domingo, 23 de junho de 2013

PLANO ECONÔMICO INSTÁVEL



Quase duas décadas de plano real
Após quase 20 anos, economia ainda pede crescimento e reformas.

O PIB continua anêmico, a inflação está no teto da meta e os gastos do governo crescem. A conjuntura econômica brasileira impõe novos desafios na era pós-real para manter a estabilidade sem sacrificar o avanço do País. - Após 19 anos do plano econômico bem-sucedido, conjugar essas variáveis é o dilema que o Brasil vive no curto prazo. Ainda mais agora que a sociedade clama por mais justiça social, serviços públicos de qualidade e pelas sonhadas reformas estruturais como a política e tributária.

Marca registrada

Pilar econômico, não se pode abrir mão da estabilidade

Alcançada à custa de arrocho monetário para o controle da inflação, este pilar econômico foi a maior conquista.

1º de julho de 1994. Há quase 19 anos, o Brasil experimentava uma mudança de paradigma que transformaria de vez o rumo de sua economia. Era implantado o Plano Real, cujas bases ainda hoje estão refletidas no dia a dia da população, desde a ida ao supermercado até o crédito mais farto observado nos últimos anos. A palavra chave desde então tem sido estabilidade.

Hoje, os reflexos são sentidos desde uma ida ao supermercado ao crédito mais farto.

Alcançada à custa de arrocho monetário para o controle da inflação, este pilar econômico foi a maior conquista do conjunto de medidas adotadas no governo do então presidente Itamar Franco e de seu ministro da Fazenda Fernando Henrique Cardoso, mas totalmente preservada por seus sucessores. Para os mais jovens, com menos de 30 anos, é difícil imaginar uma época em que os preços aumentavam cerca de 1,5% ao dia, para não dizer quase 3.000% ao ano. - Nos supermercados, o barulhinho das máquinas remarcadoras provocava uma corrida das donas-de-casa às lojas e a inflação corroía o salário dos trabalhadores. Hoje o chamado "dragão" mostra suas garras, mas longe de ter a ferocidade daquela época. E não há como negar. É consenso entre os economistas que a iniciativa configurou-se como o mais bem-sucedido plano de estabilização da economia adotado no Brasil. - Trata-se do mais longevo da história do País nos últimos 40anos. Só entre 1986 e 1994, foram sete tentativas de conter a inflação: Cruzado 1 e 2, Bresser, Verão, Maílson da Nóbrega e Collor 1 e 2. "Planos que funcionavam por três a quatro meses, mas que depois a inflação voltava ao que era", recorda o economista e professor da Universidade de Fortaleza (Unifor), Ricardo Eleutério Rocha. "Eles tentaram, de forma artificial, manter os preços estáveis. Esta fórmula pode funcionar no curto prazo, mas não no longo", reforça o também economista Ênio Arêa Leão.

Implementação

Implantada em três etapas, a estabilização se iniciou em junho de 1993. Primeiro, veio a arrumação da casa, com o Programa de Ação Imediata (PAI) que tinha por objetivo reduzir e organizar os gastos da União. Num segundo momento, já em 1994, veio a desindexação dos preços, por meio da Unidade Real de Valor (URV), que serviu de referencial de valores até a desmonetização da velha moeda (o cruzeiro real). - Salários, contratos e preços foram fixados por este indexador publicado diariamente com base em uma cesta de índices e muitos cálculos. Em 30 de junho de 1994, foi editada a medida provisória 542, a MP do Plano Real. Com a moeda passando a ser o real. Desde então, ao longo da trajetória do plano, mesmo diante de fortes ataques especulativos, incertezas políticas e crises econômicas externas pelo caminho, independentemente do governo que estivesse à frente do Palácio do Planalto, o combate à inflação foi perseguido e a tão sonhada estabilidade monetária alcançada. - "O controle da inflação e a consequente estabilidade da economia foi o maior mérito do Plano Real. Isto foi a base para que outras coisas importantes também acontecessem. Foi possível destravar o crédito de longo prazo e o crédito imobiliário, as empresas puderam planejar investimentos, assim como o próprio governo, o que antes a inflação não permitia. Com isso, aumentou a inserção no mercado de trabalho, melhorando também a possibilidade de distribuição de renda", defende o presidente do Instituto Brasileiros dos executivos de Finanças no Ceará (Ibef-CE), Delano Macedo. - "A estabilidade proporciona ganhos especialmente para as pessoas de menor renda, que não têm como se defender da escalada de preços. A ascensão da classe média é consequência direta desta política. - Podem-se comparar preços, fazer poupança, investir em educação e tomar dívidas de longo prazo", acrescenta Ênio Arêa Leão.

Novas demandas.

Agora, passadas quase duas décadas, pelas conquistas alcançadas, a data não deixa de ser motivo de comemoração, mas também de reflexão. As incertezas da política econômica brasileira - o crescimento ainda é anêmico, a inflação está no teto da meta e os gastos do governo crescem - impõe novos desafios para manter a estabilidade sem sacrificar o crescimento do País. Conjugá-los é o dilema que o Brasil vive no curto prazo. - Ainda mais agora que a sociedade clama por mais justiça social, serviços públicos de qualidade e pelas sonhadas reformas estruturais como a política e tributária.


O QUE ELES PENSAM.

Agora é preciso correções

Foi o maior benefício que poderíamos ter para a economia, principalmente pela estabilidade econômica que existia no País há 19 anos. Entretanto, neste momento, já colhemos todos os bônus da estabilização da moeda. Esse bônus já se esgotou. Precisamos, agora, de uma economia voltada para a produtividade. Temos que investir, por exemplo, em infraestrutura, educação, e inovação. O investimento é mínimo e a educação é sofrida

Carlos Matos
Diretor do Instituto de Desenvolvimento Industrial do Ceará (Indi)

Foi a melhor transformação na economia que o Brasil poderia ter. Porém, após a implantação, era preciso corrigir algumas coisas, mas isso não foi feito e chegamos a situação atual. Estamos novamente com as portas abertas para o novo período de inflação e não vejo nenhuma ação do governo para evitar a elevação. O mercado ainda está bem, pois estamos vendo uma enxurrada de dinheiro a custo baixo na economia, mas isso é artificial.

Cid Alves
Presidente do Sindicato do Comércio Varejista e Lojista de Fortaleza (Sindilojas)

Economia foi posta à prova diante de crises mundiais

Ao longo de sua trajetória, o Plano real passou por várias provas de fogo, como a paridade cambial, em 1999, e a crise econômica mundial desencadeada em 2008; e que ainda hoje impõe dificuldades para que países como os Estados Unidos e aqueles da Zona do Euro se recuperem, com respingos sobre a economia do Brasil. "A princípio, o governo brasileiro usou mais a política cambial do que a monetária para segurar a inflação", recorda o professor de Economia da Unifor, Ricardo Eleutério Rocha. E isto, afirma, teve seus efeitos colaterais sobre o País.

Política econômica foi reorientada depois da implementação do Real. Banco Central passou a agir sobre os juros para controlar a inflação.

 - "Passamos por um desequilíbrio das contas externas. O País vinha há 14 anos com superávit comercial, até que, em 1995, o déficit nas contas externas, somado a outros déficits, nos deixou com esse desequilíbrio até o ano 2000. E o governo, ao invés de decretar moratória, recorreu ao FMI (Fundo Monetário Internacional).

Câmbio e regime de metas

Conforme disse, o plano sofreu então uma série de reveses que culminaram no recrudescimento da inflação e na adoção de um novo regime cambial, em 1999, dada ainda a crise internacional nos países chamados Tigres Asiáticos e depois a Rússia.

"Foi aí que adotou-se então um redirecionamento da política econômica brasileira, que passou a ser baseada no tripé meta de superávit primário, câmbio flutuante e regime de metas de inflação", explica o economista.

Marco

"A introdução do regime de metas para a inflação foi o marco da disciplina monetária", emenda. De acordo com o economista, "em todos esses anos o sistema de metas para a inflação foi bem sucedido". "Só tivemos quatro anos (2001, 2002, 2003 e 2004), em que a inflação ultrapassou o teto", lembra.

Novo susto

A turbulência econômica global iniciada em 2008 - a maior do capitalismo registrada em toda a história - assustou o País, mas ainda assim não produziu estragos consideráveis aqui como no olho do furacão, os Estados Unidos, e, de uns dois anos para cá mais fortemente nos países da Zona do Euro.

Fundamentos

Além dos fundamentos econômicos iniciados no Plano Real, os ajustes realizados no sistema financeiro nacional, argumentam os especialistas, amorteceu o impacto da crise. Ao mesmo tempo, um mercado interno pujante e com grande potencial de crescimento, e que foi estimulado pelo governo com a maior oferta de crédito e posteriormente a desoneração de vários setores da economia, ajudaram o Brasil, diferentemente do que aconteceu com outras economias ao redor do globo, consideradas mais maduras.

Juros

Entretanto, expõe Eleutério Rocha, enquanto nos governos anteriores a manutenção dos juros em patamar elevado foi a principal arma para manter a inflação no centro da meta estabelecida para o indicador, "a partir do governo Dilma, surgiram desconfianças de que o tripé que redirecionou a política econômica do País para o viés monetário teria sido abandonado". - "O remédio (elevação dos juros)para segurar a inflação foi usado em doses tão cavalares, que gerou críticas por parte do setor produtivo, que avaliava que juros altos impediam investimentos e o consequente crescimento do Brasil", fala. "Porém, quando chegou em agosto de 2011, o Conselho de Política Monetária, o Copom, passou a reduzir a Selic, acatando taxas de inflação mais altas em prol do crescimento do País. Utilizou-se ainda de política fiscal (desonerações) para ajudar a atividade econômica", acrescenta.

Mas considerando os últimos meses, Eleutério Rocha, avalia que começa a se assistir a retomada da ação do Banco Central em sentido contrário. "Já tivemos duas elevações da Selic e a expectativa do mercado é de que feche o ano em 9%", afirma.

ANCHIETA DANTAS JR.
REPÓRTER.

Fonte: - Caderno Economia – Edição 23/06/2013 – DN.









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