terça-feira, 5 de dezembro de 2017

COMENTÁRIO SCARCELA JORGE - TERÇA-FEIRA, 5 DE DEZEMBRO DE 2017

COMENTÁRIO­
Scarcela Jorge
O IMPÉRIO DA CONFUSÃO

Nobres:
É mais do preciso que os setores mais deslumbrados do Judiciário abandonem o ativismo e exercitem a moderação na interpretação das leis, sob pena de exasperarem a polarização no Judiciário, inviabilizando a condução do país. A harmonia entre os poderes, com seus conflitos balizados pela lei, é fundamental para modernização da país. No curto prazo, já que a reforma trabalhista polarizou os campos, faz-se o quanto antes necessário que o Supremo seja provocado a se manifestar sobre a constitucionalidade da reforma como um todo, para resolver desde logo quais dispositivos, se é que há algum, seriam inconstitucionais. Do contrário, o passo modernizador que foi dado pela reforma corre o risco de ser revertido pela insegurança jurídica advinda da sistemática negação à aplicação da lei. Não há democracia verdadeira sem profundo respeito ao Estado de Direito, o que equivale a dizer que a democracia não é apenas a vontade da maioria. Se hoje isso parece um truísmo, essa compreensão é, na verdade, fruto de um longo amadurecimento político e institucional para garantir o respeito às leis, à Constituição e conferir à dignidade do poder Judiciário uma verdadeira equivalência à dos poderes Legislativo e Executivo. No entanto, é preciso cautela para que os juízes não abram mão da prudência e da boa interpretação das normas do ordenamento jurídico. Especialmente em um país como o Brasil, em que a Constituição é farta de normas programáticas e principio lógicas, a lei abusa de termos genéricos e o Congresso muitas vezes é omisso, é fácil que juízes cedam à tentação e assumam uma postura ativista. Eventuais discordâncias ideológicas se travestem de posições jurídicas e degeneram em verdadeiro boicote às decisões políticas. Por outro lado uma juíza federal suspendeu a propaganda do governo federal sobre a reforma da previdência, porque não enxergou nela caráter informativo; ao contrário, viu “manipulação”, “desinformação” e desqualificação do funcionalismo público por parte do governo. Afora o fato de que a propaganda não ataca diretamente o funcionalismo, ao repisar fatos óbvios como a existência de privilégios nos regimes previdenciários brasileiros, a decisão ainda entrou no mérito do que o anúncio deveria discutir algo inadequado em se tratando de um tema tão complexo, cheio de contornos que obviamente não cabem todos em uma propaganda de televisão.  Não se ignora que no Brasil existe o controle difuso de constitucionalidade e que os juízes têm o dever de julgar a constitucionalidade das leis nos casos concretos de acordo com sua consciência. O que não parece razoável é que se insista em uma leitura da Constituição que privilegie apenas o princípio protetivo, em detrimento dos princípios mais liberais, que também constam da Constituição, de modo a rejeitar substancialmente as mudanças aprovadas pelo Congresso. A Constituição brasileira abriga diversos princípios em tensão entre si essas tensões são resolvidas pelo Congresso e pelas assembléias estaduais, na edição das leis, e resolvidas diariamente por juízes e pelo Supremo Tribunal Federal, quando faz o controle abstrato de constitucionalidade. Há uma margem entre os ‘extremos e extremos’ estes proibidos pela Constituição em que o Congresso deve ter liberdade para navegar e conduzir o país. Dentro dessa margem, os juízes, por mais que divirjam ideologicamente das decisões tomadas, devem respeitar a separação dos poderes e não consolidar a desordem.

Antônio Scarcela Jorge.

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