COMENTÁRIO
A CPI DOS EMUDECIDOS
Nobres: - o relatório final que deu margem o final da
CPI do Carlos Cachoeira denota o princípio coerente que o corporativismo e a
convergência de interesses alheios à boa política entre parlamentares da
situação e da oposição, contribuíram para desgastar ainda mais não só esse tipo
de apuração como o próprio Congresso. Os deputados e senadores integrantes da
CPI do Carlos Cachoeira perderam tempo, desperdiçaram dinheiro público e
iludiram o país durante oito meses numa investigação parlamentar que se
restringiu à mesquinhez de confrontos partidários e tentativas frustradas de
incriminar adversários políticos. O resultado não tinha como ser mais
deplorável: um relatório alternativo de uma página e meia, que simplesmente devolve
a tarefa de investigar ao Ministério Público e à Polícia Federal. São
justamente os órgãos que denunciaram o esquema de corrupção comandado pelo
empresário da área de jogos Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira, cujos
tentáculos se estendiam a agentes privados e públicos, incluindo políticos de
partidos de dentro e de fora do governo, entre os quais dois governadores. Por
isso, a CPI restringiu-se o tempo todo a um embate entre representantes da base
aliada e da oposição, cada lado acusando os oponentes e tentando blindar seus
correligionários. Em consequência, o processo só contribuiu para desgastar
ainda mais esse mecanismo, lançando uma sombra de desconfiança sobre o
parlamento. Lamentavelmente, quem mais sai prejudicado, mais uma vez, é a
sociedade de maneira geral, pois a conclusão dos trabalhos só interessa a uma
parcela ínfima, constituída por representantes da iniciativa privada e do setor
público interessados na obtenção de ganhos financeiros com a política. Baseada
nas informações obtidas pela Polícia Federal nas Operações Vegas e Monte Carlo que
resultaram na cassação do senador Demóstenes Torres por suas ligações íntimas
com o empresário da área de jogos, a CPI que se encerra sem um indiciamento
sequer surgiu com a pretensão de desviar a atenção do julgamento do mensalão. Bastou
a constatação de que as ramificações do esquema eram demasiado amplas,
atingindo em cheio também aliados da base de apoio político ao governo federal
para esfriar as pretensões iniciais. Parlamentares governistas e de oposição se
uniram e o relatório inicial, de 5 mil páginas, envolvendo de políticos a
jornalistas, minguou para menos de duas folhas. As fotos mostrando integrantes
da CPI com pilhas de papel à sua frente na melancólica sessão de encerramento
dos trabalhos confirmam o grau de encenação de muitos integrantes do Congresso
e dão uma dimensão dos prejuízos bancados pelos contribuintes. Infelizmente, o
corporativismo e a convergência de interesses alheios à boa política entre
parlamentares da situação e da oposição, escancarados na CPI do Cachoeira,
contribuíram para desgastar ainda mais não só esse tipo de apuração como o
próprio Congresso. Não é admissível que deputados e senadores possam perder
tanto tempo frente a suspeitos que se limitam a exercer o direito de ficar
calados diante de questões para as quais a sociedade exige respostas ou a fazer
jogos de cena que só contribuem para transformar ainda mais o instrumento
democrático da CPI em palco de teatro sob a luz de holofotes. Depois é “querer”
que o poder legislativo tenha sua independência de valores éticos, quando em
volta se contradiz pelos seus atos.
Antônio Scarcela Jorge
Nenhum comentário:
Postar um comentário