BRASÍLIA - A presidente Dilma
Rousseff, reeleita neste domingo em uma acirrada disputa, deve assumir o novo
mandato com o desafio de se reinventar, governar um país dividido e articular
com uma base no Congresso que cobrará "mais caro" pelo seu apoio,
além de ter no horizonte um cenário econômico adverso.
Na frente política, terá de lidar
com uma oposição que sai fortalecida das urnas e remendar um desgaste com o
maior partido da base, o PMDB, conflito já herdado do atual mandato. No cenário
econômico, Dilma enfrenta baixo crescimento e ameaça de inflação.
"A presidente vai ter que se
reinventar. O governo vai precisar de muita liderança política de qualidade. Se
não tiver, vão ser anos turbulentos", afirmou o cientista político e
professor do Insper, Carlos Melo.
O tom do discurso de Dilma, feito
após a confirmação da vitória apertada nas urnas, indicou que ela assumirá o
novo mandato sabendo das "grandes dificuldades que enfrentará",
avaliou o cientista político do Instituto de Pesquisas e Projetos Sociais
(Inpro) Benedito Tadeu César.
"Acho que não é por acaso
que ela começou o pronunciamento fazendo um apelo pela conciliação", disse
à Reuters.
Dilma afirmou que seu primeiro
compromisso será o do diálogo em busca da união, justamente após as urnas
mostrarem a disputa presidencial mais acirrada desde a redemocratização.
A presidente teve 51,6 por cento
dos votos válidos na votação deste domingo, contra 48,4 por cento do candidato
do PSDB, Aécio Neves. Foi o placar mais apertado desde o fim da ditadura
militar.
"Em lugar de ampliar
divergências, de criar um fosso, tenho forte esperança de que a energia
mobilizadora tenha preparado um bom terreno para construção de pontes",
declarou a presidente. "Minhas primeiras palavras são, portanto, de chamamento
de base e união."
A sinalização tem de fato
fundamento, uma vez que além da polarização explicitada nas urnas, a presidente
terá de negociar com quase 30 siglas no Congresso Nacional.
Uma delas, o PMDB, já rendeu
recorrentes crises na articulação política no primeiro mandato e apresentou
sinais de descontentamento no processo eleitoral.
"Ela vai ter grandes
dificuldades porque o Congresso Nacional que foi eleito é muito conservador,
eles vão cobrar muito mais caro o apoio. Ela vai ter que negociar cada
milímetro", avaliou César, do Inpro.
E isso num contexto em que o PSDB
saiu fortalecido das urnas e terá como líder em exercício no Senado seu
presidenciável derrotado neste domingo, o mineiro Aécio.
Há ainda pela frente o trabalho
de debelar as denúncias de corrupção envolvendo a Petrobras, que povoaram a
campanha eleitoral e cujos desdobramentos podem alimentar ameaças à
estabilidade política.
UNIÃO E APOIO POPULAR
Sob o discurso da união, Dilma
terá de ampliar seu apoio popular, principalmente entre a nova classe média,
para tocar mudanças que já vinha propondo, caso da reforma política, sugerida
pela presidente logo após o ápice das manifestações populares de junho, no ano
passado.
A presidente voltou a defender a
reforma neste domingo, mas encontrará obstáculos pela frente para concretizar a
proposta.
"Não vai ser fácil, não...
Ela vive falando em plebiscito (para a reforma política). Mas quem convoca
plebiscito é o Congresso. E com um Congresso fragmentado, vai ser muito
difícil", afirmou o cientista político David Fleischer, da Universidade de
Brasília (UnB).
Fleischer prevê um ano
"muito difícil" para Dilma em 2015, principalmente pela pecha de
"inimiga do setor privado".
A boa notícia para a presidente é
que pelo menos a forte polarização evidenciada nestas eleições tende a suavizar
passado o confronto eleitoral.
"Sem um estímulo dos
debates, da propaganda eleitoral, a tendência é que a polarização da população
diminua", explicou o diretor do Centro de Pesquisas de Análise de
Comunicação, Rubens Figueiredo.
Mas ele também lembrou que a
presidente e o PT vão ter que praticar esse entendimento. “O discurso é
excepcional e é isso que o Brasil precisa, mas na prática não é isso que temos
visto."
Fonte: Reuters.
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