COMENTÁRIO
Scarcela JorgeA DEMOCRACIA BRASILEIRA.
Nobres:
Há um intenso mal-estar nas diferentes democracias
pelo mundo. Isso advém de um profundo descompasso, sendo eufemístico, na
relação entre representados e representantes, gerando assim uma grave crise de
representatividade. Perceber essa questão como algo individual a cada país é
ter a atenção desviada do essencial o que está em crise pelo globo é a própria
democracia, pelo menos como a praticamos atualmente. Superar esse mal-estar é
perfeitamente possível. Para ir nessa direção, por mais inusitado que possa
soar, é preciso aprender com o teatro. A democracia é uma idéia no mínimo
radical, e ainda bem que ela assim é. Pensar que cada indivíduo tem o direito
de opinar sobre os seus destinos políticos, independentemente de sua religião,
cor, gênero, posses, posição social e assim por diante é um grande alento
considerando a gestão da política em termos históricos. Porém, ao longo do
tempo, a democracia parlamentar, que é como em geral a democracia é exercida
pelo mundo, foi deixando alargar a distância entre representantes e
representados. Hoje, para o cidadão comum, decidir seu destino político
resume-se basicamente a apertar duas teclas e o botão confirma. Como resultado,
percebe-se na democracia hoje o que o teatro designa por “quarta parede”.
Normalmente, uma cena teatral ocorre entre quatro paredes: os fundos, duas
paredes laterais e uma quarta parede. Esta expressão teatral nomeia a parede
invisível e imaginária que separa atores e plateia, o universo das personagens
da vida real e, em última análise, a ficção e a realidade. É o não contestar a
existência desta quarta parede que faz com que a platéia simplesmente assista à
cena sem interferir; e mais: que os atores performem como se aquela ali não
estivesse presente. O mesmo precisa ocorrer com a democracia. Não se trata de
acabar com a democracia parlamentar, longe disso. Contudo, é preciso que os
cidadãos deixem de ser tratados como meros espectadores do processo democrático
e que a interação vá para além do vaiar e aplaudir o espetáculo. É preciso
quebrar a quarta parede da democracia. Um caminho é democratizar a democracia
abrindo-se mais espaços para que os cidadãos, enquanto indivíduos, possam
diretamente decidir questões ligadas às suas vidas. No passado, a dificuldade
para ter várias pessoas em um único local debatendo era enorme. Contudo, hoje
há tecnologia disponível para que milhões reúnam-se, discutam e votem sobre
temas dos seus interesses. Cada pessoa com um celular ou acesso a um
computador, por exemplo, tem uma urna de votação em potencial nas mãos. É
preciso caminhar para uma democracia de maior intensidade. Mais abertura à
participação cidadã certamente resultaria em uma alocação e execução de
recursos mais condizente com as necessidades e anseios da população. Ao
contrário de outros regimes políticos, crises na democracia superam-se somente
com mais democracia ao oposto do que muitos afirmam.
Antônio
Scarcela Jorge.
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