COMENTÁRIO
Scarcela Jorge
ARRISCAR NA CURTA MEMÓRIA
DO BRASILEIRONobres:
Neste ano, os cidadãos brasileiros assistiram de
camarote a um jogo de meias verdades mantido entre dois pólos que já se
atraíram imensamente num passado nada distante, mas que hoje simplesmente se
repelem: de um lado, o PT, os defensores do governo Dilma e os apoiadores de
Lula; do outro, o PMDB e os defensores do atual governo. No duelo de narrativas
falseadas sustentadas por ambos os lados, ninguém sai ganhando, menos ainda os
espectadores da contenda. Primeiramente, o PMDB. Enfurnado até a alma no
petrolão e em outros tantos ‘esquemas’ sobretudo no assalto à Petrobras e a
outros órgãos federais desde meados dos anos 1990, o partido de Temer, uma vez
alçado ao governo central, passou a agir e a discursar como se nada tivesse a
ver com a corrupção instaurada no governo anterior, do qual foi sócio e
cúmplice enquanto lhe foi conveniente. E como lhe foi conveniente! Ao mesmo
tempo, o PT, sobretudo pela voz de Lula em seus comícios fora de época, põe-se
a falar em crise, recessão econômica, desemprego e perda de conquistas sociais
como se tudo isso fosse invenção de Temer e do PMDB. Quem ouve Lula e seus
adoradores discursarem, sem o mínimo senso crítico nem conhecimento da história
política recente do país, sai da praça convencido de que os problemas nacionais
surgiram a partir do momento em que Temer chegou ao poder. Como se tudo isso
nada tivesse a ver com a herança calamitosa deixada por Dilma, especialmente no
campo econômico, quando foi destituída pelo Senado em agosto de 2016. Do mesmo
modo, Lula e lulistas ficam a gritar “golpe, golpe, golpistas”, mas parecem
esquecer, por amnésia seletiva, que a boca que em 2015/2016 mordeu a mão do PT,
arrancando o dedo e o anel de Dilma, foi a boca peemedebista que essa mesma mão
tratou de alimentar, com ração política de primeira, como cão de guarda do
governo petista no Congresso de 2006 a 2015. Num súbito esquecimento ditado
pela conveniência, esquece-se que quem trouxe o PMDB para sua base e para
pertinho do Planalto, mimando-o com ministérios às pencas, foi o próprio Lula,
para escapar do naufrágio que o mensalão poderia ter representado para ele, em
2005/2006. Esquece, ainda, que foi o mesmo Lula quem acomodou Temer como vice
da sua pupila em 2010, em uma aliança eleitoral reeditada (e de novo: excelente
para ambos) no pleito seguinte. Tem-se, então, um mútuo contrassenso;
narrativas parciais em choque, editadas em função da conveniência e da lente
político-ideológica com que cada lado prefere enxergar os fatos. Agora, o mais
revoltante é constatar que, ao que tudo indica, estamos diante de uma guerra
entre facções, gangues que brigam pelo controle de determinada boca de fumo,
como aquelas representadas em filmes como “Cidade de Deus”. Tudo, logicamente,
em escala muito maior e envolvendo o tesouro público. O seu, o meu, o nosso
suado dinheiro, assaltado antes pelo PT, agora pelo PMDB, com apoio do PSDB.
Apostando sempre na curta memória do rendido eleitor brasileiro.
Antônio
Scarcela Jorge.
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