Política com o ‘nosso chapéu’
Meus
nobres: - “temos de concordar” que a presidente Dilma Rousseff cultiva uma
imagem de líder mais apegada a questões técnicas que às comezinhas da política
partidária. Boa parte dessa fama veio de seu trabalho em cargos públicos
ligados à área de energia, no Rio Grande do Sul e no governo federal – ela foi
a principal responsável, no começo do governo Lula, pelo redesenho do modelo do
setor elétrico. Talvez o profundo conhecimento da área explique a prepotência
com que a presidente tentou convencer as companhias elétricas a aderir a seu
plano de renovação de concessões. Mas, por mais técnica que Dilma queira
parecer, a forma como ela e sua equipe “venderam” a redução da tarifa de
energia trouxe à luz intenções nitidamente eleitorais. O anúncio do pacote, em
cadeia nacional de rádio e tevê, na véspera do dia da Independência e a um mês
das eleições municipais, parece agora coisa pequena perto da virulência com que
Dilma e seus ministros têm tratado quem não aceitou renovar antecipadamente as
concessões. A assinatura de novos contratos, antes apresentada como “opção”
aberta aos interessados, ganhou ares de decreto-lei. Jogando para a plateia, o
governo tem repetido que quem não aderiu “priorizou os acionistas”, “penalizou
a população”, foi “imensamente insensível”. Provocados, os governos tucanos de
São Paulo, Paraná e Minas Gerais – controladores das principais companhias que
não renovaram contratos de geração – revidaram, ora com argumentos técnicos
consistentes, ora com contra-ataques dignos de mau debate eleitoral, tão
esdrúxulo quanto algumas alegações do Ministério de Minas e Energia. Houve
secretário de Fazenda criticando a queda das tarifas não pela forma autoritária
como ela foi colocada, mas simplesmente porque reduzirá a arrecadação de ICMS.
Ora, levar a sério tal raciocínio significa aceitar que morra na casca qualquer
tentativa que venha a reduzir custos (e, portanto, preços e arrecadação
tributária) no país. Um secretário paulista foi mais longe: quis acusar o governo
federal de quebra de contrato por não renovar automaticamente uma concessão
vencida desde 2011, quando a lei é clara ao afirmar que o poder concedente pode
(e não deve), a seu critério, renovar concessões. A discussão “evoluiu” ao
ponto de a FIESP, beneficiária de várias medidas protecionistas do governo,
pagar anúncios de página inteira desqualificando quaisquer questionamentos à MP
579. O presidente da federação, Paulo Skaf, que tem lá suas ambições políticas,
não teve pudor em estrelar comercial de tevê “faturando” a medida do governo. Em
resumo, Dilma Rousseff parece ter conseguido o que queria: politizou a
importante questão da redução da tarifa, contaminando-a com a sucessão de 2014.
Qualquer iniciativa de baixar a tarifa brasileira, uma das mais altas do mundo,
seria digna de elogio. A tarefa, no entanto, exige sobriedade, correção e
justiça. E isso faltou. O governo acertou ao cortar parte dos encargos que ao
longo dos anos ele mesmo pendurou na conta de luz. Mas deveria ter ido além. E
eliminado, por exemplo, o PIS/COFINS – imposto que, segundo estudo da
PricewaterhouseCoopers e do Instituto Acende Brasil, responde por 8,5% da
tarifa. Também é correto renovar concessões antigas em troca de tarifas mais
baixas, pois grande parte das usinas e linhas de transmissão realmente já “se
pagou”. O problema é que em muitos casos a tarifa proposta não cobriria
qualquer futura contingência, e certas indenizações também foram subestimadas –
tanto que, no caso da transmissão, o próprio Planalto voltou atrás e elevou
valores. Por último, não custa lembrar que é dever de qualquer empresa, ainda
mais sendo estatal, zelar por sua saúde financeira, sua viabilidade econômica,
enfim, sua perenidade. Fez certa a Copel ao aceitar somente as condições que
não violassem tais princípios. Quanto à estatal federal Eletrobrás, obrigada a
aderir na íntegra ao pacote, têm crescido os rumores de que cedo ou tarde
precisará de aportes do Tesouro para sobreviver. - Cá pra nós - a Coelce também
se enquadra neste ramo “beneficiário” e de nada adiantará termos uma tarifa
mais baixa em troca de um sistema menos confiável, de elétricas às portas da
falência e de operações de socorro à custa do contribuinte.
Antônio Scarcela Jorge.
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