Barbosa chega à presidência
do STF em meio à fama e à tensão com colegas
Joaquim Barbosa assumirá a
presidência do STF em novembro após ter sido o relator do mensalão Alçado à
presidência do Supremo Tribunal Federal (STF) em votação simbólica, o ministro
Joaquim Barbosa chegou ao comando da corte no momento em que ganha notoriedade
no Brasil e no exterior. Primeiro presidente negro do Supremo, ele é relator do
julgamento do mensalão, no qual já condenou 22 dos 25 réus que tiveram seus
casos analisados até agora, entre os quais o ex-ministro José Dirceu. Sua
postura tem sido elogiada nas ruas: no último domingo, enquanto votava no Rio,
Barbosa foi abordado por moradores que queriam ser fotografados ao seu lado. Nos
últimos dias, o ministro ainda estampou capas de revistas e foi citado por
jornais estrangeiros. Para o “New York Times”, ele está emergindo do julgamento
como uma espécie de “herói político”. As posições de Barbosa no processo têm
sido acompanhadas pela maioria dos ministros. O placar folgado das votações,
porém, contrasta com as tensas relações que Barbosa mantém com alguns membros
da corte. Durante o julgamento, ele já trocou farpas com dois colegas: o
revisor do processo, Ricardo Lewandowski, e o ministro Marco Aurélio Mello. Num
dos bate-bocas entre o relator e o revisor, Marco Aurélio interveio em defesa
de Lewandowski e disse que Barbosa não estava “respeitando a instituição”. Posteriormente,
o ministro afirmou a jornalistas que estava preocupado com a perspectiva de que
Barbosa assumisse a Presidência da corte. Em resposta, Barbosa insinuou que o
colega ingressara no Supremo por ser primo do ex-presidente Fernando Collor,
que o nomeou. Apesar da preocupação expressa por Marco Aurélio, Barbosa foi
eleito pelos colegas presidente do órgão nesta quarta-feira sem qualquer
contestação. A tradição do Supremo recomenda que a presidência da corte seja
ocupada pelo ministro há mais tempo na casa e que ainda não tenha ocupado o
cargo. Nomeado para o STF em 2003 pelo então presidente Luiz Inácio Lula da
Silva, Barbosa, de 58 anos, assumirá a presidência do tribunal em 22 de
novembro, quando o atual ocupante do cargo, Ayres Britto, completará 70 anos e
se aposentará. Barbosa ficará no posto por dois anos.
Infância pobre
Nascido em Paracatu (MG), ele se
formou em direito na Universidade de Brasília e fez mestrado e doutorado na
Universidade de Paris-II. Barbosa é professor licenciado da Universidade do
Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e autor de dois livros sobre direito – um sobre
o funcionamento do Supremo, editado na França, e outro sobre o efeito de ações
afirmativas nos Estados Unidos. Antes de ingressar na corte, o ministro ocupou
diversos cargos na administração federal, entre os quais o de procurador da
República (entre 1984 e 2003), chefe da consultoria jurídica do Ministério da
Saúde (1985-88) e oficial de chancelaria do Ministério das Relações Exteriores
(1976-1979), chegando, inclusive, a servir na embaixada do Brasil na Finlândia.
Críticas e discussões
Barbosa já teve discussões
acaloradas com outros ministros do STF, como Ricardo Lewandowski. Antes do
julgamento, Barbosa já se envolvera em outras discussões com membros da corte e
fora objeto de comentários depreciativos de colegas. Em 2007, a ministra Carmen
Lúcia foi flagrada por jornalistas ao enviar uma mensagem para Lewandowski em
que citava a nomeação de Barbosa para a relatoria do processo do mensalão:
“Esse vai dar um salto social com o julgamento”, escreveu a ministra. Em 2009,
durante um bate-boca na corte, o então presidente do STF, Gilmar Mendes,
afirmou que Barbosa não tinha “condições de dar lição a ninguém”. Barbosa
respondeu: “Vossa Excelência, quando se dirige a mim, não está falando com os
seus capangas do Mato Grosso, ministro Gilmar”. Em outro episódio, Cezar
Peluso, que deixou o Supremo no fim de agosto, disse em entrevista que o colega
tinha “receio de ser qualificado como alguém que foi para o Supremo não pelos
méritos, que ele tem, mas pela cor”. Barbosa respondeu a crítica em outra
entrevista. Ele afirmou que Peluso deixaria a “imagem de um presidente do STF
conservador, imperial, tirânico, que não hesitava em violar as normas quando se
tratava de impor à força a sua vontade”. A cor da pele de Barbosa também tem
sido evocada por críticos do ministro que não pertencem ao tribunal. Condenado
no julgamento do mensalão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro, o
ex-deputado Roberto Jefferson disse em entrevista em agosto que Barbosa fora
indicado para a corte por ser negro. “Tenho para mim que (ele) foi para o STF
na cota racial, e não por notório saber jurídico.”, disse Jefferson. No livro
em que conta sua experiência como conselheiro de Lula no Planalto, Frei Betto
também escreveu que a cor de Barbosa influenciou sua escolha para o Supremo. Em
anotação feita em 2003, ele diz que ter sido procurado pelo então ministro da
Justiça, Marcio Thomaz Bastos, em busca de uma indicação de “um negro com
perfil para ocupar vaga no STF”. Ele diz que a nomeação de mulheres, política
intensificada pela presidente Dilma Rousseff, raramente é contestada. “Mas
quando se trata de um negro, isso vira uma excentricidade, ou um absurdo”.
Fonte: BBC BRASIL foto: - Palácio da Justiça - STF - Praça Três Poderes
Brasília - DF
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