Vaticano lamenta
"ataques" nas vésperas do conclave
Secretário de Estado do Vaticano
diz que a Santa Sé está a ser atacada por “notícias falsas” para condicionar o
conclave onde será eleito sucessor de Bento XVI, como as acusações contra
ex-bispo auxiliar de Lisboa e novas revelações sobre o Vatileaks.
O Vaticano está a ser fustigado
por “informações falsas” que têm por objectivo “condicionar” o conclave onde
será escolhido um novo Papa, afirma o secretário de Estado da Santa Sé,
Tarcisio Bertone, num comunicado divulgado este sábado. Reforça o que o
porta-voz do Vaticano já tinha dito: "Neste período há intervenções que
pretendem criar turbulências", sugerindo que as acusações contra ex-bispo
auxiliar de Lisboa e novas revelações sobre o Vatileaks têm como
objectivo condicionar sucessão de Bento XVI.
“No passado eram as grandes
potências, os Estados, que procuravam condicionar a eleição do Papa. Hoje
tenta-se fazer pressão através da opinião pública”, diz o comunicado do cardeal
que é o primeiro-ministro do Vaticano. Deplora a multiplicação “de notícias
frequentemente não provadas, ou não verificáveis, que é como quem diz falsa,
que fazem graves danos às pessoas e às instituições.”
É uma referência a casos como o
do bispo português acusado de assédio sexual. Um cardeal pode ficar fora do
conclave por estar acusado de encobrir abusos e D. Carlos Azevedo, actual
delegado para o Conselho Pontifício da Cultura, teve de desmentir denúncias de
assédio sexual.
A última conferência de imprensa
da semana na Santa Sé foi dedicada à Constituição Apostólica, que regula a
escolha do Santo Padre. Para explicar a lei que regula o conclave ainda sem
data, diferente dos anteriores por se realizar com o Papa cessante vivo, o
porta-voz do Vaticano, padre Francesco Lombardi, convidou a sentar-se na Sala
de Imprensa monsenhor Juan I Arrieta, secretário do Conselho dos Textos
Legislativos.
Virar a página, um dia depois de
ter sido obrigado a comentar novas revelações sobre o chamado Vatileaks e
a notícia de que a renúncia de Bento XVI se deve a um relatório sobre os
pecados no interior da Igreja, incluindo a existência de uma rede de prelados
homossexuais, era o que desejava Lombardi.
A notícia sobre a denúncia contra
D. Carlos Azevedo, ex-bispo auxiliar de Lisboa, foi publicada inicialmente na
revista Visão e demorou um pouco a chegar a Roma. Mas chegou,.
O português trabalha com o cardeal Gianfranco Ravazi, presidente do Conselho
Pontifico da Cultura, e um dos papabile – religiosos
considerados como tendo possibilidades de serem os escolhidos pelos seus pares
no conclave que se avizinha.
No Vaticano não se conhece
“nenhum processo em curso contra [D. Carlos Azevedo], pelo que o consideramos
com pleno respeito e dignidade”, diz o padre Lombardi. Pelo contrário:
“monsenhor Carlos Azevedo é uma pessoa que conhecemos e apreciamos no seu
serviço” afirmou o porta-voz ao PÚBLICO, repetindo “a fórmula” preparada para
um encontro com correspondentes portugueses no Vaticano, horas antes.
A revista Visão escreve
no seu último número que em 2010 um padre do Porto se aproximou da Nunciatura
para apresentar uma queixa, descrevendo-se como uma das vítimas de assédio de
D. Carlos Azevedo – os “vários casos de assédio” teriam acontecido nos anos
1980, mas só chegaram ao conhecimento dos representantes da Santa Sé com essa
queixa. A Nunciatura iniciou então um inquérito (com conhecimento e colaboração
de sectores da hierarquia) que, por sua vez, adianta a Visão, terá
permitido referenciar outros casos suspeitos.
“Tenho toda a confiança nos seus
superiores que lhe confiaram os actuais serviços em toda a responsabilidade”,
afirmou ainda Lombardi, a propósito do trabalho de D. Carlos Azevedo no
Conselho Pontifício da Cultura, para onde foi nomeado em Novembro de 2011, depois
de ter sido apontado como possível sucessor do cardeal-patriarca de Lisboa, D.
José Policarpo.
O cargo que veio ocupar para
Roma, relembrava ontem o Vatican Insider, publicação dedicada à
Santa Sé do jornal italiano La Stampa, não existia até então no organigrama
da Igreja. Na altura, especulou-se que na origem da transferência estivessem
divergências entre D. Carlos Azevedo e Policarpo.
Recorrendo ao tom que usara na
véspera, na mesma Sala de Imprensa da Santa Sé, quando lamentou “a tensão que é
o oposto do que o Papa e a Igreja desejam” na aproximação do conclave, o padre
Lombardi quis relembrar a propósito desta denúncia “que neste período há muitos
ataques e intervenções que pretendem criar confusões e turbulências na Igreja”.
“Por isso, reafirmo que não nos
devemos deixar impressionar e devemos insistir que este é um período importante
em que a Igreja deve acompanhar os cardeais no seu papel de escolha do novo
Papa, para o bem da Igreja e da humanidade”, acrescentou Lombardi.
Chantagem de leigos
Já na quinta-feira, o porta-voz
se vira obrigado a falar de escândalos, a propósito do trabalho do jornal La
Repubblica, segundo o qual Bento XVI decidiu renunciar o ano passado,
quando foi confrontado com a existência de um lobby gay, secreto e
activo, no Vaticano. De acordo com o diário, alguns dos membros desta rede de
prelados “unidos pela sua orientação sexual” terão sido a dada altura alvo de
chantagem por parte de leigos com os quais mantinham laços de “uma natureza
mundana”.
Estas revelações serão parte do
relatório de três cardeais encomendado por Bento XVI depois do escândalo Vatileaks,
caso que culminou na acusação do mordomo pessoal do Papa, condenado, entretanto
pelo roubo de documentos confidenciais. “Nem a comissão de cardeais, nem eu
próprio faremos qualquer comentário para confirmar ou desmentir o que foi
escrito. Cada um assumirá as suas responsabilidades”, afirmou na quinta-feira
Lombardi.
O cardeal Ravazi, com quem
trabalha o português D. Carlos Azevedo, vai seguramente participar no conclave
para escolher o sucessor de Ratzinger. O mesmo não pode ser dito de todos os
117 que naturalmente integrariam este colégio que se isolará na Capela Sistina
até ao fumo branco assinalar a eleição do sucessor de Bento XVI, o primeiro em
sete séculos a governar os fiéis na companhia de um ex-Papa vivo.
Na sexta-feira, Lombardi
confirmou que o Vaticano já recebeu do cardeal de Jacarta a mensagem de que a
sua saúde não lhe permitirá deslocar-se a Roma. Os mesmos motivos que deverão
justificar a ausência do patriarca emérito dos Coptas Católicos. Falta saber o
que fará o cardeal de Los Angeles, Roger Mahony, acusado de ter encoberto
abusos sexuais e conspirado para evitar que os sacerdotes abusadores fossem
denunciados. Mahony, suspenso semanas antes da resignação, numa medida inédita,
está sob pressão para não vir a Roma.
O conclave terá lugar, estejam em Roma 117 ou 114 cardeais. Nas leis que o regulam, explicou no Vaticano o monsenhor Juan I Arrieta, tudo se combina sempre “numa mesma lógica que visa evitar incertezas”. A lei apostólica é rígida, sublinhou, e isso deve entender-se à luz de “dois mil anos de história, de cismas e de riscos”. A Igreja está bem escudada contra crises e “quando há dúvidas, decide-se sempre por maioria”.cide-se sempre por maioria”.
O conclave terá lugar, estejam em Roma 117 ou 114 cardeais. Nas leis que o regulam, explicou no Vaticano o monsenhor Juan I Arrieta, tudo se combina sempre “numa mesma lógica que visa evitar incertezas”. A lei apostólica é rígida, sublinhou, e isso deve entender-se à luz de “dois mil anos de história, de cismas e de riscos”. A Igreja está bem escudada contra crises e “quando há dúvidas, decide-se sempre por maioria”.cide-se sempre por maioria”.
Sofia Lorena (Roma)
Fonte: AFP
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