COMENTÁRIO
Scarcela Jorge
INSPIRAR CONFIANÇA PARA SOCIEDADE
Nobres:
Por deveras
inegável o resgate a confiança perante a sociedade ética, parte dos juízes e
procuradores dando hoje ao Brasil, na medida em que destemidamente prosseguem
“desmontando” a podridão política brasileira, lição inesperada e magnífica,
ponto de partida, talvez, para um novo País. Ao mesmo tempo, porém, estão dando
também o péssimo exemplo de uma luta indigna pela manutenção de privilégios
injustificáveis, como o calamitoso ‘Auxilio-Moradia’. Chegam a organizar
passeatas para pressionar os julgadores do processo que estava retido por anos
a fio por Ministro que concedera indecente liminar. ‘Como mostragem’ se
descobre que um juiz da Lava-jato recebe dois auxílios-moradia, um dele, e
outro da esposa, morando na mesma casa. Claro que é abissal a diferença do
volume dos valores em causa, mas, no fundo, são privilégios e regalias o que
uns e outros querem os acusados da Lava-jato e os juízes que os condenam.
Pretender-se-á que a diferença está na lei? Que, enquanto os empresários e
políticos corruptos buscam privilégios fora da lei e até contra a lei, os
juízes e os promotores querem garantir os privilégios que a lei lhes dá? Primeiro,
é sumamente discutível que a lei realmente dê esses privilégios. Por que, para
juízes e procuradores, moradia, alimentação, etc, serão “auxílios”, verbas
indenizatórias, que podem e devem ficar fora do teto remuneratório, ao passo
que, para todos os trabalhadores comuns, são itens da remuneração (que esta
serve precisamente para assegurar, aos trabalhadores e a sua família,
habitação, moradia, alimentação, etc, como está no art. 7º, IV, da
Constituição)? Quando alegam que o Auxílio-moradia serve para compensar a falta
de reajuste, o que fazem é explicitamente reconhecer o caráter remuneratório
desse pretenso Auxílio. Moradia até poderia ser verba indenizatória, mas
somente para alguns casos específicos, jamais para todos os juízes e
procuradores. Depois, se o Auxílio-moradia de fato estivesse na lei, não é,
afinal, tão difícil assim colocar na lei também a legalidade do caixa 2, o
adicional das contratações de obras públicas para financiamento dos partidos ou
até como pro-labore dos seus contratantes. Por que não? Um pouco mais de
ousadia e os legisladores, tão pródigos em legislarem em favor de si mesmos,
fariam isso. Se a lei não precisar obedecer a certas exigências da razão e da
ética pode incluir o caixa 2, e os outros desvios, porque pode
institucionalizar privilégios qualquer um. Inadmissível é a defesa cínica,
explícita, arrogante, das regalias e dos privilégios. Os juízes e procuradores
que não percebem o escândalo e a indignidade que é o Auxílio-Moradia, no fundo
não podem se levantar contra os crimes da Lava-Jato. São casos de aberração e
aí se tornam efetivamente isonômicos, sim, que impera a macilento processo que
ausenta o nosso país.
Antônio Scarcela Jorge.
Nenhum comentário:
Postar um comentário