COMENTÁRIO
Leno Strek.
SENSO INCOMUM
Para além do jeitinho
brasileiro de ser “Doutor”.
Há vários modos de explicar o
Brasil. Sem tirar o mérito de Caio Prado Junior e de tantos outros grandes cientistas
sociais, no específico. nisso que quero hoje abordar —, fico com Raymundo
Faoro. Com efeito, quando Raymundo Faoro escreveu Os Donos do Poder, em
contraposição à hegemonia marxista no ambiente acadêmico, novas categorias
foram utilizadas para a compreensão do velho modelo de dominação política que
havia se estabelecido no Brasil. Em vez da luta de classes entre burgueses e
proletários, Faoro analisou as relações de poder a partir de dois conceitos
weberianos: o estamento e o patrimonialismo. Para ele, o Brasil era
patrimonialista no conteúdo e estamental na forma. Ou seja, acima das classes
sociais encontra-se o estamento burocrático, que se apropria da coisa pública
com o fito de sustentar interesses meramente privados. Fundamentalmente, é a
partir da máquina pública que os estamentos espicham suas garras. Políticos,
funcionários públicos de carreira, banqueiros, bicheiros, empresários,
sindicalistas, latifundiários, usineiros, esquerdistas e direitistas,
proprietários de revistas e jornais para todos os gostos ideológicos... Enfim,
todos eles se esbaldam com aquilo que vem do setor público. Nesse contexto, o
nosso capitalismo parece ser de fancaria.
Pois bem. Não gosto de
estereótipos, que são “raciocínios feitos no varejo para serem usados no
atacado”. Um dos livros que me impressionou sobremodo e foi importante na minha
formação foi O Caráter Nacional Brasileiro — a história de uma
ideologia, de Dante Moreira Leite. Belíssimo livro. Ele desmi(s)tifica esse
negócio de “brasileiro é isso...; brasileiro é aquilo...”. Ele desmancha a
noção de “jeitinho brasileiro”. Diz ele: só dá jeitinho quem precisa; só dá
jeitinho quem “pode”; só se dá um jeitinho quando há brechas na lei etc. Por
que é tão difícil “dar jeitinho” na Alemanha? Seria porque os alemães não
gostam de “dar jeitinho”? Na verdade, eles não dão jeitinho pela simples razão
de que, lá, “não dá para dar jeitinho” (ou é nem mais difícil!).
Perguntem ao pai de Steffi Graf,
que tentou escamotear o imposto de renda. Claro, acrescente-se nesse contexto
uma boa pitada de cultura, ideologia etc., e temos a formação de um imaginário.
No Brasil, embora falsa a noção de jeitinho, ela acaba concretizada, como uma
espécie de “imaginário concreto” (lembro, aqui, de Poulantzas). Ou seja, para
ser mais simples: o jeitinho acaba acontecendo, porque, se todos dizem que há,
ele acaba acontecendo... E qual foi o fermento para o crescimento do
“jeitinho”? O patrimonialismo. O “estamentismo”.
Pois o tema que vou tratar está
bem dentro desse contexto. Nesse imaginário patrimonialista, de “cidadania
relacional”, de “dá-se-um-jeito”, exsurge a todo momento um novo modo de se
“ajeitar-as-coisas-para-se-dar-bem”
Assim, por que se esfalfelar
fazendo um mestrado que dura de dois a três anos e depois um doutorado que dura
mais uns quatro a cinco anos se é mais fácil simplesmente ir para a Argentina
ou Paraguai (ou em outros cursos que tais) e fazer um doutorado Direto e... nas
férias? Pronto. Passeio e estudo: útil e agradável. E volta “doutor” (ou, pelo
menos, dizendo “sou doutorando”! Além disso, ainda encherá a boca para dizer:
“o meu doutorado é no exterior...” (puxando os “eee” da palavra “meu”). “O meu
doutorado não é dessas coisas feitas no Brasil...”! E, melhor ainda, receberá
promoção na carreira. Se for juiz, promotor, procurador federal, defensor
público, então, isso soma um “monte de pontos”...
Pois, digo-lhes: vocês que
acreditam nas leis, na Capes, essas coisas; vocês que sabem que o artigo 48,
parágrafo 3º, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei 9.394, de
20.12.1996) exige revalidação de diplomas obtidos no estrangeiro com exigências
acadêmicas especificas e sérias, vocês que gastam uma fortuna nas Universidades
privadas cursando pós-graduação (mestrado e doutorado), o que dirão do que
relatarei a seguir?
Explico:
O jeitinho.
No país do jeitinho, um grupo de
juristas (pessoas formadas em Direito, alguns ocupando cargos importantes)
busca mobilizar políticos para, exatamente, arrumar um jeitinho de passar por
cima das exigências da legislação brasileira. As notícias são de que já há duas
assembleias legislativas mobilizadas. Agora parece que está marcada a
mobilização da assembleia de Minas Gerais. Os deputados estaduais são instados
a fazer leis para legitimar diplomas de doutorado obtidos especialmente no
Mercosul, mais detalhadamente, na Argentina, como se isso não fosse
absolutamente inconstitucional, por força da competência privativa da União
Federal para legislar sobre diretrizes e bases da educação nacional, conforme o
artigo 22, XXIV da Constituição. Até as pedras (que não estudaram) sabem disso.
Qualquer livro de “direito constitucional simplificado” (sic) diria isso
também.
Ora, é perfeitamente normal que
alguém vá buscar qualificação (pós-graduação) em outros países. A Capes investe
milhões de reais em programas desse naipe. A questão é o respeito que deve
haver à legislação nacional. Na volta, o diploma deve passar — necessariamente
— por um processo de revalidação previsto na Lei de Diretrizes e Bases (LDB).
Como bem acentuam Martonio Barreto Lima e Marcelo Varella, em texto ainda
inédito — na verdade, um dossiê potente que denuncia esses “jeitinhos” —, “a
maior dificuldade se dá em duas situações. De um lado, no caso de diplomas
obtidos em cursos muito frágeis, nos quais os alunos fazem visitas temporárias,
com aulas intensivas, teses sem orientação e sem qualquer convívio acadêmico,
numa realidade distante, portanto, do que é exigido no Brasil pela Capes e por
suas áreas de conhecimento. De outro, ainda que realizados por instituições
estrangeiras sérias e prestigiadas internacionalmente, a estrutura do curso de
doutorado é muito diferente do sistema brasileiro. A relevância do tema pode
ser demonstrada pela quantidade de brasileiros que realizam cursos no exterior,
pela judicialização em casos onde os pedidos de revalidação foram negados”
Nesse dossiê, que aqui reproduzo,
em parte, como um “furo de reportagem”, Martonio Barreto Lima — que é o
coordenador da área de Direito na Capes — e Marcelo Varella, que participa do
Comitê de Avaliação da área, esmiúçam o assunto. Em breves dias o dossiê estará
à disposição da comunidade acadêmica. Li-o e fiquei estarrecido!
Você sabia
que há mais brasileiros cursando doutorado em Direito na Argentina do que no
Brasil? O case “Museo Social”.
Na questão do Mercosul, o maior
problema parece estar na Argentina, motivo, aliás, de audiências públicas em
assembleias legislativas que estão sendo feitas por pressão de interessados em
revalidar diplomas fora daquilo que é previsto na LDB. Ah, esse Mercosul...!
Nesse sentido, segue o dossiê Barreto-Varella: “Há diferentes perfis de
instituições que oferecem doutorado a estudantes brasileiros. Apenas na
Argentina, há três vezes mais estudantes de doutorado brasileiros do que no
Brasil. O próprio conceito de doutorado parecer ser distinto entre os
estudantes brasileiros e os argentinos em alguns casos. Nesse contexto,
destacam-se instituições de qualidade questionada, como a Universidad del
Museo Social Argentino, mas também instituições de qualidade reconhecida,
como a Universidade de Buenos Aires e a Universidade de Católica da Argentina,
que abriram um mercado exclusivo para doutorandos brasileiros”.
Vejam. A Universidad Del Museo
Social, que possui milhares de brasileiros matriculados em doutorado,
sequer possui credenciamento no sistema de pós-graduação da República
Argentina, conforme informam os professores autores do dossiê. E são esses
brasileiros que querem que os diplomas que lá conseguirão não passem pelo
processo previsto pela LDB.
Para termos uma ideia da dimensão
do problema, somente em 2012, 800 alunos brasileiros lá se matricularam...
Sabem quantos docentes tem o doutorado do Museo Social? 10. Ora, 10
docentes é o mínimo que se exige no Brasil para abrir um curso de mestrado... E
sabem quantas vagas são permitidas no caso de 10 docentes? 10 a 15 por ano...!
Uau!
Vamos a outro dado estarrecedor:
“apenas a Universidade do Museu Social Argentino tem uma vez e meia mais
estudantes de doutorado do que toda a pós-graduação brasileira em Direito, e
tal número tende a aumentar com o sucesso dos convênios”. Repito: uma vez e
meia mais do que a totalidade dos estudantes de doutorado de terrae brasilis.
Com 10 docentes.
O que acham os meus leitores? O que diz a comunidade jurídica de terrae
brasilis?
Os políticos de terrae
brasilis acham que é possível passar por cima da legislação brasileira para
validar esses diplomas? Daremos um “jeitinho”? Poderíamos chamar a isso tudo de
“projeto patrimojeitinho”, em homenagem a Faoro.
Mais dados
do dossiê BarretoVarella.
Na Argentina, há outras
instituições com doutorados modulares, voltados basicamente para brasileiros,
como a Universidad Católica da Argentina (UCA) ou a própria Universidad
de Buenos Aires (UBA). A UCA tem o curso de doutorado em Direito também
credenciado pela Coneau, o órgão que corresponde, no Brasil, à Capes, por meio
da Resolução 1.908, de 2008. Tem dois doutorados. Um doutorado é realizado
durante três quadrimestres. O processo seletivo ocorre por uma prova sobre um
texto de metodologia científica. Não é necessário mestrado para ingressar. Em
seguida, o doutorando tem mais 3 anos para defender a tese de doutorado.
O outro curso da UCA é chamado de
“doutorado intensivo”, cujos créditos são realizados em períodos mais curtos e
destina-se principalmente a estudantes brasileiros. O curso de intensivo é
concluído em 20 dias, com 9 a 10 horas de aulas por dia. Após 4 períodos de 20
dias, no mesmo ano, cumpre-se os créditos e se pode realizar a tese de
doutorado. Os alunos devem preparar sua leitura antes do período letivo.
O doutorado da UCA tem 90
brasileiros inscritos, em 6 turmas diferentes. Em outras palavras, corresponde
ao mesmo número de doutorandos de um curso de grande porte no Brasil, mas que
começou há pouco mais de um ano, em 2010, e esse número tende a multiplicar-se
rapidamente.
Na Universidade de Buenos Aires,
há dois cursos com valoração para o doutorado: um regular; outro intensivo. Não
há como se questionar a histórica excelência da UBA e de sua mundial reputação,
especialmente na área de Direito. Reconhecida internacionalmente como uma
respeitável instituição, a UBA destaca-se no cenário científico da América
Latina.
Entretanto, o que o dossiê
Barreto-Varella analisa/questiona é a adequação, ou não, ao padrão legal
exigido no Brasil dos cursos intensivos de doutorado em Direito oferecidos pela
UBA. Vejam: no curso regular, há cerca de 10 a 12 brasileiros. No entanto, o
que chama a atenção são os “cursos intensivos”. Trata-se de uma estrutura ao
menos interessante. Os “cursos para doutorado” não integram o doutorado, mas
sem os mesmos não se pode ingressar no doutorado. Se houver sucesso nos cursos,
eles são considerados créditos de doutorado. Assim, se um aluno é reprovado no
“curso para doutorado”, não se considera que foi reprovado “durante o
doutorado”. O doutorado regular dura em media 4 a 6 anos, e tem um sistema
muito próximo do brasileiro.
O curso
intensivo (para brasileiros).
O dossiê Barreto-Varella denuncia
o curso intensivo da UBA, criado em 2009 e que, por razões óbvias, é o
preferido dos brasileiros. O próprio sítio na rede mundial do curso é escrito
também em português de forma muito similar ao da UCA. Há convênios com várias
instituições brasileiras para formação de pessoal.
E agora vêm os números: de acordo
com o diretor do curso, já há mais de 1.000 estudantes brasileiros no programa!
O regime geral do curso, contudo, leva a que muitos possam entrar e apenas uma
parcela deve concluir o curso. As aulas são realizadas durante todo dia, das 8h
às 12h e das 14h às 18h, em períodos concentrados de duas semanas, com turmas
de 30 alunos.
Os alunos devem ler os textos de todas as aulas antes dos módulos, ou
entre as aulas, entre 18h e a manhã do dia seguinte.
Não há tempo para leitura, para
reflexão, para convívio acadêmico. São aulas na sua maioria expositivas, em uma
rotina de oito horas de aula por dia, todos os dias, de forma concentrada,
incompatível com um padrão mínimo exigido para cursos brasileiros e diferente
mesmo dos padrões tradicionais argentinos destas Universidades.
Após as aulas, há a avaliação das
disciplinas, a defesa de um projeto e apenas os alunos que passam nos créditos
podem se matricular no curso de doutorado propriamente dito. A expectativa da
coordenação do curso é que apenas 10% dos doutorandos brasileiros concluam o
doutorado, em 4 a 6 anos. De qualquer modo, já seria um número duas vezes
superior ao número de titulados na USP, em um mesmo ano, ou quase 40% do
conjunto das instituições brasileiras. Ao final, trata-se de um único diploma,
expedido pela instituição argentina.
O preço.
Esses cursos de doutorado,
intensivos ou de verão, têm um preço diferenciado dos cursos regulares. Todos
estes cursos são operacionalizados por convênios com instituições brasileiras,
que cuidam da propaganda e do pagamento pelo curso. O programa gera importantes
recursos para a UBA e seus parceiros. Não dispomos dos números exatos, mas o
custo para cada estudante, pela Escola Superior de Justiça, por exemplo, é de
aproximadamente US$10 mil por aluno, o que significa uma receita superior a US$
10 milhões para o Programa de Pós-graduação em Direito da UBA e seus parceiros,
apenas com os estudantes brasileiros, sendo que poucos concluirão o curso[9].
No Brasil, um doutorado, que deve ser cursado em longas disciplinas e concluído
em até 4 anos, tem um custo médio R$ 50 mil (mais ou menos entre US$ 25 mil e
US$ 28 mil). Com a diferença de que, no Brasil, exige-se mestrado para cursar
doutorado. Na Argentina, não.
O nível de
exigência.
Por mais paradoxal que possa
parecer, é possível afirmar que são justamente as exigências de pós-graduação
no Brasil que criaram um sistema de mercado paralelo na Argentina. Ou seja,
aquilo que é o mérito da pós-graduação brasileira (o seu nível de exigência)
acaba por ser o seu “demérito”... E, com isso, aparece o espaço do “jeitinho”,
da busca facilitada do título doutoral. Como bem explicita o dossiê, não apenas
instituições de baixa qualidade passaram a oferecer diplomas de doutorado a
brasileiros, mas também instituições reputadas daquele país criaram um sistema
paralelo de oferta de cursos intensivos, com valores diferenciados para
atender... ao mercado brasileiro. Brasil, meu Brasil brasileiro... Barreto e
Varella são enfáticos: trata-se de cursos que não oferecem a mesma qualidade
dos cursos oferecidos no Brasil. A validação dos cursos da Universidade do
Museu Social da Argentina foram negadas em última instância pelo Poder
Judiciário e, com o seu não reconhecimento pela Coneau, tendem a ser renegadas
em qualquer instância no Brasil, pois sequer valem na Argentina.
Um alento. O Judiciário brasileiro está atento! Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça entendeu a questão em toda
sua complexidade. Nos Recursos Especiais 1.182.993/PR e 971.962/RS, ambos da
relatoria do ministro Hermann Benjamin, foi ratificado o entendimento da
necessidade da revalidação, no Brasil, de qualquer diploma obtido fora do país,
aplicando-se esta exigência igualmente aos títulos obtidos em países membro do
Mercosul. Alvíssaras. De outra forma não poderia ser. Afinal, todos os países
do mundo assim agem ao receber alunos de outras nacionalidades em suas
instituições, mesmo aquelas de ensino fundamental. Tal exigência, recíproca e
conhecida, jamais foi obstáculo à troca de experiências, ao nascimento e
consolidação dos sérios intercâmbios científicos e tecnológicos, financiados
pelas agências de fomente brasileiras e seus parceiros mundo afora.
A exigência
de excelência.
A excelência da produção
científica e tecnológica de qualquer nação depende de esforços contínuos,
demorados e de padrões a escaparam completamente de simples gestos rápidos. E
não é tarefa de uma só geração, embora o que uma geração decida seja
determinante para a outra. Para o bem e para o mal.
O necessário esforço em busca da qualidade.
Pois bem. Estereótipos são sempre juízos negativos. Eu não gosto de estereótipos. Se eu digo que “determinado habitante de uma região ou estado é preguiçoso”, estou fazendo um juízo negativo, com nítidas pretensões de universalização do meu discurso. Isso é péssimo. De qual habitante estou falando? Ou seja, ao propalar um estereótipo, parto do varejo em direção ao atacado. E, filosoficamente, falar por estereótipos é um desastre. Um retrocesso. Parafraseando Barthes, é se colocar no lado opressor da linguagem. Deixemos isso claro. O jeitinho deve ser combatido por todos nós.
Por isso, temos que lutar contra
o estereótipo do “jeitinho”. Mas o “réu” tem que se ajudar. Não podemos ficar
dando tiro no pé cotidianamente. Essa história de fazer doutorado nas férias,
assistindo poucas aulas e em grandes grupos, sem os cuidados mínimos que um
estudo acadêmico requer, não recomenda bem o Brasil. Não é um bom exemplo para
os jovens estudantes. Não é recomendado incentivar às pessoas a descumprir a
lei. Para que serve o MEC e a Capes?
A pergunta
final.
A pergunta é: se um brasileiro
“normal”, para ser doutor, necessita fazer mestrado para depois fazer
doutorado, esfalfelando-se em pesadas disciplinas e sob uma orientação
criteriosa e presente do seu orientador, que, certamente, para buscar a
qualidade na orientação, não será responsável por 80 ou mais orientados; e se o
orientando precisa apresentar uma tese inovadora e tecnicamente aprofundada, o
que não dá para se fazer em um opúsculo de poucas páginas, por que esse mesmo
Brasil tem que aceitar que alguém “atravesse” o sistema e busque facilidades,
para, depois, o título (diploma) valer o mesmo?
E se tantos reclamos há em
relação à baixa qualidade da formação dos bacharéis, por qual razão
admitiríamos igual proceder na pós-graduação com aceitação de diplomas de
duvidosa procedência? Ao invés de melhorarmos a graduação, piorarmos a
pós-graduação? O janelismo acadêmico é a tradução perfeita do “jeitinho” na
Academia.
Do modo como a coisa vai, com
tentativas no Congresso Nacional já há gente se movimentando no Senado! E nas
assembleias legislativas de burlar os requisitos da Lei de Diretrizes e Bases
da Educação, logo, logo, os pretendentes a serem doutores via jeitinho pedirão
que a presidente edite uma Medida Provisória (ironia minha, é óbvio), pela qual
“qualquer diploma de doutorado feito em qualquer país do mundo, desde que no
pergaminho apresentado haja o epíteto de doutor, valerá em território de terrae
brasilis” (o incrível é que — e agora não estou sendo irônico — muitos dos
diplomas do estrangeiro vêm com a tarja: não válido em território nacional! Mas
no Brasil valerá!).
E já que vamos facilitar mesmo,
por que não repristinar logo um velho Decreto (ou Ordenança, Portaria, Édito ou
coisa que o valha) lá do tempo do Império que dizia que qualquer bacharel tinha
o direito de usar o título de Doutor? Pronto. Aí está. Esse podia ser o artigo
segundo da Medida Provisória. E, no artigo terceiro, poderia constar:
revogam-se as opiniões em contrário, culminando com pena de multa para aqueles
que ousarem criticar os pretendentes à ajeitação!
Nem falarei, aqui, de alguns
pós-doutorados que são feitos na A. Latina e na Europa... Disso falarei em
outra oportunidade. Tem cada coisa... Há casos de pós-doutorados fast food:
uma viagenzinha à Europa e, pronto! E já há invasões. A crise européia faz com
que se intensifique a venda de espelhos e missangas para os nativos de terrae
brasilis. Recentemente, recebi um email dando conta de uma Instituição
sediada em Belo Horizonte, que não possui pós-graduação stricto sensu,
ter feito um “convênio” (êta palavrinha safada) para “oferecer pós-doc”, a
partir de uma Universidade Italiana. Também já vi oferecem pós-doc nas férias.
Não muito longe daqui.
Como demonstrarei, não falo do
sistema de pós-graduação argentino ou dos cursos de doutorado argentinos (a
Argentina possui tradição de doutoramentos, valendo citar figuras ilustradas
como Luis Alberto Warat e Carlos Maria Cárcova, e cito apenas estes para não
cometer graves injustiças). A coluna retrata, a partir do dossiê
Barreto-Varella, os problemas decorrentes de algumas modalidades de doutorados
destinadas “a brasileiros”. Sem generalizações.
Conforme o Dossiê
Barreto-Varella, as informações sobre o doutorado intensivo, como número de
alunos, organização das orientações e da leitura, índices de desistência foram
prestadas pelo Diretor do Programa na UBA, em mensagens eletrônicas trocadas
entre 06 e 09 de março de 2012. Há estudantes de cerca de 20 outras
nacionalidades no programa.
Dossiê Barreto-Varella, são eles:
Associação Nacional dos Docentes, Mestrados e Doutorandos do Brasil (ANDMDB);
Centro de Assessoramento Internacional, Pesquisas e Estudos Jurídicos; Escola
da Magistratura do Espírito Santo; Escola Superior de Justiça; Faculdade de
Direito de Ipatinga; Faculdade Oboé; Faculdade Stella Maris; Faculdades Santo
Agostinho; Juris Ensino Jurídico; Universidade de Cuiabá; Universidade
Presidente Antônio Carlos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário