COMENTÁRIO
Scarcela
Jorge
A SOBERANIA DO ELEITOR
Nobres:
É histórica a tendência de o
eleitor demonstrar sua insatisfação ou descrença votando em branco, anulando o
voto ou simplesmente não comparecendo para votar. Os brasileiros costumam
culpar os políticos pela inadequada condução do país e pelas mazelas
existentes. Não deixam de estar certos, porém esquecem ou não se conscientizam que
também são responsáveis, pois é o voto que define quem vai exercer o comando da
política e do gerenciamento público. Se os mandatários não se revelam
eficientes, é evidente que a responsabilidade é também de quem lhes concedeu o
mandato através do voto. Todavia, pior que votar mal é a omissão, pois isso é
renegar o direito de cidadania. Essa tendência, recorrente em épocas de crises
políticas, nos últimos tempos tem sido facilitada pelo uso das redes sociais,
que potencializam a disseminação dessa insatisfação. Antes, o desejo era apenas
pessoal, isolado. Agora, com o compartilhamento, a ideia vai agregando pequenos
movimentos que se ampliam criando força e adesões. Circulam boatos e
“correntes” na internet conclamando os eleitores a não comparecerem à votação,
ou, se comparecerem, que votem em branco ou nulo. O resultado é preocupante. Se
os mandatários não se revelam eficientes, é evidente que a responsabilidade é
também de quem lhes concedeu o mandato. Recentemente houve eleição suplementar
para governador do estado do Tocantins. No primeiro turno, quase metade do
eleitorado não optou por nenhuma das candidaturas: a abstenção, somada aos
brancos e nulos, chegou a quase 50% dos votos. No segundo turno o porcentual
foi ainda maior: quase 60%. Ou seja: o candidato vencedor não alcançou
representatividade, não obteve apoio da maioria, foi eleito pela minoria. Até
nas pesquisas eleitorais nota-se essa atitude do eleitor. Consulta sobre o
pleito presidencial divulgada na semana passada mostrou que as intenções de
nulos e brancos variaram entre 22% e 35%. Nessa mesma pesquisa nota-se que,
faltando pouco mais de três meses para a eleição, 59% dos eleitores não citaram
intenção espontânea de votar em algum candidato. Este é um reflexo do
desencanto e, por consequência, desinteresse – do eleitor com a política.
Entretanto, isso não contribui para melhorar a situação. Desde que se
consolidou o processo de redemocratização, após o regime militar, vem ocorrendo
decréscimo no interesse participativo que tivera ponto alto em marcantes
campanhas como a das Diretas Já. Parece que o povo se acomodou, acreditando que
tudo estava resolvido. Sem movimentos fortes e permanentes, a vigilância
enfraqueceu e, aos poucos, cresceu a deterioração dos valores e dos princípios
éticos, até chegar ao ponto em que estamos. E essa situação não será revertida
senão com atitudes fortes, participação e cobrança. Ignorar o problema ou dele
fugir é atitude leniente que só favorece os maus políticos. O eleitor não pode
incorrer no erro de imaginar que votar branco, nulo ou se abster evitará que os
maus políticos se elejam ao contrário, esses mesmos que estão aí se reelegerão,
ou virão outros de iguais propósitos, pois sabem que o povo está alheio. A
resposta é votar, e votar bem, votar em candidatos com propostas sérias, que
estejam comprometidos com os anseios populares e revelem responsabilidade
cívica para com o país. Contudo, isso não acontece de repente, não se resolve
em cima da hora, na véspera da eleição, quando os esquemas já estão armados.
Por isso tenho pregado, há muito tempo, a necessidade de efetiva participação
em busca da verdadeira renovação, promovendo-se o expurgo da política viciada,
alimentada por partidos cuja ideologia são alianças espúrias, interesses
pessoais de lideranças negocistas que agregam, em suas bases, políticos com
ideal interesseiro e aético, que depois levam esses maus princípios para dentro
das instituições. E deve o eleitor ficar atento às siglas que mudam de nome
para apagar a imagem corrompida, mas continuam a ser conduzidas com os mesmos
questionáveis ideais. Defendo, também, que é necessário conscientizar e
estimular a juventude, despertando-lhe o interesse em participar, as
estatísticas que reforçam essa necessidade. O levantamento revela queda no voto
jovem, queda no número de títulos de eleitor expedidos para jovens com idade
entre 16 e 18 anos e que, até junho deste ano, só 40% dos jovens brasileiros
nessa idade haviam tirado título de eleitor. O ingresso espontâneo no sistema
eleitoral é normalmente entendido como indicador da vontade de participar
politicamente dos rumos do país. A queda representa, portanto, a decisão de
retardar esse direito. É importante transmitir à juventude seu significativo
papel político, pois a verdadeira política é um exercício diário, indispensável
na democracia. Acredito que a partir do voto seletivo veremos o surgimento de
novas lideranças depuradas, sem vícios e sem ideias ultrapassadas. A efetiva
mudança política não virá pelo equivocado tipo de protesto que menoscaba o
direito do voto; virá, sim, pela valorização do voto e pela decidida
participação cidadã. A omissão abre caminho aos oportunistas que reforçam ainda
a desenfreada compra dos votos.
Antônio Scarcela Jorge.
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