COMENTÁRIO
Scarcela Jorge
O PODER DO ESTADO E A CORRUPÇÃONobres:
A concepção e a operação de superestruturas de poder complexas derivam,
em primeiro lugar, da necessidade de oferecer segurança e proteção à população
diante de eventos e fontes de sofrimento que superam a capacidade individual e
mesmo coletiva de resistência, a exemplo de agressões externas ao país,
violência social e catástrofes naturais. Em segundo lugar, o Estado é útil para
prover bens coletivos, cujo suprimento por ação individual ou da comunidade é
bastante difícil, como a administração de um poder judicial e dos equipamentos
urbanos de uso comum: avenidas, ruas, limpeza da cidade etc. Para aquilo que
indivíduos e a sociedade organizada não consigam solucionar, as pessoas devem
abrir mão de parte de sua liberdade e consentir em se submeter a um poder
instituído, o Estado, sempre dentro dos parâmetros delineados pelo princípio da subsidiariedade. O mercado tem mecanismos para o saneamento de falhas
privadas, mas as falhas estatais vêm se tornando crônicas. As dificuldades principiam
quando o Estado se torna um monstro, eivado de ineficiência e corrupção,
forçando a sociedade a criar mecanismos para domar o monstro estatal,
transformado ele próprio em fonte potencial de ameaça. A situação que o Brasil
está vivendo não se restringe a uma grande recessão e falência financeira dos
municípios, estados e União, com seus déficits gigantescos, ineficiência elevada
e desvios de dinheiro público. A situação é mais grave, pois o poder estatal e
suas estruturas vivem criando fórmulas para transferir cada vez mais parcelas
do patrimônio, produto e renda da sociedade para o setor público, sem que este
se disponha a reduzir seu tamanho, diminuir suas burocracias, reduzir seus
salários médios, conter o inchaço da máquina e suprimir desperdícios. O mesmo
Estado que está correndo atrás de meios para aumentar a arrecadação tributária com
mais sacrifícios sobre uma população já castigada por brutal recessão e alto
desemprego não tem sido capaz de enfrentar seu excessivo tamanho e a bagunça
financeira que tomou conta dos governos em todos os níveis. É bom lembrar que
não se trata de um problema dos governos atuais; é uma situação crônica do
setor estatal brasileiro que, mesmo em crise profunda, não reformula suas
estruturas e seus privilégios, e quando o faz é de forma tímida. O Estado é
necessário, sim, naquilo que escapa à capacidade de solução por ação das
instâncias inferiores, mas precisa de limites e controles sobre seus poderes e
suas estruturas. O poder constituído não pode tudo, mesmo porque, se deixado
livre e sem controle pela sociedade, o Estado se esmera na criação de
burocracias, benefícios e privilégios, políticos
e suas corporações funcionais, descamba para a corrupção, presta maus serviços
e cobra impostos altíssimos. No momento em que a deterioração econômica,
política e moral do Estado brasileiro atingiu níveis elevados, o anúncio de
medidas de privatização de empresas estatais e liberação de algumas atividades
para a iniciativa privada é louvável. Por óbvio, o setor privado também tem
defeitos, mas seus erros e sua ineficiência, sobretudo se não atender bem ao
consumidor, acabam em prejuízo e falência. O mercado tem mecanismos para o
saneamento de falhas privadas, mas as falhas estatais vêm se tornando recorrentes.
Antônio Scarcela Jorge.
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