Os relatos
sertanejos dão conta de que o Interior do Estado vive uma seca verde.
Dava abril e o açude Garrota já
estava cheio. Dali para frente, o pescador Erisvan Fausto Silva, 45, não se
preocupava, porque o sustento do restante do ano estava garantido. Seu Erisvan
não se lembra, na vida toda, da terra tão castigada e, hoje, vê secar a lâmina
d’água em frente de casa, na zona rural de Quixelô, a 374 km de Fortaleza. O
que antes “dava pra cobrir homem e meio”, hoje não passa de 30 cm. Para pescar,
ele tem de ir até Orós e o dinheiro que gasta com gasolina não compensa. “O que
ainda tem de água aí é do ano passado. Este ano o açude não pegou chuva. Se
agora não entrar nem que seja um pouquinho, sei nem o que vai ser no verão”,
lamenta o pescador.
Erisvan é um dos afetados pela
estiagem em Juazeiro do Norte, a 491 km da Capital. Nos três primeiros meses de
quadra chuvosa, a Fundação Cearense de Meteorologia e Recursos Hídricos
(Funceme) registrou média de 307 mm de chuvas em todo o Estado. O número é
28,9% menor que o normal, 432 mm, e confirma a previsão feita em dezembro - de
50% de chances de chover menos que a média histórica. Para os próximos meses, a
previsão é de 45% de chances de ser abaixo da média.
De acordo com o relatório
divulgado pela Companhia de Gerenciamento de Recursos Hídricos (Cogerh), dos
149 açudes monitorados, 20 estão com volume de água abaixo de 1% da capacidade.
Para David Ferran, meteorologista da Funceme, as precipitações até agora serviram
para molhar a terra e encher os pequenos açudes. “Seria preciso um período de
chuvas mais intensas e seguidas para que os açudes maiores também aumentassem
seu volume”, explica.
“ Seca verde”.
“ Seca verde”.
O que caiu de chuva até então fez
crescer um pasto vistoso. Contudo, a paisagem muito verde do caminho esconde
uma realidade diferente. Restando cerca de um mês e meio para acabar o período
chuvoso, o milho e o feijão de quem acreditaram nas primeiras chuvas ainda
periga se perder, e o arroz, que só cresce bebendo muita água, há tempos, não é
plantado. Morador da Vila Santo Antônio, em Juazeiro do Norte, o agricultor
Luís Carlos, 56, é acostumado com mais água e os 327 mm de chuva que a terra do
Cariri recebeu no trimestre, o preocupou. “Se tiver mais chuva, o milho vinga,
mas se não cair agora em abril, não sustenta.
Seca no sabugo antes de se
formar”, comenta. O milharal que já atinge a sua altura é privilégio. No sítio
João Ribeiro, em Várzea Alegre, o agricultor César Pedro, 32, decidiu não
plantar nada. “Já perdi muita plantação. Este ano, esperei chuva seguida e não
veio. Vinha um dia e quinze não. Se plantasse era pra perder”, explica César. A
descrença o fez se desfazer também das 35 cabeças de gado.
“O que choveu só deu pra deixar o
pasto verde, e isso não dura muito. Em 2013, vendia uma cabeça tentando salvar
outra. Morreram todas. É muito ruim ver o bicho definhando, sem água. Vendi
enquanto ainda tava gordo. Se ficasse, não durava mais 20 dias”, lembra César,
enquanto olha com desalento o que resta de água barrenta no pequeno açude da
sua propriedade.
Ele e o amigo Antônio Lima, 37,
sem ter a roça própria para cuidar, têm tirado o sustento em outras atividades.
“O César pega uns serviços nas roças dos outros e eu aprendi também o ofício de
pedreiro. O problema é que nem isso aparece mais, porque se não vende o feijão,
o milho, o arroz, de onde o povo tira dinheiro pra ajeitar a casa?”, questiona
o agricultor que só não leva à frente a ideia de procurar emprego na Capital
com medo de deixar a família para trás. “Se é de sofrer, é melhor que seja
junto”, sentencia.
Fonte:
Agência O Povo.
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