COMENTÁRIO
Scarcela
Jorge
TEM A MALDIÇÃO NOS POLÍTICOS
Nobres:
Os dois penúltimos
ex-presidentes da República estão presos. Outros dois respondem a processo na
Justiça. Senadores e deputados, incluídos caciques de tradicionais partidos,
vêm caindo nas malhas da Operação Lava-Jato e outras investigações policiais.
Ex-governadores do Rio de Janeiro, estado considerado a caixa de ressonância do
Brasil, encontram-se atrás das grades. Moreira Franco, o único em liberdade,
mantém as barbas de molho. A qualquer hora pode voltar para a cadeia. Políticos
de outras unidades da Federação contribuem para engrossar o caldo viscoso da
corrupção. Trata-se de processo de depuração doloroso, mas necessário. Com “a
operação da Lava-Jato” em curso e a Procuradoria-Geral da República em pleno
funcionamento, mais casos virão à tona. O quadro desencanta e preocupa. É tal a
enxurrada de denúncias que há o risco de o brasileiro tomar a parte pelo todo, saltar
da decepção com os políticos para a desqualificação da política. Os que não se
identificam com o jogo afastam-se. Não só abdicam de disputar cargos, porém
participar de decisões que afetam a vida individual e social. Trata-se de gesto
cuja consequência foi sintetizada por Platão: “O castigo dos bons que não fazem
política é serem governados pelos maus”. Na língua simples do povo: lavar as
mãos é entregar o galinheiro à raposa. Não só a galinha demoniza a política. A
raposa também o faz. Esta por má-fé. Aquela por ignorância. A primeira, sem
levar em conta o mal que faz a si mesma, vira as costas para o que se passa ao
redor e se torna vítima da escolha dos outros. A segunda lança mão de manhas e
artimanhas para dominar a situação e, com isso, excluir o povo do papel que lhe
cabe: exercer pressão sobre os detentores de mandato. A exclusão transfere as
decisões dos cidadãos para grupos que se apoderam da política com olhos não no
bem comum, mas nos interesses próprios ou nos deste ou daquele segmento. A
eleição de 2018 deixou claro que o brasileiro queria mudança, deixar para trás
“tudo o que está aí”. Votou em novatos, passo importante não suficiente.
Política e democracia vão além da participação popular na escolha de
representantes em períodos eleitorais. (Mais da metade dos eleitores esquecem o
nome do candidato a quem entregou o direito de representá-lo no Legislativo.) A
cidadania exige a atuação mediante mecanismos de fiscalização, de
acompanhamento do poder público e engajamento em causas coletivas e sociais. Há
quatro meses, o Brasil tem novo governo, mas uma enxurrada de problemas.
Endividamento interno, produção industrial em queda, retração do consumidor,
multidão de 12 milhões de nem-nem (jovens que não estudam nem trabalham), 13
milhões de desempregados que, somados aos subaproveitados e aos desalentados,
chegam aos 28 milhões de pessoas. Trata-se de desafio importante demais para
ser deixado só nas mãos do governo. Impõe a participação do povo para mobilizar
os representantes alçados ao poder pelo voto. A política tem de se aliar à
economia. Ela está por trás das mãos que definem o preço do cafezinho, a
segurança da aposentadoria, o direito à morte reta.
Antônio
Scarcela Jorge.
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