quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

COMENTÁRIO - 06 DE FEVEREIRO DE 2013



COMENTÁRIO
Scarcela Jorge

O Congresso prefere eleger a desmoralização

Com apoio até de partidos oposicionistas, agora o Poder Legislativo está nas mãos de dois parlamentares que acumulam uma extensa lista de acusações por práticas ilícitas.

Nobres: - O Congresso optou para ir ao fundo do poço em termos de credibilidade social em função das escolhas nada recomendável para um país que tenta resgatar o exercício de seus cidadãos e prover melhorias de qualidade de representação, e que obviamente tentou expurgar das direções nas suas instituições por força da manifestação própria da sociedade o pulsar elementar de opinião. Alheio aos desejos da sociedade no sentido de fortalecer segmentos do corporativismo político que preza os conceitos antiéticos, podres e corruptos encastelados nos poderes executivo e legislativo: tanto é que na sexta-feira passada, quando o plenário do Senado elegeu Renan Calheiros (PMDB-AL) como seu novo presidente, ontem foi à vez de os deputados federais ignorarem as exigências mínimas da moralidade pública ao escolher Henrique Alves (PMDB-RN) para suceder o petista Marco Maia na presidência da Câmara dos Deputados. A imprensa nacional por todos seus segmentos  rememorou dias atrás as acusações que pesam tanto contra Alves quanto contra Calheiros, que agora passam a ingressar a linha sucessória da  Presidência da República. Na ausência da presidente Dilma Rousseff e do vice Michel Temer, o Brasil passaria a ser governado por um deputado já condenado em primeira instância por improbidade administrativa, investigado pelo Ministério Público por enriquecimento ilícito e acusado, entre outras coisas, de desviar recursos para empresas comandadas por laranjas e de beneficiar, em licitações superfaturadas, uma empresa que tem um ex-assessor como sócio. E, na sequência, o país estaria sob o comando de um senador que já tinha sido “forçado” a renunciar à presidência do Senado em 2007 e que não desistiu dos métodos ilícitos de fazer política, tendo sido denunciado ao STF semanas atrás por peculato, falsidade ideológica e uso de documento falso. Ainda pesam contra Calheiros denúncias de lobby em troca de apoio político e mau uso dos recursos da cota parlamentar. Pior ainda é saber que deputados e senadores muito provavelmente não dedicaram um segundo sequer de consideração para com a opinião pública antes de colocar o Congresso Nacional nas mãos de duas raposas, já que as votações que consagraram Alves e Calheiros foram secretas. Pelo menos no Senado, o placar deixa claro que o alagoano recebeu votos de parlamentares pertencentes a partidos que, diante dos microfones, manifestaram apoio a Pedro Taques (PDT), lançado como alternativa a Calheiros. Na Câmara, legendas de oposição não tiveram a menor vergonha de escancarar sua adesão ao deputado potiguar. A traição aos eleitores que esperavam da oposição que fizesse seu papel veio em troca de postos nas Mesas Diretoras das duas casas. Em vez de enviar à sociedade uma mensagem clara de descontentamento com a entrega do comando do Legislativo a políticos do quilate de Alves e Calheiros, as legendas oposicionistas preferiram mergulhar em negociatas para não perder um naco de poder que, no fim, não terá como fazer diferença ou facilitar o trabalho que lhe compete. É justamente esse tipo de comportamento, ainda mais condenável quando amparado pelo voto secreto, que desmoraliza a oposição diante do eleitor cansado dos desmandos do grupo hoje no Planalto. O voto secreto no Congresso tem por objetivo proteger o parlamentar de possíveis retaliações por parte do Poder Executivo, e há ocasiões em que deve ser defendido. No entanto, não há razão para manter o segredo também em situações como as eleições para o comando das casas legislativas, ou a cassação de parlamentares. O cidadão tem pleno direito de saber se seus representantes endossam as práticas de corrupção promovidas por políticos como Henrique Alves e Renan Calheiros. Ao manifestar seu voto abertamente, o parlamentar fica sujeito à cobrança da imprensa e dos eleitores. É impossível saber se os resultados de ontem e sexta-feira teriam sido diferentes em caso de voto aberto – o grau de cinismo reinante no Congresso é tal que não se exclui a hipótese de um desfecho idêntico, talvez com leves diferenças nos números de votos; afinal, em Brasília é alta a confiança na memória curta do eleitor, que anseia pela moralização da política, mas, a cada quatro anos seguem elegendo os mesmos de sempre. As mais de 300 mil assinaturas colhidas em um abaixo-assinado on-line contra Renan Calheiros são um bom sinal, mas, sem que a indignação se transforme em consciência diante das urnas, as perspectivas para o país seguirão desanimadoras e obviamente pessimistas.
Antônio Scarcela Jorge


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