domingo, 4 de novembro de 2012

COMENTÁRIO - 04.11.2012



O DIREITO PENAL


Nobres: O Direito Penal brasileiro fundamenta-se sobre três conjuntos de leis: o Código Penal, o Código de Processo Penal e a Lei de Execução Penal. Aos dois primeiros, uma das principais críticas é a de que eles estão ultrapassados, por terem sido escritos há várias décadas, num tempo em que os casos de seqüestro e narcotráfico, por exemplo, eram raros. O Código Penal, escrito em 1940, transformou-se, nos últimos anos, numa enorme colcha de retalhos, tantas foram as emendas que tentaram atualizá-lo. É ele que descreve o que é crime e determina a pena para cada tipo de infração. O Código de Processo Penal, de 1941, é o que determina os passos que a Justiça deve respeitar diante da ocorrência de um crime, da investigação policial ao julgamento. É seu anacronismo que faz com que os processos se arrastem lentamente e com tantas protelações, em geral a favor dos criminosos. Por fim, a Lei de Execução Penal, de 1984, define as condições em que o sentenciado cumprirá a pena. Considerada falha em muitos pontos, ela permite, por exemplo, que, depois de cumprido um sexto da pena, boa parte dos condenados alcance o privilégio de voltar às ruas para cumprir o restante da sentença no regime semi-aberto, no qual o sentenciado passa o dia em liberdade e só volta à noite para a prisão. Foi essa lei que devolve normalmente à liberdade a assassinos depois de cumprirem pouco mais da metade da pena. Muitos especialistas acreditam que não é possível combater a criminalidade com leis tão ultrapassadas e cheias de anomalias. De fato, há distorções. A pena para um homicídio doloso (com intenção), por exemplo, vai de 6 a 20 anos, enquanto o tempo de cadeia para um funcionário público que mexer num computador para tirar vantagem indevida pode chegar a 12 anos. Num caso extremo, um homicida pode ficar seis anos atrás das grades, e um burocrata corrupto, o dobro do tempo. Essa distorção, que faz com que as penas para crimes contra o patrimônio sejam mais severas do que as para os crimes contra a vida, permeia vários artigos do Código Penal Brasileiro. - Corrigir tais falhas não é uma tarefa fácil. A transformação de uma lei depende da aprovação do Congresso Nacional e da sanção do presidente da República, o que não acontece da noite para o dia. É comum, aliás, uma modificação passar tanto tempo esperando aprovação que, ao entrar em vigor, já está ultrapassada. Mas há solução: tramitam ainda hoje no Congresso Nacional mais de 100 projetos relacionados à violência, desde os que prevêem restrições à venda de armas até os que endurecem a pena para seqüestro. Uma das mais interessantes é uma proposta de reforma do Código de Processo Penal entregue aos parlamentares e que aguarda para ser votada. Formulada por uma equipe de juristas a pedido do Ministério da Justiça, ela ataca uma das maiores deficiências da Justiça: as faltas de agilidade, que lhe dá o já gasto apelidam de “morosa”. Dividida em oito projetos de lei, a proposta limita o prazo dos inquéritos policiais em 60 dias, eleva o valor máximo de fiança de 500 reais para 3 milhões de reais e reformula os procedimentos dos julgamentos. Se aprovada, exigiria que os processos fossem concluídos em um ano, ao contrário dos habituais três ou quatro anos. Também serão eliminados vários dos recursos que hoje só servem para que réus com bons advogados possam adiar o momento de encarar a Justiça. Exemplo disso é o que dá a todo condenado a mais de 20 anos de cadeia o direito a novo julgamento. Sabe-se lá qual a lógica disso, mas hoje é assim: os teoricamente mais perigosos têm direito a uma nova chance. Outra solução seria a criação de leis para combater crimes específicos que hoje não estão devidamente tipificados na legislação, como delitos pela internet e o crime organizado. “Algumas condutas que hoje não são punidas ou punidas de forma distorcida devem ser previstas em leis mais apropriadas”. O crime organizado também está na mira dos legisladores. Seis projetos tornando mais dura a legislação sobre esse tipo de crime já existem no país duas leis sobre o assunto – tramitam no Congresso. Um deles tipifica o crime organizado como hediondo e agrava a punição. Outro, de autoria do governo, altera a Lei Antidrogas e cria mecanismos para que traficantes condenados permaneçam mais tempo atrás das grades. O projeto propõe punições diferentes para quem promove o tráfico, para quem financia a atividade criminosa e para quem forma quadrilha. A idéia é dar um caráter cumulativo às punições para combater com mais eficiência esse tipo de crime. Ao analisar as sugestões para reformulação do Direito Penal brasileiro, percebe-se que os juristas dividem-se em duas correntes, com idéias bem diferentes. Os mais conservadores defendem que a solução para acabar com a violência é endurecer a lei e aplicar penas severas para bandidos violentos, com o objetivo de mantê-los por um longo tempo presos. Hoje, o tempo máximo que uma pessoa pode ficar presa é 30 anos, mesmo que tenha sido sentenciada a mais de 100 anos. A maioria dos defensores públicos defende essa tese. “No Direito Penal realmente científico, o importante é conter o criminoso”, diz. “A idéia de reabilitação é uma falácia. O papel do Direito Penal é proteger a sociedade e, por isso, latrocidas, estupradores e seqüestradores têm que ficar presos por um longo período para que não possam cometer novos crimes.” Mas há quem pense diferente e se guie pelas idéias do jurista italiano Cesare Becaria, do século XVIII, para quem o que inibe o crime não é o tamanho da pena, mas a certeza da punição. A lei deve sofrer ajustes que tornem os processos mais ágeis e corrijam suas distorções, como no caso das penas para crimes patrimoniais e contra a vida. À propósito desencadeia no mundo jurídico em meio a debates, entre outros se coloca a redução da maioridade penal é um dos temas mais polêmicos. Hoje, menores de 18 anos são inimputáveis, o que significa que, ao cometerem um crime, não são presos, mas enviados para unidades “de reabilitação” onde cumprem medida socioeducativa. Para os que se enquadra a realidade do cotidiano, punir os menores de 18 anos como adultos é um passo para a redução da criminalidade. “Só no Brasil o menor criminoso é tratado como coitadinho”, afirma alguns promotores de justiça comungada com a maioria da sociedade: “Nos Estados Unidos, eles chegam a ser condenados à pena de morte.” “A redução da idade de responsabilidade penal contribuirá em tese para combater a violência.” O índice de reincidência de menores infratores é bem igual ao de presidiários. “Um trabalho socioeducativo intenso com esses adolescentes infratores requer eficácia”. Há quem veja o caminho entre uma coisa e outra. Um dos pontos mais controversos da legislação sobre menores infratores prevê que, seja qual for o crime cometido, o culpado permanecerá interno até a maioridade. Essa restrição acreditam alguns especialistas, é um estímulo à participação de jovens em quadrilhas de bandidos, além de, muitas vezes, servir à impunidade, pois as quadrilhas imputam a culpa de todos os seus crimes ao integrante menor de idade. Para quem vê o tamanho da pena como um freio à criminalidade, seja pelo efeito de dissuasão, seja pelo tempo que mantém o criminoso fora de circulação –, é brando demais no Brasil o tratamento dado aos reincidentes e o regime de progressão de pena para criminosos violentos. Graças à progressão, mesmo condenados por homicídio cumprem parte da sentença em liberdade. Quanto aos reincidentes, a idéia é aplicar penas mais longas a cada novo delito, com perdas na possibilidade de progressão. Ou seja, quanto mais vezes o sujeito reincidir no crime, maior será sua pena e menor sua possibilidade de se beneficiar das facilidades da lei, só assim, seria possível interromper a “porta giratória da Justiça”, mecanismo pelo qual o condenado por um crime grave fica preso por pouco tempo para em seguida voltar às ruas e tornar a delinqüir. A reforma em proposição também se tornou lenta em toda excelência, que em tese viria dar dinamismo a essas questões, introduziria na realidade efeitos punitivos para quem infringem a lei e deixaria de ser elemento de defesa dos transgressores.
Antônio Scarcela Jorge
 
*O comentarista é bacharelando em Direito.


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