COMENTÁRIO
Scarcela
Jorge
FORO PRIVILEGIADO
Nobres:
Numa decisão
caracterizada como inusitada por sua unanimidade, o STF materializou o primeiro
passo para a erradicação definitiva desse absurdo privilégio conferido, por
alguma razão que a própria razão desconhece, a mais de 50.000 brasileiros, de
ministros de Estado e governadores, até prefeitos: o malsinado foro privilegiado.
A Suprema Corte concluiu que os parlamentares só serão julgados no STF, em caso
de crimes cometidos no exercício do mandato ou em razão dele. Contudo, restaram
divergências entre os ministros quanto ao limite da restrição. Antes disso, o
foro por prerrogativa de função facultava aos congressistas responderem a ações
penais somente no STF, seja qual fosse o ilícito penal cometido. Na
prática, esse benefício anômalo resultava num acúmulo de processos que
congestionavam o já assoberbado STF, restando em sua maioria prescrita e impune.
Senadores e deputados acusados de crimes comuns, tais como um conflito
doméstico, passarão a ser julgados no juízo de primeiro grau. No entanto a
variada interpretação ficará a cargo dos juízes e tribunais que lidarem com os
casos concretos, fato jurisdicional que poderá criar sérias divergências. Por
amostragem, a histórica e polêmica decisão do STF deixa em aberto o destino das
ações penais de mais de 100 políticos envolvidos na Operação-Lava-Jato. “Como molde”
será a seguinte hipótese: um parlamentar, em busca de obter recursos para
financiamento da campanha da sua reeleição, acaba por aceitar propina de alguma
empresa, com o compromisso de, caso eleito, favorecê-la de alguma forma. Ocorre
que essa contrapartida não é necessariamente especificada. Todos sabem que ela
existe, representará um ato de corrupção, mas aleatório. Mas surge a indagação:
o suposto ato de corrupção tem de fato relação com o mandato parlamentar? É
claro que sim, pois na feroz competição para reeleger-se, nenhum candidato
recebe recursos tipo caixa dois, sem firmar compromissos futuros. O mesmo
ocorre com os corruptores, cobras criadas, que não costumam jogar dinheiro
fora. Estima-se que nessas situações, o STF vai analisar caso a caso. Ao que tudo
indica, o debate sobre as novas restrições ao foro especial vai protrair-se no
tempo. Entretanto o Ministro Dias Toffoli em reunião da 2ª Turma do STF, na
semana passada, encaminhou ofício à Presidente, ministra Cármem Lúcia. O
documento contém duas propostas de súmulas vinculantes à decisão da Corte que
restringiu o foro especial somente a senadores e deputados federais. Na
primeira refere: A competência por prerrogativa de foro, prevista na
Constituição Federal para agentes públicos dos três Poderes e do MP, compreende
exclusivamente os crimes praticados no exercício e em razão do cargo ou da
função pública. A segunda refere-se à extensão da primeira às Constituições
Estaduais e à Lei Orgânica do Distrito Federal. Neste sentido, estamos apenas
no início do fim do instituto teratológico que atende pelo epíteto de foro
privilegiado. Há um longo caminho a percorrer, até o dia em que um meirinho de
primeira instancia adentrar em algum dos ministérios esplanada para intimar um
Ministro da República, Afinal, não somos todos iguais perante a lei? Vamos
aguardar.
Antônio Scarcela
Jorge.
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