OPINIÃO
“O IMPERATIVO DE GUALLE”
‘negociações & negociatas’
Nobres:
Bastou o desafio mínimo, para
aprovar o texto preparado pelo governo uma maioria simples na Câmara.
Resultado: a votação estendeu-se por três dias, duraram exatas 41 horas, a mais
longa do Parlamento brasileiro e deixou ao Senado apenas 12 horas para ser
apreciado, na mais flagrante desmoralização da nossa suprema instância
legislativo. Indignado, o senador Jarbas Vasconcelos declarou que nem durante a
ditadura militar os senadores eram constrangidos de forma tão acintosa. O
próprio presidente do Senado, Renan Calheiros, prometeu que essa seria a última
vez que a Casa seria submetida ao vexame de engolir sem examinar matéria
oriunda da Câmara. O mais curioso é que o encarniçamento não partiu da
oposição, que apenas tentou explorar politicamente a evidente fragmentação da
base de apoio ao governo. Não discutiu os méritos, a medida provisória dos
portos era reclamada por todos os interessados em modernizar nossa
infraestrutura e acabar com os gargalos logísticos que comprometem nossas exportações.
O que se discutiu com veemência foi o desembaraço e o descaramento exibidos
pelos lobbies dos grupos econômicos e a obsessão do velho sindicalismo em
manter os privilégios de antigas corporações profissionais. Mesmo assim, o
governo foi obrigado a desembolsar cerca de R$ 1 bilhão para comprar a boa
vontade de parlamentares renitentes aprovando suas emendas ao orçamento. A luta
foi intestina, travou-se nas entranhas do principal aliado do governo, o PMDB,
e teve como protagonista o próprio líder do partido na Câmara Federal, Eduardo
Cunha, que preferiu manter-se fiel aos seus interesses pessoais, esquecendo-se
dos compromissos que o levaram à função. O nível da retórica acompanhou os
absurdos da situação: Cunha, que já foi radialista, atracou-se verbalmente com
outro ex-radialista, Anthony Garotinho, líder do PR. Esquecidos do decoro
enxovalharam-se mutuamente e forneceram aos futuros historiadores o registro
preciso de um dos momentos mais infelizes da história republicana. A incrível bazófia
foi fruto de um estresse injustificado: a chapa PT-PMDB para 2014 consolida-se
diante de cada sufoco. Os potenciais adversários da dupla Dilma Rousseff-Michel
Temer ainda patinam nos respectivos egos e alguns indicadores econômicos,
embora tímidos, sugerem uma conjuntura mais favorável no período 2013-2014. Não
obstante, mantém-se o clima de crise. Com tantos ministros e ministérios
envolvidos na questão dos portos – pelo menos cinco sob o ponto de vista
temático – a exaustiva operação foi tocada pelas ministras-chefes da Casa Civil
e Relações Institucionais amparadas pelo maior especialista em sobrevivência na
selva política, o vice-presidente da República. A fórmula de muitos caciques e
poucos índios reproduz-se de forma incontrolável e cria um modelo de estrutura
centralizada, burocrática, geralmente inútil, incapaz de antecipar-se às
ameaças e, sobretudo, dar um sentido aos avanços. Essa abertura em 2013 foi sofrida, penosa.
Todos têm razões para esquecer o pesadelo. Tornou-se permanente as ações em todos
os segmentos pelos políticos para instar o que disse Charles de Gaulle em
relação à política dos brasileiros.
Antônio Scarcela Jorge.
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