COMENTÁRIO
RETROCESSO
INSTITUCIONAL
NOBRES: -
O
Ministério Público “sente” perplexo diante da situação de expectativa que em
conjunto da sociedade sobrevém em função da alvitrada que tramitado no
Congresso Nacional a Proposta de Emenda Constitucional 37, que visa mudar a
Constituição Federal para estabelecer que apenas as polícias possam investigar
crimes no Brasil, eliminando a atividade investigativa suplementar do
Ministério Público. É de se perguntar a razão, já que, como lembrou o
procurador-geral da República, apenas três países no mundo proíbem o MP de
investigar: Uganda, Quênia e Indonésia. Seriam estes os exemplos a ser
seguidos? Os defensores da PEC 37 entendem que sim, e para tanto usam de
falácias discursivas com pretensa roupagem jurídica que não resistem a um
debate minimamente sério, como vem reconhecendo o STF. É preciso, então, desvelar o que está em jogo:
o modelo de enfrentamento da corrupção que se quer para o Brasil explica-se:
assim como na maioria dos países, o MP é quem detém o poder de acionar na
Justiça os autores de delitos. No entanto, para iniciar o processo criminal ele
precisa demonstrar ao juiz que possui provas contra os acusados, o que
justifica a necessidade de uma investigação preliminar. Em boa parte dos crimes
“tradicionais”, bem ou mal, a polícia investiga sem empecilhos e entrega os
dados necessários ao MP, permitindo sua atuação em juízo. Já quando se trata da
criminalidade “elitizada”, do colarinho branco, as polícias não operam com a
mesma frequência e eficácia, produzindo lacunas investigativas que podem ser
debitadas, para além do elevado índice de corrupção intrínseca, ao fato de que
elas são subordinadas ao Poder Executivo. Assim, se as polícias “pertencem” de
fato e de direito aos “donos do poder” tendem a não os investigar.
Diferentemente das polícias, desde a Constituição Federal de 1988, o MP é a
única instituição com independência e autonomia capaz de investigar
criminalmente quem detém o poder, pois age sem temer interferência externa,
modelo que vem se revelando eficiente em quebrar o manto de impunidade nesse
setor. Acontece que, ao investigar este nicho de criminalidade elitizada, o MP
acaba sendo alvo de retaliações variadas, a exemplo das inúmeras tentativas
legislativas anteriores de limitar sua atuação, basta lembrar-se dos famosos
projetos da “mordaça” e da “Lei Maluf” e também desta que agora se pretende com
a PEC 37. Assim, quando se quer inserir na Constituição uma regra dizendo que
apenas as polícias podem investigar crimes, o que se pretende, em última
análise, é desestruturar o sucesso do modelo brasileiro de investigação
independente e suplementar do Ministério Público, voltando a imunizar a classe
detentora do poder político e econômico no plano criminal, fazendo com que o MP
atue somente nos casos que a polícia lhe trouxer à mesa. A PEC 37 é, portanto,
mais uma destas iniciativas legislativas de ocasião que visa acabar com a
atuação independente do MP e blindar o estamento que detém o poder.
Conclama-se, portanto, a população a cobrar posturas do seu deputado federal na
votação da PEC 37 e lembrar-se delas na próxima eleição, sem esquecer-se de uma
certeza: se a PEC 37 for aprovada, estaremos autorizando, veladamente, o
incremento da prática da corrupção no país. O povo brasileiro não merece mais
entre anacronismo.
Antonio
Scarcela Jorge
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