinha feito antes, Luís Cláudio recebeu
R$ 1 milhão.
No total, Luís Cláudio e Marcondes acertaram seis
serviços, entre junho e julho do ano passado, embora Luís Cláudio tenha
afirmado que não executou todos. Os contratos, obtidos por ÉPOCA, têm de tudo
um pouco: trabalhos relativos à Copa do Mundo, violência nos estádios e até um
genérico “elaboração de análise de marketing esportivo como fator de motivação
e integração nas empresas com exposição de casos e oportunidades”.
No depoimento, a PF tentava esclarecer uma pergunta
simples: como se chegou ao valor milionário da consultoria? A memória de Luís
Cláudio, contudo, falhava. “Não se recorda, neste momento, o valor desse
projeto”, diz o depoimento. De acordo com Luís Cláudio, o valor milionário foi
calculado a partir das horas trabalhadas. E quanto Luís Cláudio teve de
trabalhar nos projetos contratados? Diz o documento: “Que utiliza como
parâmetro a quantidade de horas trabalhadas para a fixação dos valores cobrados
aos seus clientes nos projetos que executa não saber mensurar, neste momento, o
valor cobrado pela sua hora de trabalhar”. Mas quanta hora Luís Cláudio teve de
trabalhar? De novo, ele não soube responder. Luís Cláudio tampouco sabe
responder sobre o negócio.
Qual a margem de lucro? E quanto custou para executar
o projeto? “Que, neste momento, não tem noção de quanto foi o custo de execução
desse projeto; que também não sabe, neste momento, declinar a margem de lucro
obtida nesse contrato”, diz o documento.
A Polícia Federal fez uma mesma pergunta para Luís Cláudio,
contratado, e Marcondes, contratante. Por que o escritório de advocacia
escolheu a empresa LFT? “Que Mauro Marcondes nunca explicou ao declarante por
que optou por contratá-lo; que não sabe dizer se o Mauro Marcondes realizou
alguma pesquisa de mercado antes de contratar o declarante”, diz o depoimento.
Marcondes, por sua vez, preferiu o silêncio.
No depoimento, a PF pediu que Luís Cláudio apresentasse os documentos
que comprovassem os serviços prestados. Dias antes, a busca e apreensão no
escritório da LFT tinha sido infrutífera. Os vizinhos relataram aos policiais
que o escritório parecia que estava de mudança, em razão da intensa retirada de
documentos. Em seu depoimento, Luís Cláudio não apresentou relatórios que
comprovassem os serviços prestados.
À Polícia Federal, ele disse que, sim,
produziu relatórios e que ficou com cópias, mas que havia entregue a advogados
após a reportagem de O Estado de S. Paulo, para uma “confirmação jurídica” – seja lá o que isso significa. O escolhido
para guardar os documentos foi Roberto Teixeira, advogado do pai, Luiz Inácio
Lula da Silva. Por que Luís Cláudio não levou à PF? “Além de não conhecer a
legislação, não sabia da investigação em curso envolvendo o nome do declarante
e também (disse que) é habitual os ataques à sua família por parte da
imprensa.” Os documentos só foram entregues à PF após um mês da reportagem e da
análise do escritório de Roberto Teixeira.
De acordo com Marcondes, “a contratação da LFT
Marketing Esportivo refere-se à realização de estudo para um projeto de
implantação de um centro de exposição numa cidade do interior de São Paulo”.
Nada a ver com marketing esportivo. Marcondes, contudo, recusou-se a dar
detalhes sobre o tal centro de convenções. O consultor, aliás, sempre optava
pelo silêncio quando a PF o questionava sobre os serviços contratados com Luís
Cláudio. Não explica, por exemplo, como escolheu a empresa do filho de Lula.
Marcondes, contudo, admite que sabia que o valor pago era “absurdo”. De acordo
com o depoimento, ele disse que fez uma “pesquisa superficial” para saber dos
preços. Quem fez a pesquisa foi um estagiário da empresa de Mauro. “Ele
constatou que eram absurdos”, disse Marcondes no depoimento. Isso, contudo, não
o impediu de pagar cerca de R$ 2,5 milhões a Luís Cláudio, que trabalhava
sozinho e nunca tinha prestado aquele tipo de serviço antes. Essa equação
financeira está sendo investigada pela PF.
DETIDO.
< O advogado Mauro Marcondes Machado, dono da Marcondes
& Mautoni. Sua empresa repassou R$ 2,5 milhões ao filho de Lula.
Marcondes também falou à PF sobre suas andanças no
Palácio do Planalto, onde diz ter estado por “diversas vezes” durante o governo
Lula, em razão de ser vice-presidente da ANFAVEA, a associação das montadoras.
Ele citou nominalmente encontros com Gilberto Carvalho, para entregar estudos
de interesse das montadoras. Gilberto também é alvo da Operação Zelotes.
Marcondes afirma que “nas reuniões com Gilberto Carvalho não foram tratados
assuntos referentes a edição de medidas provisórias para a prorrogação de
benefícios fiscais”.
Ele citou ainda que “a entrega dos documentos (a Gilberto
Carvalho) ocorreu antes da edição da Medida Provisória 412/2009” – que prorroga
incentivos fiscais para a compra de máquinas e equipamentos de uso na movimentação
de cargas nos portos brasileiros.
Procurado por ÉPOCA, o advogado de Luís Cláudio,
Cristiano Zanin Martins, disse: “Luís Cláudio Lula da Silva, profissional da
área privada, já prestou às autoridades todos os esclarecimentos que lhe foram
solicitados”.
A assessoria do Corinthians disse que não poderia confirmar hoje
qualquer função que Luís Cláudio tenha exercido no clube por meio da LFT, por
não dispor dessas informações de bate - pronto. Contatado por ÉPOCA, o advogado
de Mauro Marcondes não respondeu até o fechamento da reportagem.
Fonte: G1 – DF.
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